RESPONSABILIDADE CIVIL- DO ESTADO POR ATOS JURISDICIONAIS

TEREZINHA PEREIRA DE VASCONCELOS

RESUMO

 

Responsabilidade objetiva é a responsabilidade advinda da prática de um ilícito ou de uma violação ao direito de outrem que, para ser provada e questionada em juízo, independe da auferição de culpa, ou de gradação de envolvimento, do agente causador do dano. Atualmente, no ordenamento legal brasileiro reside uma celeuma jurídica acerca da incidência da responsabilidade objetiva do Estado perante os atos jurisdicionais, divergindo do tratamento conferido aos atos administrativos, uma vez que há o posicionamento unânime quanto o surgimento do dever estatal de indenizar os danos provenientes das atividades desempenhadas pelo Poder Executivo.

A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 37, § 6º não faz qualquer alusão à irresponsabilidade do Poder Judiciário e de seus respectivos membros, o que representaria um atentado ao regime Democrático de Direito vigente, pois dispensaria diferenciação entre os Poderes estatais, bem como a imposição ao jurisdicionado perceber os prejuízos oriundos do mau funcionamento da Jurisdição, atividade exercida exclusivamente pelo Estado, além de permitir que este se escuse da aplicação da Lei. A prestação jurisdicional deve ser fornecida com a mesma eficiência exigida dos demais serviços públicos. O juiz, como agente público que é, pode vir a ser responsabilizado direta e/ou regressivamente, quando restar provado a sua conduta dolosa ou culposa, nas hipóteses legalmente previstas, ressalvada a possibilidade da existência de excludentes que eximem tanto o Estado quanto o magistrado. É do exame da legislação, doutrina e jurisprudência pátrias que se almeja o entendimento acerca da forma e dos casos em que emerge a responsabilidade em tela.

PALAVRAS CHAVE: Responsabilidade Civil do Estado. Poder Judiciário. Jurisdição. Juiz.

INTRODUÇÃO

Estado (do latim status, us: modo de estar, situação, condição), segundo o Dicionário Houaiss é datada do século XIII e designa “conjunto das instituições (governo, forças armadas, funcionalismo público etc.) que controlam e administram uma nação”; “país soberano, com estrutura própria e politicamente organizado”.

Para Kant, o Estado tanto é designado por coisa pública (res publica), quando tem por liame o interesse que todos têm em viver no estado jurídico, como por potentia, quando se pensa em relação com outros povos, ou por gens, por causa da união que se pretende hereditária. O que se poderia dizer de outro modo, entende o Estado como comunidade, soberania e nação, para utilizarmos categorias de hoje, dado que o Estado é ao mesmo tempo Estado-comunidade, ou república, Estado-aparelho, ou principado, e comunidade de gerações, ou nação.

Segundo o jurista italiano Norberto Bobbio, a primeira vez que a palavra foi utilizada, com o seu sentido contemporâneo, foi no livro Arte da Guerra, do Imperador e General que fundou a dinastia dos Sun Tzu e posteriormente no livro denominado O Príncipe, do Diplomata e Militar Nicolau Maquiavel.

O Estado, ente soberano, repartiu o seu poder nos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, visando uma otimização no desempenho de suas funções, cujo intento maior deve residir sempre na consecução do bem comum. As atividades estatais, mesmo almejando o bem público, podem vir a causar prejuízos aos particulares. Partindo deste pressuposto, a Constituição Federal de 1988, artigo 37, § 6, consagrou o instituto da responsabilidade objetiva do Estado, baseada na teoria do risco administrativo, no qual o Poder Público assume a possibilidade de dano, que porventura suas atividades venham a causar ao indivíduo. Este sob o auspício do Estado Democrático de Direito passa a vislumbrar o direito à reparação nessas circunstâncias.

É ponto pacífico na jurisprudência e doutrina brasileiras, o dever do Estado de indenizar os atos administrativos danosos, distintamente do que acontece quando se fundamenta a indenização nos atos jurisdicionais danosos, em que há corrente defensora da irresponsabilidade estatal decorrente de tais atos, ensejando, conseqüentemente, o seguinte questionamento: se os Poderes não podem ter tratamento diferenciado, qual o fundamento dessa exceção?

Perante este panorama, o presente trabalho, visa desenvolver um estudo monográfico sobre a Responsabilidade Civil do Estado por Atos Jurisdicionais, utilizando-se, para este fim, o método descritivo e analítico, respaldado pela feitura de uma pesquisa bibliográfica, cujas fontes foram a legislação, doutrina (sobretudo administrativa e civilista) e jurisprudência pátrias atinentes ao tema, focando-se no exame: da evolução histórica do instituto jurídico da responsabilidade civil do Estado no mundo e no Brasil; da função jurisdicional estatal; das atividades jurisdicionais cabíveis de indenização e por fim das peculiaridades inerentes ao processo de responsabilização do Estado pelo ato jurisdicional.

A partir desta análise, objetivou-se especificamente responder as seguintes indagações:

-O Estado pode ser responsabilizado pelos danos oriundos de atos jurisdicionais, além das hipóteses previstas na Constituição Federal: “art. 5º. LXXV – o Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença”?

-O magistrado pode ser pessoalmente responsabilizado, e se o for, em que casos?

– Como proceder para ser ressarcido pelo Estado, tratando-se de atos jurisdicionais danosos?

Como se percebe o tema se mostra relevante e atual, especialmente, porque é alvo de divergência e discussão, sendo salutar um entendimento maior, seja como jurista, seja como cidadão que pode um dia vir a ser atingido, de maneira danosa, por um ato jurisdicional do Estado.

Conclui-se, por fim, que a responsabilidade objetiva do Estado também é aplicada aos atos jurisdicionais, uma vez que não se justifica tratamento diferenciado entre os Poderes, considerando-se, pois, a atividade judiciária espécie de serviço público e, como tal, exige-se a presteza e a eficiência esperada dos demais, podendo ser totalmente repelidas as alegações pró-irresponsabilidade, visto que ao se negar a responsabilidade civil do Estado por atos jurisdicionais implicaria numa dupla negação do direito e da justiça, pois se eximiria o Poder Público de uma obrigação imposta constitucionalmente a ele, bem como cercearia o direito individual à reparação, assegurado a nível constitucional, infligindo ao particular perceber os danos decorrentes das atividades estatais.

A Constituição Federal de 1988, seguindo uma tradição estabelecida desde a Constituição Federal de 1946, determinou, em seu art. 37 Parágrafo 6º, a responsabilidade objetiva do Estado e responsabilidade subjetiva do funcionário.

 

 

CAPÍTULO I

RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO

 

1.1 CONCEITO E TIPOS DE RESPONSABILIDADE

A responsabilidade civil consiste na obrigação de reparar economicamente os danos causados a terceiros, sejam no âmbito patrimonial ou moral. Assim, em razão de um dano patrimonial ou moral é possível o Estado ser responsabilizado e, conseqüentemente, deverá pagar uma indenização capaz de compensar os prejuízos causados.

O vocábulo responsabilidade provém do latim respondere, cujo significado, conforme define De Plácido e Silva, exprime:

 […] a obrigação de responder por alguma coisa. Quer significar, assim, a obrigação de satisfazer ou executar o ato jurídico que se tenha convencionado, ou a obrigação de satisfazer a prestação ou de cumprir o fato atribuídos ou imputados à pessoa por determinação legal.[1]

Savatier define responsabilidade como a “obrigação que pode incumbir uma pessoa a reparar o prejuízo causado a outra, por fato próprio ou por fato de pessoa que dela dependam”[2].Denota-se, portanto, que o cerne da questão é averiguar se o prejuízo percebido pela vítima deve ou não ser reparado por aquele que lhe deu causa, se for este o caso, necessário se faz analisar em que condições e de que forma será o prejuízo remediado.

Expõe Sílvio Rodrigues que a responsabilidade civil difere da penal no fato de que nesta o infrator viola uma norma de direito público e sua conduta desequilibra a ordem social, enquanto que naquela o interesse diretamente afrontado é o privado e não o de caráter coletivo[3]. É possível, todavia, que o ato antijurídico[4], em razão da sua gravidade e suas conseqüências, repercuta tanto na esfera penal quanto na civil, nesta hipótese, o infrator poderá sofrer dupla sanção, isto é, a pena criminal e o dever de indenizar a vítima.

A responsabilidade pode ser, ainda, contratual ou extracontratual, também denominada aquiliana. No caso de responsabilidade contratual, antes de surgir a obrigação de indenizar há entre o inadimplente e seu co-contratante, um vínculo jurídico decorrente da convenção, já quando se trata de responsabilidade aquiliana, inexiste liame jurídico entre o agente causador do dano e a vítima até que o ato daquele ponha em ação os princípios geradores de sua obrigação de indenizar[5].

Por fim, distinguimos a responsabilidade entre responsabilidade subjetiva e responsabilidade objetiva. Diz-se subjetiva a responsabilidade quando se fundamenta na culpa do agente, que necessariamente tem que ser demonstrada para fazer surgir a obrigação indenizatória. A responsabilidade do acusador do dano somente se configura se ele agiu com dolo ou culpa. Trata-se da teoria clássica, também chamada teoria da culpa ou subjetiva, segundo a qual a prova da culpa em sentido lado (abrangendo o dolo) ou sentido estrito se constitui num pressuposto do dano indenizável.

Todavia, a lei impõe em determinadas situações, o dever de reparar o dano independentemente de culpa. É a teoria dita objetiva ou do risco, em que se dispensa a comprovação da culpa para a ocorrência do dano indenizável. Basta haver o dano e o nexo de causalidade para fundamentar a responsabilidade civil do agente. Em alguns casos presume-se a culpa (responsabilidade objetiva imprópria), noutros a prova da culpa é totalmente prescindível (responsabilidade civil objetiva propriamente dita).

A Constituição Federal vigente, promulgada em 05 de outubro de 1988, assegura em seu artigo 5º, V e X, o direito à reparação:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

V – é assegurado o direito de resposta proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem.

X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.

Neste diapasão, o Código Civil (Lei 10.406, de 10.01.2002) disciplina a responsabilidade civil decorrente de alto ilícito[6] , em seus artigos 186 e 927, que prescrevem respectivamente:

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

As normas civis são concernentes tanto à responsabilidade extracontratual como a contratual. Na presente pesquisa a abordagem está direcionada a responsabilidade extracontratual do Estado, em especial, por atos jurisdicionais, e o ente estatal como pessoa jurídica[7] configura um ser que não se pode atingir, por conseguinte, incapaz de provocar danos a alguém. Contudo, o Estado age por intermédio de seus agentes, pessoas físicas cujo procedimento se atribui a ele.

Sendo assim, em conformidade com o ordenamento jurídico vigente, o Estado responde civilmente, pela ação ou omissão de seus agentes, que nesta condição prejudiquem os administradores. Depreende-se, pois, que se apresentam como sujeitos dessa relação jurídica o Estado, o terceiro prejudicado e o agente do Estado.

O Estado é obrigado a recompor danos causados a terceiros, decorrentes tanto de atos lícitos ou ilícitos. Quando os atos estatais estão previstos em lei, justifica-se a responsabilização estatal no princípio da igualdade, já que não se pode permitir que alguns particulares suportem encargos a maior que aqueles normalmente impostos aos demais indivíduos de uma mesma sociedade, no que pertine as atividades destinadas ao grupo social.  No tocante aos atos ilícitos, fundamenta-se a obrigação de reparar no princípio da legalidade, visto que os atos estatais devem, necessariamente, observar as prescrições legais, sob pena de anulação, por estarem os mesmos eivados de ilicitude.

Portanto, como observa Alex Barreto, verifica-se que o intuito da Responsabilidade Civil do estado possui os objetivos de impedir que o Poder Público intervenha na esfera de direitos dos cidadãos e resguardar institutos que alicerçam o ordenamento jurídico pátrio[8].

1.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA

Da mesma forma que os demais institutos jurídicos, a Responsabilidade Civil do Estado variou segundo a época e o lugar, várias teorias foram elaboradas e adotadas nos diversos países no perpassar do tempo.  A progressão desse instituto ocorreu em simultaneidade com a evolução social dos povos, sobretudo, no campo do direito e da política, transformando-se em consonância com a ordem jurídico-política que vigia[9]. Explana a profª. Maria Sylvia Zanella Di Pietro que em alguns sistemas, como o anglo-saxão, prevalecem os princípios de direito privado, em outros, como o europeu-continental, adota-se o regime publicístico.[10]

A Responsabilidade Extracontratual do Estado partiu da teoria da total irresponsabilidade estatal, passando para a responsabilidade subjetiva, na qual, como foi visto, requer a averiguação do elemento culpa, culminado, por fim na responsabilidade objetiva, em que se prescinde da análise do elemento culpa para se impor o dever de indenizar.

Ao se observar tal desenvolvimento, percebe-se que apenas a partir da implementação do Estado de Direito é que a responsabilidade civil estatal firmou suas bases, uma vez que se estabelece aos indivíduos o dever de reparar os prejuízos ocasionados a terceiros, seria incoerente excluir o Estado desta obrigação, pois, ao se admitir esta possibilidade o privilegiaria em detrimento da lei e do povo, eximindo o Poder Público do dano por ele causado. Ruy Stoco expõe a responsabilização como “meio e modo de exteriorização da própria justiça e a responsabilidade é a tradução para o sistema jurídico do dever moral de não prejudicar a outro, ou seja, neminem laedere”.[11]

Proceder-se-á, a seguir, à análise de teorias atinentes à responsabilidade civil do Estado que vigeram ao longo do tempo.

1.3 TEORIA DA IRRESPONSABILIDADE ESTATAL

Inicialmente, vigorou a fase da irresponsabilidade civil do Estado, cujo período mais característico foi durante o absolutismo[12]. Partia-se do pressuposto de que “o rei não pode errar” (The King can do no wrong) para justificar a teoria do direito divino dos reis, como também a tese de que responsabilizar pecuniariamente a Administração representava um arriscado empecilho à promoção dos seus serviços e por fim a idéia de que a soberania estatal era incompatível com a previsão de responsabilidade do Estado por seus atos perante os administrados. Corroborando essas assertivas, colaciona-se o ensinamento de Odete Medauar que expõe as seguintes concepções para fundamentar a teoria da irresponsabilidade do estado.

O monarca ou Estado não erram; o Estado atua para atender ao interesse de todos e não pode ser responsabilizado por isso; a soberania do Estado, poder incontrastável, impede seja reconhecida sua responsabilidade perante um indivíduo.[13]

Durante a vigência desta teoria o Estado, em nenhuma hipótese, estava obrigado a recompor os prejuízos causados a terceiros. No entanto, ao prejudicado conferia-se o direito de demandar judicialmente o funcionário responsável pelo ato ilegal, uma vez que, quando praticava ato ilícito, não estava agindo em nome do Estado, mas por conta própria, ademais, tinha que se provar a culpa pessoal deste, porém, muitas vezes o patrimônio do funcionário não era suficiente para indenizar os danos percebidos, restando à vítima, necessariamente, suportar os prejuízos.

Com a substituição do Estado Absolutista pelo Estado de Direito, no qual se limita a atuação do ente estatal, por intermédio de diversos mecanismos, entre os quais estão: a observância de Constituições asseguradoras de direitos e garantias fundamentais e a separação dos poderes, cujo fim era a consecução do bem coletivo, resguardados os direitos individuais, esta nova mentalidade não mais se coadunava com a idéia de um Estado irresponsável, que não se sujeitaria a suas próprias leis, esquivando-se do dever de reparar os danos por ele ocasionados.

Os últimos Estados a abandonarem esta teoria foram, respectivamente, os Estados Unidos da América (1946) e a Inglaterra (1947).

O pensamento, conforme observa Cavalieri Filho, que passou a vigorar foi o de que “se no Estado de Direito o Poder Público também se submete à lei, a responsabilidade estatal é simples corolário, conseqüência lógica e inevitável dessa submissão”.[14]

1.4 TEORIA DA RESPONSABILIDADE COM CULPA

No século XIX sob a influência do Liberalismo[15], adotou-se a doutrina civilista da culpa, onde se previa a responsabilização estatal na hipótese de ação culposa de seu agente.

Nesta teoria distinguiam-se os atos estatais em dois tipos: atos de império e atos de gestão. Os primeiros correspondiam aos atos regidos por um direito especial, revestidos de privilégios e prerrogativas, cuja prática representava o exercício do poder soberano do Estado, sendo imposto de forma coercitiva e unilateral ao administrado, não ensejando, assim, qualquer responsabilidade. Os segundos consistiam nos atos praticados pela Administração em condição equivalente ao particular, logo, eram regidos pelo direito comum, implicando a responsabilização em caso de dano. Difere Di Pietro a respeito:

Distinguia-se a pessoa do Rei (insuscetível de errar – The Kjng can do no wrong), que praticava os atos de império, da pessoa do Estado, que praticava atos de gestão, através de seus prepostos.[16]

Apesar de configurar um significativo progresso na medida em que se passou a admitir a responsabilidade nos atos de gestão, em caso de culpa do funcionário estatal, esta teoria possuía, porém um entrave insustentável: a dificuldade em se estabelecer quando se tratava de ato de gestão e quando representava ato de império.

1.5 TEORIA DA CULPA

Em face da dificuldade em se diferenciar atos de gestão e atos de império, formulou-se a teoria da culpa, na qual o Estado estava obrigado a reparar o prejuízo causado a terceiro, desde que ficasse provado que esse tinha ocorrido por culpa do funcionário, já não mais importando se decorria de ato de gestão ou ato de império, sendo assim, bastava demonstrar o dano, o comportamento do funcionário e o nexo de causalidade entre ambos. O alicerce desta teoria era o fato de que se o agente é considerado instrumento do Estado, atua sob sua responsabilidade e em razão deste, ensina Leite:

Entendia-se, por outro lado, que a relação entre o Estado e o funcionário equiparava-se à relação entre patrão e empregado ou entre preponente e preposto, justificando-se o dever de indenizar do Estado na responsabilidade por fato de terceiro.[17]

Tentou-se infligir à responsabilidade do Estado os princípios e normas do Direito Civil, que regulava a responsabilidade entre particulares, no entanto, a teoria da culpa se mostrou incapaz de abarcar todos os casos imputados à responsabilidade do Estado, devido as suas especificidades, percebeu-se gradativamente a necessidade de reger esta modalidade de responsabilização por princípios e normas próprios, A partir de então, desenvolveram-se as teorias publicistas de responsabilidade do Estado.

1.6 TEORIAS PUBLICISTAS

A responsabilidade civil do Estado passou a ser analisada sob o prisma publicístico a partir do famoso caso Blanco:

Ocorrido em 1873, e que envolveu uma menina (Agnès Blanco) que, ao atravessar a rua da cidade francesa de Bordeaux, foi colhida por uma vagonete da Companhia Nacional de Manufaturados de Fumo, que transportava matéria-prima de um para outro edifício.[18]

Introduziram-se, nesta fase, princípios e normas pertencentes ao Direito Público, fato que transpôs os limites impostos pelas teorias civilistas, em especial, na questão de averiguação do elemento culpa, ao se chegar a este patamar garantiu-se maior respaldo aos administrados face às atividades exercidas pelo Estado.

1.6.1 TEORIA DA CULPA ADMINISTRATIVA

Esta teoria foi desenvolvida na França, sendo denominada de faute du Service (falta de serviço), durante a aplicação desta, o Estado era responsabilizado ao se comprovar a existência de um dano proveniente de um mau funcionamento de seus serviços, sendo dispensável a identificação do funcionário que o causou. Nesta nova concepção, a culpa adquiriu contornos publicísticos, isto é, se averiguava não o elemento subjetivo do agente estatal, mas sim a falta do serviço público, assim, ao particular atingido por eventuais danos provenientes dos serviços estatais era reconhecido o direito à reparação, embora a culpa individual não precisasse ser demonstrada, leciona Di Pietro “a culpa do Estado ocorre com o não funcionamento do serviço público (inexistência), com o seu funcionamento atrasado (retardamento) ou, ainda, quando funciona mal (mau funcionamento)”.[19] Nestas hipóteses, ocorrerá a culpa do Estado, independentemente da comprovação da falta do funcionário.

Cavallieri Filho adverte que embora fosse dispensável a prova de que o funcionário necessariamente tivesse agido com culpa para o evento danoso, bastando à constatação de “um mau gerenciador geral, anônimo, impessoal, na defeituosa condução do serviço, à qual o dano pudesse ser imputado”[20], não se tratava, ainda, de responsabilidade objetiva do Estado, apenas um caminho transitório como defende Bandeira de Mello:

É mister acentuar que a responsabilidade por ‘falta de serviço’, falha do serviço ou culpa do serviço (faute du Service, seja qual for que se lhe dê) não é, de modo algum, modalidade de responsabilidade objetiva, ao contrário do que entre nós e alhures, às vezes, tem-se inadvertidamente suposto. É responsabilidade subjetiva porque baseada na culpa (ou dolo).[21]

 

1.6.2 TEORIA DO RISCO – RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTÂDO

A evolução do instituto da responsabilidade civil do Estado culminou na teoria do risco, consagrando a responsabilidade objetiva do ente estatal. Este tipo de responsabilidade prescinde da averiguação do elemento culpa no que tange ao evento danoso, abrange tanto os atos lícitos quanto os ilícitos. Cabendo ao prejudicado demonstrar o nexo de causalidade entre o fato e o dano, circunstância esta, que resulta numa maior proteção à vítima, visto que diferentemente das demais teorias, dispensa-se a prova de alguns elementos obstaculadores, como a identificação do agente, a falta de serviço, a culpa do funcionário na conduta administrativa, que não permitiam, muitas vezes, vislumbrar o direito à reparação.

O Estado por deter mais poder e prerrogativas que o administrado, sendo este subordinado daquele, mesmo resguardado por direitos e garantias, encontra-se em situação de inferioridade, sendo injusto, portanto, que o particular necessitasse empreender muitos esforços para comprovar o direito à reparação em caso de danos provenientes das atividades estatais. Neste momento histórico, o ente estatal passa a suportar os riscos imanentes do seu exercício soberano do poder, nas palavras de Cavallieri Filho o risco representa “perigo, probabilidade de dano, importando, isso, dizer que aquele que exerce uma atividade perigosa deve-lhe assumir os riscos e reparar o dano dela decorrente”.[22]

Surge a partir deste contexto a teoria do risco administrativo, embasando a responsabilidade objetiva do Estado, cujo princípio básico é o da repartição dos encargos. Explicando o esteio desta teoria, afirma Carvalho Filho:

O Estado, ao ser condenado a reparar os prejuízos ao lesado, não seria sujeito pagador direto; os valores indenizatórios seriam resultantes da contribuição feita por cada um dos demais integrantes da sociedade, a qual, em última análise, é a beneficiária dos poderes e prerrogativas estatais.[23]

No mesmo sentido, leciona Di Pietro:

Essa doutrina baseia-se no princípio da igualdade dos ônus e encargos sociais: assim como os benefícios decorrentes da atuação estatal  repartem-se por todos, também os prejuízos sofridos por alguns dos membros da sociedade devem ser repartidos (2002, p. 515)[24].

Apesar da responsabilidade objetiva do Estado não requerer a verificação do elemento culpa, prevê a possibilidade de atenuação da responsabilidade, nos casos de culpa concorrente da vítima, como também causas de exclusão daquela, como, por exemplo, quando ocorre culpa exclusiva da vítima ou ação de força maior.

Na doutrina há divergência entre risco administrativo e risco integral, nesta teoria defende-se a impossibilidade de qualquer excludente, por conseguinte, a Administração possui o dever de indenizar o administrado pelo prejuízo proveniente de sua atividade. Todo o risco de dano é assumido pelo Estado. O ordenamento constitucional em vigor no Brasil recepciona a teoria do risco administrativo. Corroborando tal posicionamento, colaciona-se o ensinamento de Barreto.

A responsabilidade objetiva ou risco administrativo é, portanto, a teoria adotada no ordenamento jurídico contemporâneo, haja vista que a prova da culpa é necessária somente para o estado, quando pretender obter o ressarcimento do valor indenizatório que pagou à vítima, na hipótese de seus agentes terem provocado o dano de forma intencional ou com imprudência, imperícia ou negligência […] assim, conforme o texto constitucional estará configurada a responsabilidade civil do Estado com a presença de apenas dois pressupostos: a) a ocorrência de dano, de natureza moral ou material; b) o nexo de causalidade, ou seja, que esse prejuízo experimentado pelo terceiro tenha decorrido, direta e indiretamente, de uma atuação dos entes de direito público, no exercício de suas atribuições, ou de direito privado, que executem, serviços estatais por delegação do Poder Público[25]

            Neste sentido os seguintes julgados:

Responsabilidade Civil do Poder Público – Risco. Administrativo – Objetividade – Requisitos. A responsabilidade civil do Estado, responsabilidade objetiva, com base no risco administrativo, que admite pesquisa em torno da culpa do particular, para o fim de abrandar ou mesmo excluir a responsabilidade estatal, ocorre, em síntese, diante dos seguintes requisitos: do dano, da ação administrativa. A consideração no sentido da licitude da ação administrativa é irrelevante, pois o que interessa é isto: sofrendo o particular um prejuízo, em razão da atuação estatal, regular ou irregular, no interesse da coletividade, é devida a indenização, que se assenta no princípio da igualdade dos ônus e encargos sociais. (STF – RE nº 113.587-7 2ª Turma – Rel. Min. Carlos Velloso – DJU 3/3/1992).[26]

Responsabilidade Civil do Estado – Culpa Exclusiva da Vítima. Esta Corte tem admitido que a responsabilidade objetiva da pessoa jurídica de direito público seja reduzida ou excluída conforme haja culpa concorrente do particular ou tenha sido este o exclusivo culpado – Ag. 113.722-3 Ag.Rg e RE 113.587. No caso, tendo o acórdão recorrido, com base na análise dos elementos probatórios cujo reexame é inadmissível em recurso extraordinário, decidido que ocorreu culpa exclusiva da vítima, inexistente a responsabilidade civil da pessoa jurídica de direito público, pois foi a vítima que deu causa ao infortúnio, o que afasta, sem dúvida, o nexo de causalidade entre a ação e a omissão e o dano, no tocante ao ora recorrido. Recurso extraordinário não conhecido. (STF – RE nº 120.924-1 1ª Turma – Rel. Min. Moreira Alves – DJ 27/8/1993)[27]

1.7 RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO NO DIREITO BRASILEIRO

O envolver-se do instituto da responsabilidade civil do Estado no ordenamento jurídico pátrio deu-se da seguinte forma: no Brasil não se aplicou a teoria da irresponsabilidade estatal, conforme ensina Rui Barbosa:

Na jurisprudência brasileira nunca logrou entrada a teoria da irresponsabilidade da Administração pelos atos dos seus empregados. Apesar de profundamente repassada na influencia do direito romano, a nossa evolução jurídica, modificada pelo concurso dos elementos liberais que intervieram sempre na educação do pensamento nacional, não deixou penetrar no espírito dos nossos tribunais essa revivescência democrática dos privilégios regalistas.[28]

As constituições de 1824 e 1891 previam, em seus artigos 179, XIX e 82,  respectivamente, apenas a responsabilidade dos funcionários públicos, que eram estritamente responsáveis pelos abusos e omissões em que incorressem no exercício de seus cargos, assim como pela indulgência, ou negligência em não responsabilizarem efetivamente os seus subalternos, excluía-se, pois, a  responsabilidade do Estado, conforme transcrição a seguir:

Art. 179. A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Políticos dos Cidadãos Brasileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do Império, pela maneira seguinte [sic].

XIX. Os empregados públicos são estritamente responsáveis pelos abusos e omissões praticadas no exercício das suas funções, e por não fazerem efetivamente responsáveis aos seus subalternos[29].

Art. 82 Os funcionários públicos são estritamente responsáveis pelos abusos e omissões em que incorrerem no exercício de seus cargos, assim como pela indulgência, ou negligência em não responsabilizarem efetivamente os seus subalternos.[30]

            O Código Civil de 1916 adotou em seu artigo 15, a teoria civilística da responsabilidade do Estado pelos atos de seus representantes, devendo-se provar que estes haviam agido em afronta ao direito, como se pode observar:

Art. 15. As pessoas jurídicas de direito público são civilmente responsáveis por atos dos seus representantes que nessa qualidade causem danos a terceiros, procedendo de modo contrário ao direito ou faltando a dever prescrito por lei, salvo o direito regressivo contra os causadores do dano.

A Constituição de 1934, em seu art. 171 e parágrafo 1o, previu a solidarização da responsabilidade entre o Estado e seus funcionários, impondo a constituição de . um litisconsórcio passivo necessário:

Art. 171. Os funcionários são responsáveis solidariamente com a Fazenda Nacional, Estadual ou Municipal, por quaisquer prejuízos decorrentes de negligência, omissão ou abuso no exercício dos seus cargos. §1°. Na ação proposta contra a Fazenda Pública e fundada em lesão praticada por funcionário, este será sempre citado como litisconsorte.[31]

 

A partir da Constituição de 1946, o ordenamento jurídico brasileiro adotou a teoria da responsabilidade objetiva do Estado, embasada na teoria do risco, segundo dispõe em seu artigo 194: “As pessoas jurídicas de direito público responderão pelos danos que seus funcionários, nessa qualidade, causem a terceiros”.[32]

As Constituições de 1967 e 1969 também previram a responsabilidade objetiva do Estado, adotando a teoria do risco administrativo[33]. A Constituição promulgada em 5 de outubro 1988, cujo teor vige no Brasil, dispõe em seu art. 37, § 6o, in verbis:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

§6°. As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

Analisando a disposição supra, observa-se que o texto constitucional prevê responsabilidade objetiva do Estado e a responsabilidade subjetiva do funcionário norma constitucional prevê que são objetivamente responsáveis as pessoas jurídicas de direito público, que são as pessoas integrantes da federação (União, Estado Distrito Federal e Município), além das autarquias e empresas públicas de natureza autárquica, como também, as pessoas de direito privado ao exercerem funções que originalmente, caberiam ao Estado, encaixam-se nesta categoria as pessoas privadas da Administração Indireta (empresas públicas, sociedades de economia mista e fundações públicas com personalidade de direito privado), quando prestam serviços públicos, bem como os concessionários e permissionários de serviço público. Para melhor ilustrar essa assertiva a seguinte jurisprudência:

EMENTA: Recurso extraordinário. 2. Morte de detento por colegas de carceragem. Indenização por danos morais e materiais. 3. Detento sob custódia do Estado. Responsabilidade objetiva. 4. Teoria do Risco Administrativo. Configuração do nexo de causalidade em função do dever constitucional de guarda (art. 5o, XLX). Responsabilidade de reparar o dano  que prevalece ainda que demonstrada a ausência de culpa dos agentes públicos. 5. Recurso extraordinário a que se nega provimento. (RE 2752839/MT – 2a Turma – Rei. Min. Gilmar Mendes. Data do Julgamento 01.02.2005. Disponível em: <http:www.stj.gov.br> acesso em 01 setembro de 2006.

Na parte final da norma em comento, está previsto o direito de regresso cabível ao Estado perante o seu agente, na hipótese deste ter agido com culpa  ou dolo, no qual o ente estatal poderá ser ressarcido do valor pago, a título indenização à vítima, desde que comprove a conduta culposa de seu agente. Neste sentido a seguinte decisão:

Responsabilidade do Poder Público – Atos de Escrevente – Escrivão ou Oficiai do Estado – Direito Regressivo. É o Estado quem nomeia e, através do Judiciário, fiscaliza os serventuários. Não se nega que o escrivão, ou o oficial, é responsável pelos atos de seus escreventes, o que, porém, afasta a responsabilidade do Estado, que tem, em caso de culpa ou dolo, direito regressivo contra o escrivão ou oficial causador do dano. (TJ-SP- ApCiv n° 211.340 – 4o CCiv – Rel. Dês. Barreto Fonseca).[34]

Para se configurar a responsabilidade civil do Estado é imprescindível a existência de três pressupostos. O primeiro deles é a conduta decorrente de um serviço público, representada tanto por uma ação como por uma omissão, legítima ou ilegítima, singular ou coletivo. O segundo pressuposto é a existência de um prejuízo, podendo este ser um dano material e/ou moral. Por fim, mister se faz que seja comprovado o nexo causal entre a conduta e o dano sofrido, dispensando-se dessa maneira, a demonstração de que o agente público causador do prejuízo, teve dolo ou culpa.                                                                                   As excludentes da responsabilidade civil do Estado rompem o nexo causal entre a conduta pública e o dano percebido, não fazendo surgir a obrigação estatal de reparar. São excludentes: a culpa exclusiva da vítima e de terceiro, a força maior e o caso fortuito.

A culpa exclusiva da vítima ou de terceiro acontece quando o evento danoso ocorreu tão somente em consequência da ação ou omissão do prejudicado ou de terceiro estranho ao Estado-Juiz, ou seja, contribuindo de forma decisiva para o sinistro, neste sentido o julgado:

Fazenda Pública – Responsabilidade – Culpa da vítima, excludente da responsabilidade do Poder público – Teoria do risco administrativo, adotada pela Constituição, inconfundível com a teoria do risco integral (RJTJSP, 37;32).[35]

A força maior significa uma causa conhecida de um evento certo, contudo devido as suas características se torna irresistível, não obstante é de conhecimento público que fato específico venha a acontecer, é impossível de evitá-lo. A profa. Di Pietro conceitua força maior como o “acontecimento imprevisível, inevitável, como uma tempestade, um terremoto, um raio”[36]. Manifestando-se acerca do tema a seguinte decisão:

Danos resultantes de enchentes ocasionadas por forte chuva – Ocorrência de força maior, a qual conjugada com as circunstâncias fáticas emergentes da prova, afastam a responsabilidade do Município (STF, RTJ, 78:243).[37]

            Quanto ao caso fortuito, não é ponto pacífico na doutrina se ele representa ou não uma excludente de responsabilidade, para Clóvis Beviláqua o “caso fortuito é acidente produzido por força física ininteligente, em condições que não se podia ser previstas pelas partes”.[38] Para Bandeira de Mello o caso fortuito não elide responsabilidade do Estado, uma vez que é um acidente de raiz desconhecida, não elidindo o nexo causal[39]. Divergindo deste ponto de vista o STF, admite o caso fortuito como excludente da responsabilidade estatal, como se pode observar:

O princípio da responsabilidade objetiva não se reveste de caráter absoluto eis que admite o abrandamento e, até mesmo, a exclusão da própria  responsabilidade civil do Estado, nas hipóteses excepcionais configurada de situações liberatórias – como o caso fortuito e a força maior – ou evidenciadoras de ocorrência de culpa atribuível a própria vítima (STF – 1a T. – RE – Rel. Celso de Mello – j. 28.5.96. Disponível em<http:www.stj.gov.br> acesso em 01 de setembro de 2006.

Encerrando esta explanação, ressalta-se que pode ocorrer culpa concorrente entre a vítima e o Estado, neste caso o valor a ser indenizado por este é mitigado conforme demonstra este julgado:

Responsabilidade do Poder Público, que independe de prova de dolo ou culpa – Prova, entretanto, no caso, de que houve culpa concorrente do particular, autor da demanda – Indenização devida pela metade (RJTJSP, 51:72).[40]

 CAPÍTULO II

RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR ATOS JURISDICIONAIS

2.1 JURISDIÇÃO

 

 

Dá-se o nome de jurisdição ( do latim juris, “direito”,  e  dicere, “dizer”) ao poder que detém o Estado para aplicar o direito ao caso concreto, com o objetivo de solucionar os conflitos de interesses e, com isso, resguardar a ordem jurídica e a autoridade da lei.             Na definição de Carvalho Filho o Estado consiste em “um ente personalizado, apresentando-se não apenas exteriormente, nas relações internacionais, como internamente, como pessoa jurídica de direito público, capaz de adquirir direitos e contrair obrigações na ordem jurídica”[41], cujo fim é a consecução do bem comum e para tanto, repartiu-se o poder soberano estatal[42], para otimizar o desempenho de suas funções. A Constituição Federal de 1988 dispôs em seu artigo 2o: “São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”. Coube a cada poder uma função típica, dessa forma, atribuiu-se ao Poder Legislativo à função legislativa ou normativa, ao Executivo à função administrativa e ao Judiciário à função jurisdicional. Faz-se oportuno ressaltar que o exercício dessas funções pelos Poderes não é exclusivo, mas sim preponderante, isto é, a função típica do Poder Judiciário é o exercício da jurisdição, contudo, também lhe é devido exercer as funções administrativa e legislativa, como quando, respectivamente, organiza suas secretarias e serviços auxiliares e os juízos que lhe forem vinculados (CF, art. 96, I, b) e ao elaborar os regimentos internos dos tribunais (CF, art. 96, I, a).                                                                              A jurisdição representa a prestação exercida pelo Estado, com caráter de definitividade. visando à resolução dos conflitos intersubjetivos, em consonância com o ordenamento jurídico pátrio, no intuito de harmonizar a vida em sociedade, ou nas palavras de Theodoro Júnior é o poder que toca ao Estado, entre as suas atividades soberanas, de formular e fazer atuar praticamente a regra jurídica concreta que, por força do direito vigente, disciplina determinada situação jurídica[43]. Ainda sobre o tema a seguinte lição de Cintra, Grinover e Dinamarco:

É o ao mesmo tempo poder, função e atividade. Como poder é a manifestação do poder estatal, conceituado como capacidade de decidir imperativamente e impor decisões. Como função, expressa o encargo que  têm os órgãos estatais de promover a pacificação de conflitos  interindividuais, mediante a realização do direito justo e através do  processo. E como atividade ela é o complexo de atos do Juiz no processo, exercendo o poder e cumprindo a função que lhe compete.[44]

 

O Poder Judiciário somente atua quando provocado pelo interessado, sendo  o juiz, sujeito imparcial na relação processual, ou seja, age como agente estatal onde sua atribuição é dizer o direito, funcionando como um terceiro desinteressado da lide, que diante de si as partes, em situação de igualdade, relatam os fatos aduzem suas pretensões produzem suas provas. No que tange ao pronunciamento (decisão) desse poder é conferido a autoridade da coisa julgada, o que torna o julgamento imutável, quando esgotados os meios legais de recurso.

2.2 ATIVIDADE JUDICIÁRIA COMO SERVIÇO PÚBLICO

Serviço público corresponde a toda atividade material que o Estado diretamente exerce, na forma da lei, ou por intermédio de seus delegados, objetivando atender às necessidades públicas, sob o regime jurídico público de forma plena ou parcial, abrangendo, dessa forma, as atividades legislativa, administrativa e judiciária. Já Meirelles, assim, o define:

Serviço público é todo aquele prestado pela Administração ou por delegados, sob normas e controles estatais, para satisfazer  necessidades essenciais ou secundárias da coletividade, ou simples conveniência do estado.[45]

O conceito do ilustre jurista é estrito, no qual se entende serviço público como a atividade desempenhada pelo Poder Executivo (Administração) ou por seus delegados para os fins expostos. Entretanto, a presente pesquisa diverge de concepção restrita, visto que o Estado ao avocar para si, de modo exclusivo e  impositivo, a tutela dos direitos ameaçados ou violados, constituiu o serviço publico judiciário, conforme explana Augusto do Amaral Dergint:

Se a prestação jurisdicional é exclusividade incumbida ao Poder Público, em caráter obrigatório, não podendo os particulares ‘fazer justiça’ de mão própria, o serviço judiciário configura, inequivocamente, um serviço público.[46]

 

Destarte, partindo do pressuposto que o serviço judiciário é uma espécie de serviço público, deve ser prestado tal qual os demais serviços públicos, com a presteza atinente, uma vez que o acesso à atividade judiciária configura garantia constitucional prevista no art. 5o, XXXV, da CF: “a lei não excluíra da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.

Neste diapasão Cretella Júnior:

Realmente, o serviço judiciário é, antes de tudo, serviço público. Ora, serviço público danoso, em qualquer de suas modalidades é serviço danoso do Estado. Por que motivo, por exceção, a espécie serviço público judiciário, do género serviço público geral? [47]

Isto posto, não se pode permitir a sujeição distinta do Estado às regras de responsabilidade civil, visto que, este fato implicaria em negar formalmente o direito e a justiça, corolários estatais, cuja persecução e manutenção justificam a existência do Estado, respaldado por todos os privilégios e prerrogativas a ele conferidos.

Os atos do Poder Judiciário distinguem-se em dois tipos: jurisdicional e não-jurisdicional. Este representa o ato de natureza materialmente administrativa, Lima esclarece que são “os atos de gestão do Poder Judiciário (nomeação de funcionários, concessão de licenças) e os atos ordinários do procedimento processual (despachos)”[48] Deste modo, deve-se conferir a tais atos o mesmo tratamento dado aos atos administrativos próprios, emanados do Poder Executivo. Já os atos jurisdicionais são os pronunciamentos prolatados pelo juiz, cujo conteúdo seja decisório, em um processo.

Ensejam a responsabilidade civil tanto os atos jurisdicionais quanto os não-jurisdicionais, no entanto, estes por já estarem em situação equivalente aos atos administrativos próprios, não há qualquer questionamento quanto à possibilidade de responsabilização   do   Estado,   neste   sentido   Meireles:  “Quanto   aos atos administrativos praticados por órgãos do Poder Judiciário se equiparam aos demais atos da Administração, e, se lesivos, empenham a responsabilidade objetiva da Fazenda Pública”.[49]

A celeuma jurídica paira justamente sobre a responsabilidade civil do Estado e até do próprio juiz no tocante aos atos jurisdicionais, parte significativa da doutrina e da jurisprudência refutam esta responsabilidade alegando que:

  1. o Poder Judiciário é soberano;
  2. os juízes têm que agir com independência no exercício das funçõe; sem o temor de que suas decisões possam ensejar a responsabilidade do Estado;
  3. o magistrado não é funcionário público;
  4. a indenização por dano decorrente de decisão judicial infringiria a regra da imutabilidade da coisa julgada, porque implicaria o reconhecimento de que a decisão foi proferida com violação da lei.

Calcado nos referidos argumentos, predominava no Supremo Tribuns Federal a teoria da irresponsabilidade do Poder Judiciário como se depreende do julgado a seguir:

O Estado não é civilmente responsável pelos atos do Poder Judiciário, a não ser nos casos expressamente declarados em lei, por quanto a administração da justiça é um dos privilégios da soberania. (Acórdão do STF de 13.10.71, na PTJ, 64/689.[50]

Acrescenta o mestre Aguiar Júnior:

Domina, pois, nesse âmbito o principio da irresponsabilidade, não só em  atenção a autoridade da coisa julgada como também a liberdade e independência dos magistrados, que se sentiriam tolhidos a cada passo, na sua função de dizer o direito ou resolver as graves questõe administrativas que lhe são afetas, pelo temor de engendrar a responsabilidade para si e para o Estado que representa. (Acórdão do STF de 9.12.58, na Revista Forense, 194/159).[51]

Far-se-á a seguir, a análise das alegações pró-irresponsabilidade estatal em cotejo com a evolução da doutrina nacional no que tange a admissão de responsabilidade por atos jurisdicionais. Merece menção as preciosas colocações do mestre José de Aguiar Dias, um dos precursores do pensamento favorável à responsabilização do Estado por atos dos jurisdicionais no ordenamento jurídico pátrio:

Diante do nosso Direito Positivo, a responsabilidade do Estado por atos jurisdicionais, modo de garantir a plena satisfação do princípio da igualdade perante a lei, de cuja violação surge o direito amplo à indenização, nela incluída a reparação do dano moral, com o que rebate, a um só tempo, quem sustenta o dever de reparar mero imperativo do dever de assistência social (Rocco) e ainda contrária a redução do dano indenizável ao seu componente patrimonial.[52]

A corrente defensora da soberania do Poder Judiciário aduz que as funções por ele exercidas são revestidas de soberania estatal, entendo-se por soberania: Soberania consiste na autoridade superior do Estado, que não encontra limitação proveniente de outros poderes que por ventura possam existir em seu território, e mediante este poder o ente estatal impõe sua vontade, de forma definitiva, norteado pelo ideal de justiça, conceito este que já foi trazido à baila neste trabalho, porém não há que se confundir o poder máximo do Estado que é indivisível, supremo e uno, com os três Poderes – Legislativo, Executivo e Judiciário – que existem a fim de maximizar as atividades estatais na persecução do bem coletivo. Tais poderes não são soberanos, uma vez que se submetem as prescrições legais, em especial à Constituição Federal. Se a alegação da soberania fosse acolhida, ter-se-ia o tratamento diferenciado entre os três Poderes, porque é questão pacífica o dever de indenizar pelo Estado os atos administrativos danosos. Oportuna a conclusão de Sento Sé:

A soberania do Poder Judiciário não desobriga o Estado de indenizar os prejuízos oriundos dos seus atos: a) porque é uma concepção ultrapassada a de que existe antinomia entre a responsabilidade do Estado e a soberania; b) porque, a prevalecer o argumento a prerrogativa não seria apenas do Judiciário, mas também do Executivo em relação ao qual ninguém sustenta hoje o privilégio.[53]

A independência do magistrado se refere ao fato de que lhe é atribuída liberdade de atuação, isto é, o juiz é livre para interpretar a lei e aplicá-la do modo mais adequado ao caso concreto, entretanto esta liberdade é delimitada na medida em que se exige a fundamentação de todas as decisões de natureza jurisdicional, a fim de se manter o magistrado nos limites do ordenamento jurídico vigente, adota-se no Brasil a teoria do livre convencimento motivado para as decisões judiciais , este  direcionamento está explicitado na Carta Magna em seu art. 93, IX: “Todo julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos e fundamentadas todas as decisões”.

Ademais, todos os Poderes são independentes, a independência da magistratura é prerrogativa fundamental para o exercício da função jurisdicional, podendo, contudo, servir de embasamento para a irresponsabilidade, visto que são viáveis a independência do juiz e a responsabilidade do Estado por atos danoso de  seus agentes.

O Estado como outrora mencionado age por intermédio de seus agentes, os agentes públicos, que corresponde à pessoa que exerce a função pública na  condição de preposto do Estado. Há uma controvérsia doutrinária concernente ao enquadramento do juiz nas espécies de agentes públicos: se na categoria de agentes políticos ou de servidores públicos. Carvalho Filho define agentes políticos  como:

Agentes que desenham os destinos fundamentais do Estado e que cria estratégias políticas por eles consideradas necessárias e convenientes para  que o Estado atinja os seus fins […] não se sujeitam as regras comuns aplicáveis aos servidores públicos em geral; a eles são aplicáveis normalmente as regras constantes da Constituição, sobretudo as que dizem respeito as prerrogativas e a responsabilidade política. São eles os Chefes do Executivo (Presidente, Governadores e Prefeitos), seus auxiliares (Ministros e Secretários Estaduais e Municipais) e os membros do Poder Legislativo (Senadores, Deputados Federais, Deputados Estaduais Vereadores).[54]

O Supremo Tribunal Federal já estendeu esta classificação aos magistrados conforme demonstra o seguinte julgado:

Em se tratando de dano causado por magistrado no exercício da função jurisdicional a ação indenizatória deve ser ajuizada somente em face da respectiva pessoa de direito público, e não em face do magistrado, e isso  porque este se caracteriza como agente político do Estado, não se podendo, na hipótese, vislumbrar responsabilidade concorrente, mas apenas a que eventualmente vendo a decorrer do exercício do direito de regresso. (RE 228.977 – SP, Rel. Min. NÉRI DA SILVEIRA, DJ de 12/4/2002). Disponível em: <http:www.stj.gov.br> acesso em 01 setembro de 2006.

Com o devido respeito ao Excelso Tribunal este estudo se filia a corrente doutrinária que enquadra o magistrado na categoria dos servidores públicos, que são todos os agentes que, exercendo com caráter de permanência uma função pública em decorrência de relação de trabalho, integram o quadro funcional das pessoas federativas, das autarquias e das fundações públicas de natureza autárquicas.[55] Verifica-se, pois, que o liame estabelecido entre o Estado e o juiz, possui natureza profissional e não política, sobre o tema leciona Rocha:

É fácil verificar que a Constituição qualifica o juiz como servidor público, inserido em uma carreira administrativa, distribuída em graus e classes a que correspondem diferentes vantagens e salários, ascendendo dos cargos inferiores aos superiores pelo procedimento das promoções, decididas segundo as apreciações subjetivas dos membros dos tribunais das diferentes justiças, salvo quanto às promoções por antiguidade, que obedecem ao critério objetivo do tempo de serviço, admitindo, porém, a figura da desclassificação do magistrado pro razões de interesse público, cuja avaliação é, também, de natureza subjetiva.[56]

Ao tratar acerca da responsabilidade do Estado, a Constituição Federal no seu art. 37, § 6o emprega o termo “agentes”, sem, todavia ressaltar de modo a excluir o magistrado dessa norma constitucional, por conseguinte o juiz como servidor público que é, está abrangido por esta disposição, apesar das garantias e prerrogativas inerentes a função que executa, e no caso de provocar eventual dano no exercício jurisdicional, ensejará o direito à indenização, devendo o Estado ser instado a reparar, isto posto, Avelino exprime que a independência do magistrado e sua imparcialidade no julgamento das ações não estariam ameaçadas pela responsabilidade do Estado, visto que neste caso o juiz apenas responderia regressivamente, provada a culpa ou dolo deste, em consonância com a regra constitucional.[57]

Finalmente o argumento da imutabilidade da coisa julgada, o Código de Processo Civil em seu art. 467, dispõe: “Denomina-se coisa julgada material e eficácia, que torna imutável e indiscutível a sentença, não mais sujeita a recurso ordinário e extraordinário”, esse instituto jurídico estabelece lei entre as partes  processuais.

Diante do exposto, uma vez proferida a sentença, caso as partes interponham os recursos cabíveis ou se estes tenham sido julgados improcedentes,  a decisão adquire a qualidade de imutável e indiscutível, estes atributos são peculiares ao ato jurisdicional, a fim de que a segurança jurídica impere, não se  permitindo, portanto, que as querelas judiciais se propaguem no tempo de modo  indeterminado, fomentando a incerteza no meio social.

O respeito à coisa julgada figura como direito fundamental garantido constitucionalmente: “Art. 5, XXXVI. A lei não prejudicará o direito adquirido, o jurídico perfeito e a coisa julgada”. A presunção de verdade decorrente da decisão que transitou em julgado e a segurança que ela acarreta alicerçam a defesa da coisa julgada como entrave a responsabilidade do estado pela  atividade jurisdicional, aduzindo-se que tal responsabilização resultaria em um enfraquecimento do instituto da coisa julgada, e consequentemente, fomentaria a  instabilidade nas relações jurídicas ao se questionar a verdade atingida na resolução de um litígio.

Rebate-se esse entendimento, ao se perceber que o fato de que a decisão transitou em julgado não significa a verdade ou a solução mais justa, conforme  analisa Leite “a coisa julgada não pode ser vista de maneira absoluta, sob pena de  encobrir, determinadas injustiças que não são menos nocivas à vida social e a ordem  jurídica”.[58]

Conquanto, represente um dos argumentos impeditivos da responsabilidade do Estado por atos jurisdicionais, especificamente o mais proeminente, não institui  um obstáculo insuperável apenas limitativo, já que o dever de indenizar está atrelado a  necessidade da prévia desconstituição da sentença irrecorrível, através dos  mecanismos processuais adequados, que correspondem à ação rescisória (tratando-se  de matéria cível), prevista no art. 485 do Código de Processo Civil, e a revisão criminal, que está disciplinada no art. 622 do Código de Processo Penal.

Partidária desta tese Di Pietro preleciona:

O fato de ser o Estado condenado a pagar indenização decorrente de dano  ocasionado por um ato judicial não implica mudança na decisão judicial . A decisão continua a valer para ambas as partes; a que ganhou e a que perdeu continuam vinculadas aos efeitos da coisa julgada, que permanece inatingível. É o Estado que terá de responder pelo prejuízo que a decisão imutável ocasionou a uma das partes, em decorrência de erro judiciário.[59]

Diante do exposto, infere-se que são perfeitamente rebatíveis os argumentos justificadores da irresponsabilidade estatal por atos jurisdicionais, oriundos do exercício da soberania do Poder Judiciário, respeito à coisa julgada e a preservação da independência do juiz, que figura como servidor público.

CAPÍTULO III

ATIVIDADES JURISDICIONAIS CABÍVEIS DE INDENIZAÇÃO

3.1 RESPONSABILIDADE PESSOAL DO JUIZ   

A responsabilidade do Juiz é diferenciar as atividades praticadas no exercício de suas funções, pois como representante do Poder Judiciário, pode ser autônomo ou independente, e tem a seu cargo a prática de atos  juridicionais.

Anteriormente, analisou-se que os prejuízos procedentes da atividade jurisdicional devem ser atribuídos ao Estado, visto que o juiz está enquadrado como  servidor público.

O artigo 133 do Código de Processo Civil fixa as situações em que ocorrer a responsabilidade civil do juiz, proveniente de danos provocados no  exercício de suas atribuições legais. A disposição legal mencionada prevê:

Responderá por perdas e danos o juiz quando:

I – no exercício de suas funções, proceder com dolo ou fraude;

II   – recusar, omitir ou retardar, sem justo motivo, providência que deva ordenar de ofício, ou a requerimento da parte.

Parágrafo único. Repurtar-se-ão verificadas as hipóteses previstas no nº II  só depois que a parte, por intermédio do escrivão, requerer ao juiz que  determine a providência e este não lhe atender o pedido dentro de 10 (dez)  dias.

A Lei Orgânica da Magistratura (LOMAM, Lei Complementar n° 35/79  em seu artigo 49 dispõe de forma idêntica a norma supra citada. A indagação que surge  é se o juiz pode ser pessoalmente demandado, uma vez que do exercício de suas funções pode originar o dever de indenizar por parte do Estado, conclui-se que responde primária e diretamente frente ao prejudicado, podendo o magistrado responder regressivamente, perante o Estado, nos casos em que se provasse a culpa ou o dolo daquele. Acerca do assunto, valiosa a explicação de Pantaleão &  Marcochi:

Em relação à responsabilidade pessoal do magistrado por ato jurisdicional,  importante analisar o art. 133 do Código de Processo Civil que, deve ser analisado à luz da Constituição federal de 1998, tendo em vista datar de 1973. Aplicado o mandamento constitucional, observa-se que, na hipótese do juiz proceder com dolo ou fraude no exercício de suas ações, a  responsabilidade civil recai sobre o Estado que haverá direito de regresso em face de seu agente e, no caso de haver recusa, omissaão ou  retardamento, sem justo motivo, em providência que deva ser ordenada de  ofício, ou a requerimento da parte, a responsabilidade civil será pessoal do  juiz, com natureza correicional, ex vi os mandamentos da Lei Orgânica da  Magistratura Nacional (art. 49, Lei Complementar n° 35/79). De acordo com esta previsão numerus clausus, a obrigação de indenizar é pessoal do magistrado quando tenha agido com dolo (posto que a fraude é uma conduta dolosa) e culpa, sob a modalidade de negligência, ou seja, recusar, omitir ou retardar.[60]

Leciona Ruy Stoco que a conduta culposa do juiz ocorre tão logo a parte cumpra o disposto no parágrafo único do art. 133 do Código de Processo Civil, independentemente de ação judicial na qual se verificou a ocorrência ter ou não sido julgada. No entanto, para caracterizar o procedimento doloso ou fraudulento, há necessidade de expresso reconhecimento em ação rescisória.[61]

Discordando deste pensamento, Nelson Nery Jr. entende que a responsabilidade pessoal do juiz somente ocorrerá se tiver agido com dolo ou fraude. A culpa no exercício da atividade jurisdicional não acarreta, para o magistrado, o dever de indenizar, pode acarretar, em tese, esse dever para o Pode Público, nos termos do artigo 37, § 6° da Constituição. [62]

Adverte-se que a responsabilidade pessoal do juiz não exclui a responsabilidade do Estado, sendo possível que o lesado demande ação contra os dois, solidariamente. Por conseguinte, deduz-se que se tratando de atividade jurisdicional danosa, na qual não está revestida de dolo ou culpa do magistrado, o Estado responderá sozinho, por força da responsabilidade objetiva que está sujeito. Caso venha a se provar que houve dolo, a exemplo da fraude, o Estado e o Juiz poderão responder em conjunto, bem como o magistrado tão somente e, por derradeiro, cuidando-se de conduta culposa do juiz, a ação será intentada apenas em face do Estado, que poderá exercer o direito de regresso, depois de sofrida a condenação judicial.

3.2 DEMORA NA PRESTAÇÃO JURISDICIONAL

Hodiernamente, uma das críticas mais recorrentes ao Poder Judiciário concerne à demora na entrega da prestação jurisdicional. No seio social a justiça é vista como lenta e burocrática, contribuindo, para tanto, o excessivo número de processos sob a guarda de um contingente insuficiente de juízes e serventuários, associado a um aparelhamento estrutural, que na maior parte, encontra-se  ultrapassado, além do formalismo exagerado dos procedimentos processuais. Assim sendo, debate-se a necessidade de uma prestação jurisdicional mais célere, visto que a procrastinação na sua entrega fomenta o senso comum de um Estado prolator de injustiça. Todavia, salienta-se que ao se promover a defesa do princípio da instrumentalidade, sem olvidar, da indispensável efetividade jurisdicional, isto é,  Cândido Rangel Dinamarco observa que a questão da instrumentalidade do processo não é recente, e a aspiração reside no estabelecimento de um novo método do pensamento tanto do magistrado quanto do serventuário. Importando na  colocação do processo no seu devido lugar, a fim de se evitar os males do exagerado  processualismo. E, simultaneamente, cuidar de preparar o processo e o seu uso de modo tal que os objetivos sejam convenientemente conciliado e realizados tanto quanto possível. O processo há de ser, nesse contexto, instrumento eficaz para o alcance da ordem jurídica justa. Unida à instrumentalidade, surge a  efetividade que “constitui expressão resumida da ideia de que o processo deve ser apto a cumprir integralmente toda a sua função sócio-política-jurídica, atingindo em toda a sua plenitude todos os escopos institucionais”.[63]

Há que se ater no conceito de duração razoável do processo, conjugando  celeridade e efetividade, sem por em risco a segurança jurídica, ou seja, jamais obstacularizar o contraditório e ampla defesa, garantias constitucionais tanto quanto o acesso à justiça.

A jurisdição ao ser exercida exclusivamente pelo Estado, sendo este titular, impede que os particulares a realizem pessoalmente, o que configuraria uma espécie de autotutela[64]. O Estado ao se comprometer em prestar á jurisdição,  obrigou-se a desempenhá-la com os mesmos requisitos dos demais servidores públicos e no momento de sua solicitação, deve, para isto, estar munido dos recursos pessoais e materiais indispensáveis, seguidor deste raciocínio Aliomar Baleeiro assevera:

Acho que o Estado tem o dever de manter uma justiça que funcione bem como o serviço da luz, de polícia, de limpeza ou qualquer outro. O serviço da justiça é, para mim, um serviço público como qualquer outro (RTJ 64/714; RDA 114/325).[65]

Porquanto, o Estado no desempenho da atividade jurisdicional realiza um serviço público, torna-se tão responsável pelos seus atos danosos quanto o é em relação aos atos administrativos.

A função jurisdicional deve ser realizada em conformidade com as prescrições processuais fixadas na legislação atinente, ou seja, segue-se a determinados procedimentos, representados por uma sequência de atos que se submetem a  prazos e a formalidades, sob pena de serem os atos praticados pelas partes eivados de vício o que, poderiam futuramente, torná-los sem efeito. Este apego à forma tem o fim de conferir maior segurança ao próprio jurisdicionado.

Todavia, há nítida distinção entre o tempo que se requer para o trâmite de um processo judicial, daquele que representa o retardamento despropositado na entrega da prestação jurisdicional. Neste diapasão, explica Cruz e Tucci:

Não se pode olvidar, nesse particular, a existência de dois postulados que em princípio, são opostos: o da segurança jurídica, exigindo, como já salientado, um lapso temporal razoável para a tramitação do processe (‘tempo fisiológico’), e o da efetividade deste, reclamando que o momento da decisão final não se procrastine mais do que o necessário (‘tempe patológico’).[66]

O STF adota a teoria da irresponsabilidade do Estado concernente à demora na prestação jurisdicional, com espeque na não previsão legal desta hipótese, demonstrando, deste modo, uma visão anacrônica sobre o tema. Divergindo desta concepção, o voto vencido do Ministro Aliomar Baleeiro, no RE n. 32518/RS:

Dou provimento ao recurso porque me parece subsistir, no caso, responsabilidade do Estado em não prover adequadamente o bom funcionamento da justiça, ocasionando, por sua omissão de recursos materiais e pessoais adequados, os esforços ao pontual cumprimento dos deveres dos juízes. Nem poderia ignorar essas dificuldades, porque, como consta das duas decisões contrárias ao recorrente, estando uma das comarcas acéfala, o que obrigou o juiz a atendê-la, sem prejuízo da sua própria – ambas congestionadas de serviço – a Comissão de disciplina declarou-se em regime de exceção, ampliando os prazos. Ele se eximiria – penso – se provasse que o prejuízo ocorreu, ou ocorreria,  ainda que tivesse empregado todos os meios adequados para evitá-lo. Aí, sim, poder-se-ia falar em força maior. Responde, pois, pela omissão, causa eficiente de prejuízo, como responderia pela ação, se ela fosse a origem da lesão. Se não foi desidioso o juiz, desidiosas foram as autoridades  superiores, inclusive os órgãos dos três poderes do Estado, pela situação  calamitosa de desordem em que submergiu o direito do autor, usuário legítimo do serviço público judiciário, para o que pagou a taxa judiciária e selos dos autos, além dos impostos.[67]

Estão seguindo este entendimento, mesmo contrário ao STF, a doutrina pátria moderna e inclusive alguns juízes, a exemplo da Juíza Federal Maria Ferreira dos Santos em sentença proferida no processo n° 89.0017372-3 JF-SP (9.11,95):

A morosidade da Justiça é causa maior de seu descrédito pelo jurisdicionado: causa angústia insatisfação. O Poder Judiciário constitucionalmente investido na função da composição de conflitos, ao  demorar para dar seu veredicto, acaba, ele mesmo, por ser causa de mais  insatisfação e, consequentemente, de mais conflito. A Constituição Federal  de 1988 assegura o acesso à justiça. Ao lado da garantia constitucional do  direito de ação está a triste realidade da tramitação morosa dos processos que fulmina os direitos fundamentais do cidadão, acaba com as esperanças do jurisdicionado e aumenta o descrédito na justiça. A mesma interpretação pode ser dada ao texto constitucional de 1067, vigente à época dos fatos. A justiça brasileira está congestionada. Porquê? Porque lhe falta infra-estrutura mínima para funcionar e ser eficiente: instalações adequadas, funcionários qualificados, juízes em número suficiente, leis processuais menos burocráticas. Mas, acima de tudo, é necessário que o próprio Estado seja o primeiro a cumprir a Lei, e não o maior causador de seu descumprimento. O jurisdicionado não pode pagar por esta situação lamentável em que nos encontramos. Cabe à União Federal, no caso, velar e zelar para que os serviços públicos, inclusive o serviço judiciário, seja eficientes; cabe a esse ente político a criação de condições para que esse serviço seja bem prestado. De nada adianta o trabalho insano de juíz e  funcionários se a estrutura em que se assentam não é adequada ao serviço  que devem prestar. Mas, repito, o jurisdicionado não deve pagar  por isso.  Continua ele a ter direito á prestação jurisdicional eficaz, ou seja, apta à solução dos conflitos. Se a União Federal, ente político incumbido da  prestação do serviço, não o põe à disposição do jurisdicionado de modo eficiente, e se dessa deficiente atuação sobrevem dano, incumbe-lhe indenizar.[68]

No contexto em está inserido a sociedade brasileira, este parece ser  o pensamento mais acertado, para não dizer justo, a qual pende esta pesquisa,  conquanto, há que se analisar com bastante acuidade a responsabilidade do Estado por danos oriundos do atraso na prestação jurisdicional, pois a referida procrastinação não decorre tão somente por desídia do juiz ou pelo mal  aparelhamento humano e estrutural do Poder Judiciário Brasileiro. No processo judicial participam o Estado-Juiz, as partes por intermédio de seus advogados, o Ministério Público, em determinados casos, e os auxiliares da Justiça, porquanto podem ser vários os motivos, estranhos à atuação estatal, que podem ocasionar adiamento da decisão judicial.

Paulo Modesto adverte que para que a responsabilidade estatal surja em razão da demora de atuação do Poder Judiciário deve-se adotar um padrão ou parâmetro que separe a demora justificada e a demora excessiva, anômala inescusável e negada pelo direito, ressaltando:

Nem toda violação de prazo processual caracteriza um dano ressarcível para efeitos indenizatórios. A violação de prazo processual é indício de omissão antijurídica, mas não traduz elemento de caracterização suficiente A complexidade da demanda, objetiva e subjetiva, a conduta dilatória das partes, as dificuldades técnicas de comunicação dos atos processuais, por exemplo, são ocorrências que podem conduzir á inviolabilidade prática de fiel cumprimento dos prazos legais.[69]

Como já estudado, a responsabilidade do Estado por atos jurisdicionais é objetiva, podendo ser excluída na ocorrência de determinadas causas, tratando-se especificamente da demora na prestação jurisdicional não enseja reparação quando o dano sobrevier por fatos atribuíveis às próprias partes, em razão da necessidade da feitura de alguma diligência de alta complexidade, ou seja, deve se considerar as razões do retardamento do feito. Portanto, somente é cabível indenização quando o atraso ocorrer por conta exclusiva da negligência do magistrado, a responsabilidade é pessoal deste, onde o mesmo pode sofrer inclusive sanções pecuniárias,  administrativas e até penais, sem prejuízo do previsto no art. 133, II, e paragrafo único do CPC. Sobre o assunto, Mário Porto colige que caso o retardamento for por culpa do juiz associado à falta do serviço solicitado, responderá o Estado, podendo demandar, regressivamente, o juiz que agiu com culpa, por fim, se ficar comprovado que as autoridades encarregadas da fiscalização e correição das atividades judiciárias atuarem com desídia, haverá culpa in vigilando, culminando em responsabilidade do Estado e da autoridade faltosa.[70]

3.3 ERRO JUDICIÁRIO

A indenização do Estado por erro judiciário está prevista constitucionalmente (art. 5o, LXXV, CF), configurando uma garantia individual, doutrinariamente há controvérsia acerca da abrangência do conceito de erro judiciário. José de AguiarDias compreende o erro judiciário sob uma óptica restrita, considerando-o apenas a sentença criminal de condenação injusta, alcançando, também a prisão preventiva injustificada, excluindo, porém, as hipóteses de má-fé, abuso ou desvio de poder magistrado.[71] De outro lado, há os partidários de uma ideia ampla, como seguidor desta Hentz afirma que o erro judiciário pode ocorrer tanto no processo de conhecimento quanto no cautelar, de natureza civil ou penal, incluída neste a prisão preventiva.[72] Cotejados os conceitos, parece mais acertado abranger a definição,  visto que o erro judiciário pode acontecer em qualquer âmbito processual em que atue a jurisdição, seja no penal, civil, trabalhista, eleitoral etc, podendo ser um erro no procedimento ou na decisão, oriundo de erro, dolo ou culpa (negligência,  imperícia ou imprudência). Deste modo, enquadra-se em de erro judiciário as hipóteses de mau funcionamento da Jurisdição, responsabilizando o Estado por dolo, fraude ou culpa grave do magistrado, ou por culpa do serviço púlico judiciário,  por motivo de inércia, negligência ou desordem na manutenção e funcionamento dos serviços judiciais, e não por causa da conduta do magistrado.

Serrano Júnior enumera algumas causas de erro judiciário:

1) dolo do juiz (intencionalidade); 2) culpa do juiz pela negligência ou  imprudência  proferindo sentença manifestamente contrária à prova dos autos; 3) má ou incompleta instrução probatória decorrente de atuação do magistrado cerceando o direito das partes de produzir provas necessárias para demonstração das teses de acusação ou de defesa; 4) indução do magistrado ao erro, caracterizando a eximente ou atenuante de responsabilidade da culpa da vítima ou de terceiro pela produção de provas falsas ou não produção das provas necessárias ao esclarecimento da verdade; 5) aparecimento posterior de fatos que venham a contradizer ou anular os elementos de convicção que motivaram a decisão.[73]

 

Há que se pontuar que a jurisprudência brasileira dominante pugna pela responsabilidade por erro judiciário apenas no que concerne aos prejuízos decorrentes do exercício jurisdicional penal, devidamente reconhecidos por meio da revisão criminal.

Neste diapasão, Ribeiro informa que o STF pronunciou-se no julgamento do RE 69.568/SP, de forma que admitiu a ilegalidade da decisão judicial impugnada não reconheceu a reparação do Estado. Discutia-se sobre uma decisão do juiz, de uma das Varas da Família do Poder Judiciário do Estado de São Paulo, que suspendeu, em caráter provisório, todos os órgãos dirigentes de uma fundação e nomeou três interventores para administrá-la. A fundação inconformada impetrou Mandado de Segurança contra o ato judicial, o TJ/SP concedeu a segurança, que foi mantida pelo STF, todavia, ao julgar o pedido de indenização pelos danos provenientes desse ato judicial, o excelso tribunal aplicou a tese da irresponsabilidade do Estado por atos decorrentes do exercício da atividade jurisdicional.[74]

Ainda sobre a questão, colaciona-se o seguinte julgado presente no informativo 156 do STF:

A responsabilidade objetiva do Estado não se aplica aos atos do Poder Judiciário em sua função jurisdicional, a não ser nos casos expressamente declarados em lei. Com esse entendimento, a Turma, por ofensa ao art. 37, § 6o, da CF, conheceu de recurso extraordinário do Estado do Paraná e lhe deu provimento para reformar acórdão do Tribunal de Justiça estadual, que reconhecera o direito de indenização a adquirente de imóvel com base no presumido error in judicando do juiz que anulara a venda do bem por fraude à execução – já que o mesmo era objeto de penhora -, cuja penhora não havia sido arquivada no cartório de registro de imóveis, sem prova da má-fé do adquirente. Precedentes citados: RE 32.519-RS (RTJ 39/190); RE 69.568-SP(RTJ56/273). RE 219.117-PR, Rel. Min. Ilmar Galvão, 3.8.99. Disponível em: <http:www.stj.gov.br> acesso em 01 de setembro de 2006.

No que pertine ao condenado que cumpre pena no lugar de homônimo, é pacífico o entendimento do direito à indenização pelo Estado, conforme se depreende do teor da decisão a seguir:

Erro judiciário – Condenação do peticionário por fato delituoso praticado por homônimo seu – Fato Exuberantemente demonstrado – Revisão deferida -Inteligência dos arts. 621, 627 e 630 do Código de Processo Penal. Demonstrado exuberantemente, não ser o peticionário, mais homônimo seu, o autor do crime pelo qual foi condenado, defere-se a revisão requerida para todos efeitos de direito, inclusive para o disposto nos arts. 627 e 630 do Código de Processo Penal.[75]

Igual situação para aquele que não cometeu um ilícito penal, mas que cumpre pena e, que resta comprovado em revisão criminal, qualquer das previsões do art. 386 do CPC, in verbis:

Art. 386. o juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça:

I – estar  provada a inexistência do fato;

II- não haver  prova da existência do fato;

III  – não constituir o fato infração penal;

IV – não existir prova de ter o réu concorrido para a infração penal;

V  – existir circunstância que exclua o crime ou isente o réu de pena (arts.17, 18, 19, 22 e 24, § 1º, do Código Penal);

VI – não existir prova suficiente para a condenação,

Como visto a jurisprudência maciça e a doutrina tradicional apenas admitem indenização por erro judiciário, oriundo de sentença condenatória prolatada em processo criminal. Entendem que, no juízo cível, a responsabilidade limita-se ao juiz nos casos de dolo, fraude ou desídia no exercício das funções, com fulcro no 133 do CPC e o art. 49 da LOMAM.[76] Em contraponto a esta visão restrita,  atualmente os operadores do direito vislumbram um campo maior, onde mais casos são alcançados, além dos previstos na CF/88 e no art. 630 do CPC. Filiado a esta noção moderna, Augusto Dergint observa que:

As mesmas  razões teóricas que justificam a indenização das vítimas de erro judiciário penal parecem justificar a indenização das vítimas de erro judiciário civil, pois o erro judiciário deve ser tido como um risco inerente ao próprio exercício da função jurisdicional. Cabe, portanto, ao Estado assumí-lo,  reconhecendo-se devedor, todas as vezes em que um ato jurisdicial provocar um dano injusto.[77]

Mostra-se, este ensino, mais condizente com o regime Democrático de Direito e com os fundamentos constitucionais da cidadania e a dignidade da pessoa humana cumulado com o dever de eficiência do serviço público (arts. 1o, II e III c/c 37, § 6 da CF), visto que o erro judiciário pode ocorrer em qualquer âmbito  jurídico, ao se solicitar a prestação jurisdicional, seja na primeira ou segunda instância, estar-se-á sujeito a erro, por conseguinte, não se poderá limitá-lo à esfera criminal, e na ocorrência de algum erro judiciário cabe ao prejudicado comprovar o nexo causal enfre o fato e o dano, restando ao Estado provar que o dano não ocorreu ou que não contribui para sua existência.

3.4 PRISÃO INDEVIDA

A Constituição Federal prevê a indenização para o condenado que cumprir pena superior a sua condenação (art. 5o, LXXV, CF), mas há que se considerar que a indenização é uma garantia fundamental do homem não podendo outras espécie de cerceamento de direito, em especial, o de locomoção, de ir e vir, ser tolhido ser qualquer respaldo para os erros que a espécie pode vir a causar, logo qualque forma de indevida privação da liberdade física, que acarrete prejuízo, deve ser passível de reparação. Valiosa a lição de Di Pietro que esclarece que, no caso de prisão cautelar, pode ocorrer que o réu venha a ser condenado e, nesse caso, o tempo em que este esteve preso é descontado do período da condenação, o que já constitui uma forma de reparação pela punição antecipada. Entretanto, em caso de absolvição, ou quando a condenação não comportar pena privativa de liberdade, ou quando a pena cominada for inferior ao tempo de prisão cautelar, surge a questão da indenização por erro judiciário.[78]

A prisão indevida representa toda e qualquer privação não justificável de liberdade, independe de ser anterior ou posterior ao trânsito em julgado da condenação penal, a exemplo da prisão cautelar, da prisão por tempo superior ao determinado na sentença e no caso da não observância do devido regime de cumprimento da pena, e não apenas a prisão decorrente de uma condenação injusta.

Importante ressalvar que, tratando-se de absolvição posterior a prisâo preventiva não surge, obrigatoriamente, o direito a ressarcimento, caso todos os pressupostos para a flagrância ou decretação da prisão tenham sido observados no momento do recolhimenta do indivíduo ao encarceramento. Sobre o tema Cavallieri explica:

[…] o Estado só poderia ser responsabilizado se ficar provado o erro judicial,  o abuso de autoridade, a ilegalidade do ato, não bastando a mera absolvição por falta de prova. Portanto, quando for decretada a medida nos termos e nos limites da lei, não há como responsabilizar o Estado,  ainda que gravosa ao seu destinatário, porque não há ilicitude no ato […].  Não vejo, por isso, fundamento para responsabilizar o Estado pela prisão preventiva, regularmente decretada, mormente porque essa prisão tem respaldo na própria Constituição, em seu art. 5o, inc. LXI. E ainda que sobrevenha absolvição do preso por falta de prova, não tem essa decisão  por si só, o condão de transmutá-la em ato ilegal, capaz de respaldar pretensão indenizatória.[79]

Ainda sobre o tema a decisão judicial abaixo:

Não há responsabilidade civil do Estado, em face de danos eventualme causados por atos de persecução penal, quando o acusado vem a ser  absolvido por falta de prova de sua participação na infração, pois que,  tanto a decretação da prisão preventiva, quanto a admissibilidade da denúncia, repousam em juízo provisório da prática delituosa, de todo legítima (TJSP – 2a Turma de Direito Público – Ap. Civ. n° 32.334-5 –Rel. Corrêa Vianna – j. 15/12/98 – JTJ-LEX 214, p. 84.[80]

O Código Civil em vigor em seu art. 954 às hipóteses em que pode haver reparação por ofensa a liberdade pessoal:

Art. 954. A indenização por ofensa à liberdade pessoal consistirá pagamento das perdas e danos que sobrevierem ao ofendido, e se este não puder provar prejuízo, tem aplicação o disposto no parágrafo único do artigo antecedente.

Parágrafo único. Consideram-se ofensivos da liberdade pessoal:

I – o cárcere privado;

II- a prisão por queixa ou denúncia falsa e de má-fé;

III – a prisão ilegal.

Esta previsão coaduna-se com os ditames constitucionais, já em relação à excludente de indenização, prevista no art 630, § 2o do Código de Processo Penal faz-se necessário tecer algumas considerações:

Art. 630. O tribunal, se o interessado o requerer, poderá reconhecer  direito a uma justa indenização pelos prejuízos sofridos.

§ 1º Por essa indenização, que será liquidada no juízo cível, responderá à União, se a condenação tiver sido proferida pela justiça do Distrito Federal  ou de Território, ou o Estado, se o tiver sido pela respectiva justiça.

§ 2° A indenização não será devida:

a)         se o erro ou a injustiça da condenação proceder de ato ou falta imputável
ao próprio impetrante, como a confissão ou a ocultação de prova em seu
poder;

b) se a acusação houver sido meramente privada.

A jurisprudência e doutrina dominante entendem que o dispositivo contido no § 2o do Art. 630, CPC não foi recepcionado pela Constituição de 1988, uma vez que esta não fixou nenhuma distinção entre os processos criminais em que terá falhado a máquina judiciária ao fornecer a prestação jurisdicional. A iniciativa da ação penal de que resultou a sentença condenatória desconstituída representa a causa remota do dano sofrido pelo ofendido; a causa imediata, eficiente e adequada, e que se sobrepõe àquela, é representada pelo erro judiciário na prolação da sentença condenatória. Pantaleão & Marcochi argumentam que se poderia admitir, apenas, é que, tendo a Justiça sido induzida a erro por fato imputado ao querelante, contra este caberia ação de regresso[81]. E, em especial, no tocante à alínea b há que se ponderar que o fato de que a acusação ser privada ou pública não causa ingerência no cabimento de reparação por parte do Estado, pois a prestação jurisdicional é pública, logo, o dano decorrente há que ser arcado pelo Poder Público.

No entanto, relevante expor que não será sempre o magistrado o único responsável pelos danos oriundos de prisão cautelar ou em flagrante, podendo recair a responsabilidade sobre o Estado, bem como, regressivamente, sobre a autoridade policial, membro do Ministério Público, ou quem quer tenha contribuído para o ato danoso.

Ao se estender a responsabilidade do Estado à prisão preventiva imperioso se faz analisar a questão com bastante cautela, porquanto a lei processual penal autoriza a privação da liberdade individual, não obstante a possibilidade desta acarretar danos, tudo em prol do interesse maior, representado pelo combate ao crime e a manutenção da segurança pública, consoante observa Tourinho Filho:

Embora pondo em perigo um dos bens mais caros e apreciados pelo homem – a liberdade – que a Lei Maior protega e reconhece, justifica-se a prisão preventiva como uma necessidade para assegurar o império efetivo do Direito Penal.[82]

 

Conclui-se, assim, que se restar comprovado a ocorrência de um erro judiciário, causado por culpa ou dolo do juiz ou inclusive falha no serviço judiciário, o Estado é obrigado a indenizar, excluindo os casos em que a prisão preventiva obedeceu aos pressupostos legais, e que tenha ocorrido a absolvição ulterior, não configura erro judiciário ou ilegalidade da prisão, não surgindo, dessa forma o direito de reparação.

CAPÍTULO  IV

AS PECULIARIDADES DO PROCESSO DE RESPONSABILIZAÇÃO DO ESTADO

Ao se demandar o Estado, com o escopo de ser ressarcido pelos danos causados por um de seus serviços, a petição inicial da ação indenizatória deve preencher não somente o rol de requisitos enumerados no artigo 282 do Código de Processo Civil, como também especificar, obrigatoriamente, a pretensão indenizatória, segundo se faz atentar a decisão infra:

Tratando-se de ação de indenização, com alegação da autora de que ocorreram prejuízos  materiais e pessoais configuradoras de danos emergentes e lucros cessantes, mas sem especificação da pretensão indenizatória, ou seja, do principal, deve-se considerar a inicial inepta, porquanto não contém pedido; pois é necessário que a inicial especifique a natureza das verbas indenizatórias que a autora pretende e a que título, se se trata de obrigação vencida, vincenda ou ambas, especificando-se e distinguindo as indenizações por danos pessoais e as por danos materiais (1o TACSP – 8a C. – Ap. – Rel. Maurício Ferreira Leite – j. 25.9.96).[83]

No que pertine a prova nas ações indenizatórias opostas ao Estado, em especial, por ocasião de responsabilidade por atos jurisdicionais, dispensa-se à vítima a comprovação da culpa ou dolo do magistrado, devendo demonstrar o comportamento judicial danoso, o dano e o nexo causal, devido à adoção da responsabilidade objetiva estatal, em consonância com o art. 37, § 6o da Carta Magna.

4.1 A DENUNCIAÇÃO DA LIDE NAS AÇÕES EM FACE DO ESTADO

Referindo-se a demandas judiciais em face do Poder Púbiico, diverge a doutrina acerca da necessidade de acionar apenas o Estado ou se deve, acionar este, conjuntamente com o agente público, num litisconsórcio passivo[84].

Ensina Theodoro Júnior (1997, p. 116), que a denunciação da lide “consiste em chamar o terceiro (denunciado), que mantém um vínculo de direito com a parte (denunciante), para vir responder pela garantia do negócio jurídico, caso o denunciante saia vencido no processo”.

O Código de Processo Civil em seu artigo 70, inciso III, dispõe:

Art. 70. A denunciação a lide é obrigatória.

I-    […].

II-   […].

III – àquele que estiver obrigado, pela lei ou pelo contrato, a indenizar em ação reqressiva, o prejuízo do que perder a demanda.

A denunciação da lide é proposta pelo denunciante contra o denunciado, estabelecendo, dessa forma, uma outra demanda processual, detentora de natureza secundária, devendo haver o julgamento conjunto com a ação principal. Góes expõe que a despeito de o denunciado ser adversário do denunciante, tem aquele interesse que este se consagre vencedor do litígio, pois, assim, não terá a obrigação de indenizá-lo dentro da ação principal.[85]

Uma primeira corrente doutrinária defende a imposição obrigatória de o autor propor a ação em face da Fazenda Pública e do agente público, cumulativamente, configurando um litisconsórcio passivo. Se a ação somente for proposta contra o Estado, este deve diligenciar denunciando a lide o agente público. Os defendores deste pensamento aduzem que: a disposição prevista no art. 70, III do Código de Processo Civil abarca todas as hipóteses de ação regressiva; que o princípio da economia processual deve imperar, bem como ao se realizar a denunciação evitasse decisões conflitantes e, por fim, o fato de recusá-la restringiria um direito do Poder Público.

A segunda corrente, afirma ser cabível a denunciação da lide nas ações opostas ao Estado, trazendo o servidor público para compor um litisconsórcio passivo conjuntamente com o Estado. Ao se denunciar, concretizaria o princípio da economia processual, uma vez que dispensaria a formação de duas ações: a primeira intentada pelo particular em face do estado e a segunda proposta, regressivamente pelo Estado contra o agente público. Rui Stoco, dissertando sobre o tema, ensina:

[…] negar o direito de o particular acionar o servidor que obrou culposamente com fundamento na responsabilidade subjetiva ou aquiliana será negar vigência ao comando emergente dos art. 159 e 160 do Código Civil […] se a lei substantiva afirma a obrigação e assegura o direito da vítima diante do ato ilícito (doloso ou culposo) do preposto, a lei processual dá os meios, como se vê no art. 46 do Código de Processo Civil, afirmando que duas ou mais pessoas podem litigar, no mesmo processo, em conjunto, ativa ou passivamente, quando: I) entre elas houver comunhão de direitos ou de obrigações relativas à lide.[86]

 

Ainda sobre o tema, Yussef Said Cahali leciona:

[…] na hipótese em que a pretensão indenizatória é deduzida com fundamento em ato doloso ou culposo do funcionário; aqui, então, deve ser feita a denunciação da lide ao funcionário, com aplicação do artigo 70, III, do CPC, que em nada contraria a Constituição; antes, pelo contrário, visa disciplinar o direito de regresso assegurado ao responsável direto pelo pagamento da indenização. O mesmo autor admite, ainda, que a ação seja proposta ao mesmo tempo contra o funcionário, hipótese também admitida por Celso Antônio Bandeira de Mello (1992:358); para ele, o dispositivo constitucional visa proteger o administrado, oferecendo-lhe um patrimônio solvente e a possibilidade da responsabilidade objetiva em muitos casos. Daí não se segue que haja restringido sua possibilidade de proceder contra quem lhe causou dano. Sendo um dispositivo protetor do administrado, descabe extrair dele restrições ao lesado.[87]

Arrematando a discurssão, os defensores de uma terceira corrente, na qual entende ser incabível a denunciação da lide do agente público, em razão dos argumentos a seguir:

–  A Constituição Federal de 1998 (art 37, §6°), ao adotar a responsabilidade objetiva do Estado, impõe que este indenize a vítima do dano, desde que reste provado judicialmente o nexo causal entre a conduta estatal e o dano percebido. A relação processual decorrente é precisamente entre o Estado e a vítima, sendo impróprio outra relação obrigacional, prevalecendo a norma constitucional ante a disposição de cunho processual (art. 70, III, do Código de Processo Civil).

–  O direito à reparação da vítima deve preponderar, não podendo ser posto em risco, em razão do retardamento na marcha processual pela admissão de mais um sujeito.

–  Intervenção de um fundamento estranho à demanda principal.

Sobre a tese, pertinente o esclarecimento dos professores Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo:

Embora não seja unânime na doutrina a respeito, a orientação dominante é no sentido de ser incabível a denunciação da lide, pois, caso exigida, essa formalidade processual resultaria em inegável prejuízo para o particular, que veria procrastinado o exercício do seu direito legítimo à reparação como vítima do dano (em razão da responsabilidade objetiva), em função da dependência que ficaria o litígio traria injustificado retardamento na recuperação do dano à vítima, que, como vimos, não depende da comprovação de culpa ou dolo do agente para ter direito a indenização.[88]

A jurisprudência também não possui um posicionamento unânime sobre a obrigatoriedade ou não da denunciação da lide, todavia, sobrepõe-se o número de decisões que interpretam pela inadmissibilidade da mesma, uma tradução disto está presente no julgado a seguir:

Correto o afastamento da denuncia à lide. O fundamento da denunciação é o inc. III, do art. 70, do CPC, com chamamento do responsável, por via de regresso, em decorrência de vínculo contratual ou legal. A hipótese dos autos, para a espécie de denunciação, como regresso por vínculo legal, tem fulcro na inovação do art. 37, § 6o, da CF, ação eventual que o Estado possa exercer contra o direto responsável, por culpabilidade própria. A primeira e segunda parte do citado dispositivo constitucional envolvem responsabilidade de natureza diversa, uma pelo risco administrativo, outra pela responsabilidade aquiliana, a outorgar fundamento jurídico diverso de cada hipótese. A introdução de fundamento jurídico novo na lide é incompatível com o instituto da denunciação, na espécie preconizada, art. 70, III, do CPC, cuja aplicação deve ser limitada às hipóteses de necessária garantia do resultado da demanda, por vínculo contratual ou legal. Tal não se inscreve como a hipótese de denunciação presente, dada a autonomia, das responsabilidades em exame (1o TACSP – 1o C. Esp. De jan./93 – Ap 511.292-5 – Rel. Oscarlíno Moeller – j. 2.2.93).[89]

Assim, inclina-se esta pesquisa, para este entendimento, uma vez que, caso não ocorra a denúncia a lide na ação indenizatória, o direito de regresso do Estado não se esgota, podendo ser exercido em ação própria, ou seja, o Estado indeniza a vítima, independentemente de dolo ou culpa do agente público, que ressarce o Poder Público, regressivamente, em caso de comprovação do dolo ou culpa de sua parte, e principalmente, por não dificultar a exercício do direito do particular à reparação cabível, o que fatalmente ocorreria se se impusesse a obrigatoriedade da denunciação a lide, e no caso específico das atividades jurisdicionais danosas o entendimento não é distinto, como expõe o julgado abaixo:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. ACÃO
REPARATÓRIA POR ATO ILÍCITO. ILEGITIMIDADE DE PARTE PASSIVA.
2. RESPONSABILIDADE EXCLUSIVA DO ESTADO. A autoridade judiciária
não tem responsabilidade civil pelos atos jurisdicionais praticados. Os
magistrados enquadram-se na espécie agente público, investidos para o
exercício de atribuições constitucionais, sendo dotados de plena liberdade
funcional no desempenho de suas funções, com prerrogativas próprias e
legislação especifica. 3. Ação que deveria ter sido ajuizada contra a
Fazenda Estadual – responsável eventual pelos alegados danos causados
pela autoridade judicial, ao exercer suas atribuições -, ao qual,
posteriormente, terá assegurado o direito de regresso contra o magistrado
responsável, nas hipóteses de dolo ou culpa. 4. Legitimidade passiva
reservada ao Estado. Ausência de responsabilidade concorrente em face dos eventuais prejuízos causados a terceiros pela autoridade julgadora no exercício de suas funções, a teor do art.37, §6°, da CF/88. 5. Recurso Extraordinário conhecido e provido. RE 228.977-2/SP. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. Relator(a): Min. NÉRI DA SILVEIRA. Julgamento: 05/03/2002. Órgão Julgador: SEGUNDA TURMA. Publicação: DJ 12-04-2002. PG-12977 EMENT VOL-2064-4 PG-10. (STF. Extraído em 28 Out. 2005 de http://www.stf. gov.br/jurisprudencia/IT/frame.asp?classe=RE&processo=228977&origem=IT&cod_classe=437).

4.2 A NECESSIDADE  DE  DESCONSTITUIÇÃO DO JULGADO PARA A AÇÃO DE INDENIZAÇÃO

É questão controvertida na doutrina a necessidade de desconstituição do julgado para a propositura da ação de indenização contra o Estado.

Há uma vertente que defende a dispensa da desconstituição do julgado, seja ele cível ou criminal, com o fito do ressarcimento do prejuízo por decisão judicial, visto que a indenização pode ser proposta em ação autônoma, configurando, portanto, a coisa julgada como entrave para o exame da decisão prejudicial. Filiado a esta corrente, Augusto Dergint expõe:

Mesmo se prescrita a ação rescisória, é de se admitir possa o prejudicado, pelo erro do Estado-Juiz, obter indenização, ainda que mantido o julgamento transitado em julgado. Atente-se para o fato de que na ação indenizatória não se busca a desconstituição da sentença lesiva e não se vinculam as mesmas partes (mas uma delas e o Estado). Assim sendo, a responsabilidade não se contrapõe à coisa julgada, sendo descipienda a desconstituição do ato jurisdicional (através da ação rescisória).[90]

Este entendimento doutrinário é minoritário. A doutrina brasileira, majoritariamente, defende a necessidade da desconstituição do julgado, em virtude da imutabilidade da coisa julgada, conforme já analisado, oportunamente, neste estudo, o instituto jurídico em comento é atributo peculiar ao ato jurisdicional, cuja finalidade é o império da segurança jurídica, não se permitindo que as contendas judiciais se propaguem no tempo, fomentando a incerteza na sociedade. Isto posto, entende-se pela necessidade de inicialmente anular o julgado, para, posteriormente pleitear a indenização, que acaso este tenha ocasionado.

Rui Stoco, porém, ressalva alguns casos em que se pode dispensar essa exigência, quando, por exemplo, tratar-se de prisão injusta, com flagrante abuso de poder da autoridade policial e o cumprimento da pena, em lugar, de indivíduo homônimo, como também quando a decisão judicial, transitada em julgado, prejudicar terceiro.[91]

 

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

A responsabilidade civil consiste na obrigação de reparar economicamente os danos causados a terceiros, sejam no âmbito patrimonial ou moral. Assim, em razão de um dano patrimonial ou moral é possível o Estado ser responsabilizado e, consequentemente, deverá pagar uma indenização capaz de compensar os prejuizos causados. A partir desta análise a presente pesquisa objetivou analisar a responsabilidade civil do Estado por atos jurisdicionais no ordenamento brasileiro, isto é, a forma e as hipóteses em que se vislumbra o direito de indenização pelos danos decorrentes do serviço público judiciário. Antes de examinar especificamente esta modalidade de obrigação realizou-se uma exposição histórica de diversas teses sobre a responsabilidade civil do Estado, desde a sua fase de total irresponsabilidade, passando pela responsabilidade subjetiva e culminando com a responsabilidade objetiva. A previsão da obrigação do Poder Público indenizar a vitima de uma prestação jurisdicional está prevista no art. 37, § 6o da Constituição Federal de 1988, onde se impõe o dever a todos os Poderes estatais de reparar os danos que seus agentes, nessa qualidade, causem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa. O texto constitucional prevê a responsabilidade objetiva do Estado, adotada a teoria do risco administrativo, e subjetiva do agente público, para configurar o dever de reparar do ente estatal é imprescindível a existência de três pressupostos: a conduta comissiva ou omissiva decorrente da atividade judiciária; o prejuízo seja ele material ou moral e o nexo causal entre ambos. A responsabilidade em tela pode ser excluída, caso venha o dano ser proveniente de culpa exclusiva da vítima ou de terceiro, caso fortuito ou força maior, além de, ainda, poder ser minorada, se ocorrer culpa concorrente do jurisdicionado.

A jurisdição representa a prestação exercida pelo Estado, com caráter de definitividade, visando à resolução dos conflitos intersubjetivos, em consonância com o ordenamento jurídico pátrio, no intuito de harmonizar a vida em sociedade, esta função é exclusiva do Poder Público não podendo o particular utilizar-se da autotutela, por conseguinte resta ao Estado assumir os riscos inerentes ao serviço prestado. Como exposto, existe uma corrente defensora da irresponsabilidade do Poder Judiciário face aos seus atos jurisdicionais, aqueles de cunho decisório, os esteios para tal tese são que: o Poder Judiciário é soberano; os juízes têm que agir com independência no exercício de suas funções, sem o temor de que suas decisões possam ensejar a responsabilidade do Estado; o magistrado não é funcionário público; a indenização por dano decorrente de decisão judiciai infringiria a regra da imutabilidade da coisa julgada, porque implicaria o reconhecimento de que foi proferida com violação da lei.

Alegações esta que foram rebatidas, concluindo-se que: a) a concepção que existe uma antinomia entre a responsabilidade do Estado e a soberania é  ultrapassada, porque se prevalece esta tese a prerrogativa, necessariamente deveria se estender para todos os Poderes, o que na prática não ocorre, visto que é questão pacífica o dever de indenizar do Poder Executivo em face dos prejuízo que seus serviços venham a causar aos particulares; b) à independência da magistratura é prerrogativa fundamental para o exercício da função jurisdicional, não podendo, contudo, servir de embasamento para a irresponsabilidade, uma vez que são viáveis a independência do juiz e a responsabilidade do Estado por atos danosos de seus agentes. O magistrado está inserido na categoria dos servidores públicos, pois, o liame estabelecido entre ele e o Estado possui natureza profissional e não política, a independência do magistrado e sua imparcialidade no julgamento das ações estariam ameaçadas pela responsabilidade do Poder Público, já que neste caso o juiz apenas responderia regressivamente, provada a culpa ou dolo deste,em consonância com a regra constitucional; c) a imutabilidade da coisa julgada sem dúvidas consiste no argumento mais significativo da teoria da irresponsabilidade do Poder Judiciário, no entanto, não institui um obstáculo impeditivo apenas limitativo, já que o dever de indenizar está atrelado a necessidade da prévia desconstituição da sentença irrecorrível, utilizando-se dos mecanismos processuais adequados, que correspondem à ação rescisória, prevista no art. 485 do CPC e a revisão criminal que está disciplinada no art. 622 do CPP.

Observou-se que o Estado pode ser responsabilizado por atos jurisdicionais não apenas nos casos previstos no art. 5o, LXXV da CF, isto é, colige-se que erro judiciário pode acontecer em qualquer âmbito processual em que atue a jurisdição,  seja no penal, civil, trabalhista, eleitoral etc., podendo ser um erro no procedimento ou na decisão, oriundo de erro, dolo ou culpa (negligência, imperícia ou imprudência), inserindo-se neste contexto as hipóteses de mau funcionamento da Jurisdição, onde o Estado pode ser responsabilizado por dolo, fraude ou culpa grave do magistrado, ou por culpa do serviço público judiciário, por motivo de inércia, negligência ou desordem na manutenção e funcionamento dos serviços judiciais, e não por causa da conduta do magistrado.

No que tange à questão da prisão, não apenas a por tempo superior á condenação enseja indenização, verificou-se que toda prisão indevida que cause dano, pode se tornar objeto de uma pretensão reparatória face ao Poder Público. Dessa forma, prisão indevida representa toda e qualquer privação não justificável da liberdade, independe de ser anterior ou posterior ao trânsito em julgado da condenação penal, a exemplo da prisão cautelar, da prisão por tempo superior ao determinado na sentença e no caso da não observância do devido regime de cumprimento da pena, e não apenas a prisão decorrente de uma condenação injusta. Por fim, conclui-se este ponto, afirmando-se que a demora injustificada na prestação jurisdicional também faz surgir o direito a ter recomposto o prejuízo que esta venha a ocasionar, pois, o Estado ao se comprometer em prestar a jurisdição, obrigou-se a desempenhá-la com os mesmos requisitos dos demais serviços públicos e no momento de sua solicitação, deve, para isto, estar munido dos recursos pessoais e materiais indispensáveis, deve-se, porém, ressaltar que somente é cabível indenização quando o atraso ocorrer por conta exclusiva da negligência do magistrado, onde a responsabilidade será pessoal deste, onde o mesmo pode sofrer inclusive sanções pecuniárias, administrativas e até penais, sem prejuízo do previsto no art. 133, II, e parágrafo único do CPC. Caso o retardamento for por culpa do juiz associado à falta do serviço solicitado, responderá o Estado, podendo demandar, regressivamente, o juiz que agiu com dolo ou culpa, por fim, se ficar comprovado que as autoridades encarregadas da fiscalização e correição das atividades judiciárias atuarem com desídia, haverá culpa in vigilando, culminando em responsabilidade do Estado e da autoridade faltosa.

Quanto ao segundo questionamento, examinou-se que o magistrado pode vir a ser responsabilizado pessoalmente nas seguintes circunstâncias: quando o juiz proceder com dolo ou fraude no exercício de suas ações, a responsabilidade civil recai sobre o Estado que haverá direito de regresso em face de seu agente e, no caso de haver recusa, omissão ou retardamento, sem justo motivo, em providência que deva ser ordenada de ofício, ou a requerimento da parte, a responsabilidade civil será pessoal do juiz, com natureza correicional, ex vi os mandamentos da Lei Orgânica da Magistratura Nacional (art. 49, Lei Complementar n° 35/79). De acordo com esta previsão numerus clausus, a obrigação de indenizar é pessoal do magistrado quando tenha agido com dolo (posto que a fraude é uma conduta dolosa) e culpa, sob a modalidade de negligência, ou seja, recusar, omitir ou retardar.

Finalmente, analisou-se o procedimento de responsabilização do Estado por atos jurisdicionais, onde a petição inicial da ação indenizatória deve preencher não somente o rol de requisitos enumerados no artigo 282 do Código de Processo Civil, como também especificar, obrigatoriamente, a pretensão indenizatória, quanto a prova, dispensa-se à vítima a comprovação da culpa ou dolo do magistrado, devendo demonstrar o comportamento judicial danoso, o dano e o nexo causal, devido à adoção da responsabilidade objetiva estatal, em consonância com o art. 37, § 6o da Carta Magna. No caso da responsabilidade em tela, entendeu-se pelo descabimento da denunciação da lide, uma vez que, caso não ocorra a denúncia a lide na ação indenizatória, o direito de regresso do Estado não se esgota, podendo ser exercido em ação própria, ou seja, o Estado indeniza a vítima, independentemente de dolo ou culpa do agente público, que ressarci o Poder Público, regressivamente, em caso de comprovação do dolo ou culpa de sua parte, e principalmente, por não dificultar o exercício do direito do particular à reparação cabível, o que fatalmente ocorreria se  impusesse a obrigatoriedade da denunciação a lide. No arremate das peculiaridades, defende-se a necessidade de inicialmente anular o julgado, para, posteriormente, pleitear a indenização, que acaso este tenha ocasionado, ressalvadas algumas hipóteses específicas.

Colige-se, portanto, que sob o regime Democrático de Direito o Estado não
pode se eximir das obrigações a ele impostas constitucionalmente, a jurisdição
corresponde a um serviço público exclusivo do Poder Público, devendo ser prestado
com a mesma eficiência que os demais, não podendo ser imposto ao jurisdicionado
perceber os prejuízos causados pela prestação jurisdicional, isto constituiria uma
negação ao direito e a justiça, cuja persecução e manutenção justificam a existência
do Estado.

Faz-se imprescindível a responsabilização do magistrado por erro judicial, seja de qual for, para que além de reparar o dano causado, se coloque um freio nas atitudes do magistrado enquanto ser humano e passível de erros.

Portanto, não há como negar que a evolução histórica da responsabilidade civil do Estado foi essencial para a consolidação de um “Estado de direito”, vez que passou a garantir maiores benefícios aos cidadãos que sentirem-se lesados por atos estatais.

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[1] SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. J-Z. Rio de Janeiro: Forense, 196, v.3 e 4 .p. 124-125.

[2] SAVATIER, René. Traité de La responsabilité civil em droit français. 10 ed. Paris: LGDJ, 1951. 2 v. apud RODRIGUES, Silvio. Direito civil: Responsabilidade Civil. São Paulo: Saraiva. 2002. V. 04 p. 06.

[3] RODRIGUES, op. Cit. P. 07.

[4] “Indenização por ato ilícito – responsabilidade civil  por veicular notícia que afasta a freguesia de estabelecimento comercial. Dano indiscutível. Tal procedimento excede o exercício regular da profissão de jornalista, ilícito penal e civil são independentes e as penalidades respectivas. Recurso Extraordinário não conhecido” (STF – RE 67837, 31-10-69, Seção I – 1ª Turma – Rel. Min. Amaral dos Santos. Apud VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil – Responsabilidade civil. São Paulo: Atlas: 2003, v. 4p. 16).

[5] RODRIGUES, op cit., p. 09.

[6] “Atos ilícitos são os que promanam direta ou indiretamente da vontade e ocasionam efeitos jurídicos, mas contrários ao ordenamento”. VENOSA, op. Cit, p. 17.

[7] A responsabilidade aquiliana da pessoa jurídica é conseqüência lógica de sua capacidade real e  ampla de agir no mundo jurídico, por intermédio de seus órgãos, representantes, empregados e prepostos, Ibid. p. 74.

[8] BARRETO, Alex Muniz. Direito Administrativo. Leme: Edijur, 2006. P. 109.

[9] SILVA, Luiz Cláudio. Responsabilidade Civil; Teoria e prática das ações. Rio de Janeiro: forense, 2005. P.112.

[10] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 2002. P.524.

[11] STOCO, Rui. Responsabilidade civil e sua interpretação jurisprudencial: doutrina e jurisprudência. R Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. P. 59 apud LEITE, Rosimeire Ventura. Responsabilidade do Estado por atos Jurisdicionais. Campina Grande: UEPB, 2001. P. 41.

[12] O absolutismo consiste numa teoria política que prega que apenas uma pessoa, normalmente, um monarca, deve concentrar todo o poder.Designa-se, comumente, esta idéia de direito divino dos reis, na tentativa de explicar que a autoridade do governante emanaria diretamente de Deus.

[13] MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo Moderno. 3 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. P.402

[14] CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 2 ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 157 apud SILVA, Moisés Fernandes da Responsabilidade Civil do Estado. Campina Grande: UEPB, 2003. P.16.

[15] O Liberalismo na sua concepção clássica corresponde a uma ideologia que defende o primado da liberdade individual por meio da garantia legal do exercício dos direitos. Esta corrente defende uma sociedade cujo baluarte é a livre iniciativa.

[16] DI PIETRO, op. Cit.p.526

[17] LEITE, op. Cit., p.48.

[18]  CRETELLA JÚNIOR, Tratado de direito administrativo. Rio Janeiro: Forense, 1970. p. 24, apud Dl PIETRO, op. cit. p. 27.

[19] Idem, p. 527.

[20] CAVALLIERI FILHO apud LEITE, op. cit., p. 50.

[21] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 10 ed. São Paulo, Malheiros Editores, 1998. p. 615

[22] CAVALLIERI FILHO APUD LEITE, op. cit, p. 51

[23] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual da Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Lumem luris, 2005. p. 442.

[24] DI PIETRO, op. Cit., p.515.

[25] BARRETO, op. Cit., p.113.

[26] CARVALHO FILHO, op. Cit. P. 470.

[27] Idem, p. 471

[28] BARBOSA, Rui. A culpa civil das administrações públicas. Rio de Janeiro: Casa de Rui Barbosa, 1962, p. 222 apud LEITE, op. Cit., p. 53.

[29] CAMPANHOLE, Adriano; CAMPANHOLE, Hilton Lobo. Todas as Constituições do Brasil. São Paulo: Atlas, 1971. P. 437 apud RIBEIRO, Ana Cecília Rosário. Responsabilidade Civil do Estado por Atos Jurisdicionais. São Paulo: LTr, 2002, p. 32.

[30] Idem,

[31] CAMPANHOLE, A.;CAMPANHOLE, H. L apud RIBEIRO, 2002, p. 33/34.

[32] Idem, p.34.

[33] Idem, Ibidem

[34] CARVALHO FILHO. op. cit., p. 473.

[35] GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil. São Paulo: Atlas, 2003.

[36] DI PIETRO, op. Cit., p.415

[37] GONÇALVES, op. Cit., P. 205.

[38] BEVILÁQUA, Clovis. Código Civil. 10 ed., Francisco Alves, Vol. IV, p. 173 apud LEÃO, Adroaldo; PAMPLONA FILHO, Rodolfo Mário Veiga. Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2001.p.151

[39] MELLO, op. Cit., p.682.

[40] GONÇALVES, op. Cit., p.206.

[41] CARVALHO FILHO, op. Cit., p.1

[42] Soberania consiste na autoridade superior do Estado, que não encontra limitação proveniente de outros poderes que por ventura possam existir em seu território, e mediante este poder o ente estatal impõe sua vontade, de forma definitiva, norteado pelo ideal de justiça.

[43] THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. v. 1. 20 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997. p. 34.

[44] CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrine; e DINAMARCO, Cândido Rar Teoria geral do processo. 14 ed. São Paulo: Malheiros, 1998. p. 129.

45MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 32 ed. São Paulo: Malheiros Edite 2006. p. 329.

[46] DERGINT, Augusto do Amaral. Responsabilidade do Estado por Âíos Jurisdicionais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994 apud LEITE, op. cit., p. 120

[47] CRETELLA JÚNIOR, José. Responsabilidade do Estado por Atos Judiciais.RDA, 99-13 apud LEÃO,ª; PAMPLONA FILHO, R.M.V., op. Cit., p. 143.

[48] LIMA, Adriano Aparecido Arrias de. Responsabilidade civil do Estado por ato jurisdicional. Jus Navigandi, Teresina,.a. 9, n. 823, 4 out. 2005. p. 2.

[49] LIMA, Adriano Aparecido Arrias de. Responsabilidade civil do Estado por ato jurisdicional. Jus Navigandi. Teresina, a. 9, n. 823, 4 out. 2005.p.2

[50] AGUIAR JÚNIOR, Ruy Rosado de. A Responsabilidade Civil do Estado peio Exercício da Função Jurisdicional no Brasil. AJURIS, v. 20, n. 59, nov. 1993, p. 9.

[51] Idem, p.10.

52 Idem, p. 11.

[53] SENTO SÉ, João. Responsabilidade civil do Estado por ato do juiz. São Paulo: Bushatsky, 1976. P. 56 apud LEITE, op. Cit., p. 94

[54] CARVALHO FILHO, op. Cit., 476

[55] Idem,p. 479

56ROCHA, José de Albuquerque. Estudos sobre  o  Poder judiciário. São Paulo: Malheiros, 1995. p. 34 apud  LEITE, op. cit., 112.

[57] AVELINO, Juliana de Britto. A responsabilidade civil do Estado pela demora da prestação jurisdicional. Jus Navigandi, Terezina, a. 9, n. 723, 28 jun. 2005. Disponível em http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6934.Acesso e: 24 abr.2006.p.4.

[58] LEITE, op. Cit., p.96.

[59] DI PIETRO, op. Cit., p.534

[60] PANTALEÃO, Juliana F.; MARCOCHI, Marcelo C. indenização: erro judiciário e prisão indevida. Jus Navigandi. Teresina, ano 8, n.416, 27 ago. 2004. disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5642. Acesso em: 25 abr. 2006. p. 7.

[61] STOCO, Ruy. Tratado de Responsabilidade Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 1008 apud Idem, p. 7.

[62] NERI JÚNIOR, Nelson apud Idem, p. 8.

63DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do Processo. 6. ed. São Paulo: Malhe 1998.p. 270.

[64] Autotutela significa realizar o direito pelas próprias mãos, ou seja, é uma forma de resolve conflitos intersubjetivos utilizando-se da força bruta, onde necessariamente o mais forte leva vantagem.

[65] BALEEIRO, Aliomar Apud PANTALEÃO, J. F.; MARCHOCHI, M. O. op. cit, p. 5.

[66] CRUZ E TUCCI. José Rogério. Garantia do processo sem dilações indevidas (responsabilidade do Estado pela intempestividade da prestação jurisdicional). In. FIÚZA, César A. de C; SÀ, Maria de Fátima F. de (coord.). Temas atuais de Direito Processual Civii. Belo Horizonte: Del Rey, 2001, p. 171, apud LEITE, op. cit. p.133.

[67] Ribeiro, op. Cit., p.60

[68] Idem, p. 60/61

69MODESTO, Paulo. Responsabilidade do Estado peia demora na prestação jurisdicional. In: LEÃO, Adroaldo; FILHO, R.M.V. Pamplona (coord.). Responsabilidade civil. Rio de Janeiro Forense, 2001, p. 224, apud LEITE, op. cit. p.134

[70] PORTO, Mário Moacyr. Responsabilidade do Estado pelos atos dos seus juízes. São Paulo:RT, ano 71, v. 563, set. 1982, p. 14, Idem, p. 135.

[71] DIAS, José Aguiar apud PANTALEÃO, J. F.; MARCHOCHI, M. C, op. cit. p. 9.

[72] HENTZ, Luiz Antônio Soares. Indenização do erro judiciário. São Paulo: LEUD, 1995. p. 27 apud LEITE, op. cit. p.123.

[73] SERRANO JÚNIOR, Odoné. Responsabilidade civil do Estado pelo mau funcionamento serviços judiciários. São Paulo: RT, ano 86, v. 746, dez. 1997, p. 127, apud LEITE, op. cit. p.122

[74] RIBEIRO, op.cit., p.68.

[75] Loc.cit

[76] Ibid.p. 69.

77DERGINT, Augusto apud RIBEIRO, op. cit, p. 10..

78Dl PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Responsabilidade do Estado por atos Jurisdicionais. Revista de Direito Administrativo, 198: 91, out./dez. 1994, apud PANTALEÃO, J. F.; MARCOCHI, M. C. . op.cit., p. 12.

79CAVALLIERI FILHO apud LEITE, op. cit., p.129.

80LEITE, op. cit. p.131.

[81] PANTALEÃO, J. F.; MARCOCHI, M. C, op. cit. p. 12

[82] TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. 16 ed. v. 3 São Paulo: Saraiva, 1994. p. 416,apud LEITE, op. cit. p.130.

[83] RIBEIRO, op. cit, p. 85.

[84] Forma-se um litisconsórcio passivo, quando estão sendo judicialmente demandas mais de uma pessoa, configurando uma pluralidade de réus. .

85GÓES, Hugo Eduardo Mansur. Questões controvertidas na doutrina e jurisprudência sobre a responsabilidade civil do Estado: breves comentários. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 4, n° 163. Disponível em: <htttp://www.boletim juridico.com.Br/doutrina/texto.asp?id=1049>. Acesso em 24 abr.2006. p. 3.

[86] STOCO, Ruy. Responsabilidade Civil e sua interpretação jurisprudencial. SãoPaulo: Revista dos Tribunais, 1997.9.476

[87] CAHALI, Yussef Said. Responsabilidade civil do Estado. São Paulo: Malheiros, 1995, p. 167 apud DI PIETRO, op. Cit., p.537

[88] GOÉS, op. Cit., p.3

[89] RIBEIRO, op. Cit., p.89

[90] DERGIN apud RIBEIRO, op. Cit. P. 90

[91] STOCO apud RIBEIRO, op. Cit.p.91