A MOROSIDADE NA PRESTAÇÃO JURISDICIONAL

 

 

DEPARTAMENTO DE PÓS – GRADUAÇÃO E PESQUISA

FUNESO / UNESF / UNIDERC

 

 

 

MESTRADO EM PSICANÁLISE NA

EDUCAÇÃO E SAÚDE 

 

 

 

 

Aluna: Terezinha Pereira de Vasconcelos

                              Orientadora: Dra. Sandra Ugiette

 

 

 

 

 

A MOROSIDADE NA PRESTAÇÃO

JURISDICIONAL

 

 

 

 

 

 

 

 

Campina Grande – PB

2012

 

RESUMO

 

Tem chamado a atenção o modo com que vem sendo veiculado a propaganda levada a termo pelo Conselho Nacional de Justiça que de forma apelativa, tenta colocar a culpa da morosidade na prestação jurisdicional nos recursos existentes em nossas leis processuais. Causa maior preocupação quando se prega a existência do estado Democrático de Direito que tem como garantia o devido processo legal, a ampla defesa e um contraditório pleno, que permita a instauração e o desenrolar de um processo que seu resultado se aproxime mais que possível de uma decisão justa. A morosidade na prestação jurisdicional é uma das principais queixas sócias ao Pode Judiciário. São várias as causas que levam ao demora da prestação jurisdicional, são elas: primeiro, o papel do juiz na condução do processo. Espera-se do juiz soluções rápidas e sensatas, mas, antes de se atribuir responsabilidade pela demora das ações aos juízes, é preciso ter consciência do aumento do número de ações judiciais. A morosidade processual também pode vir a ser provocada pelas partes, que para uns acarreta prejuízo para outros pode trazer vantagens. Esses litigantes são enquadrados no art. 17 do CPC como litigantes de má-fé. Outra causa abordada sobre a morosidade processual consiste no excesso de formalismo dos atos processuais. Constata-se que há tanto formalismo que o importante, muitas vezes, não é a essência do Direito, mas a fiel adequação ao correto procedimento. Outra causa da morosidade na prestação jurisdicional são os recursos protelatórios, estes são usados com a finalidade de lesar o próximo, comprometendo a justiça, demorando tanto para se chegar ao resultado final que quando alcançado, aquela decisão não tem mais importância. Foram observados dois tipos de recursos, normalmente, são usados para protelar o processo. São eles: o agravo de instrumento e os embargos infringentes. O primeiro consiste em procedimento de revisão de decisão inter10cutória que com a sua reforma, passou a ser apreciado pelo órgão superior, diretamente. Essa alteração objetivava uma celeridade processual, mas continuou sendo usado com fins protelatórios. O segundo, os embargos infringentes, é cabível quando a decisão proferida em apelação ou ação rescisória não for unânime. Assim neste momento cumpriu-se o duplo grau de jurisdição. Como forma de solucionar o problema da morosidade na prestação jurisdicional, elaboramos algumas propostas: a primeira, foi à adoção da Súmula Vinculante, que precisa ser discutida e estudada não devendo ser aplicada como forma de engessar o Direito. Outra proposta para combater a morosidade processual seria a criação de um Controle Externo do Poder Judiciário, órgão fiscalizador que atuaria na sua esfera administrativa. Ocorre que já há um controle interno do Poder Judiciário, são as Corregedorias estruturadas em Tribunais; porém, ineficazes. Concordamos que, para se resolver um problema como o da morosidade na prestação jurisdicional, é necessário corrigir o que está errado, reformando a estrutura existente, como as corregedorias internas que não ,tendem mais a ,finalidade pretendida; aumentar o número de juízes e excluir recursos que são usados para protelar a final o processo. É imprescindível que o respeito à minha defesa seja conciliada com o princípio da razoável duração do processo: a sociedade e as partes não podem ficar anos e anos esperando a solução  de questões que só fazem se arrastar.

Palavras-chave: Poder Judiciário, Morosidade, Soluções.

 

ABSTRACT

Has drawn attention to the way that has been used for propaganda carried to term by the National Council of Justice so appealing, try to put the blame for the delay in adjudication to existing features in our procedural laws. Greatest concern when it preaches the existence of a democratic state that is guaranteed due process of law, the legal defense and a full adversarial, enabling the establishment and conduct of a process that the result is closer to a possible decision fair. The delay in adjudication is one of the main complaints may Judiciary members. There are many causes that lead to the delay of adjudication, they are: first, the judge’s role in driving the process. It is hoped the judge’s quick and sensible solutions, but rather to assign responsibility for the delay of the shares to the judges, one must be aware of the increased number of lawsuits. The processing delays also might be caused by the parties, that leads to a loss for others can benefit. These litigants are framed in art. 17 of the CPC as litigants in bad faith. Another question raised about the lengthy procedural formalism is in excess of procedural acts. It appears that there are both important formalism that often is not the essence of the law, but a faithful adaptation to the correct procedure. Another cause of delays in adjudication resources are procrastinating, these are used for the purpose of prejudicing the next, jeopardizing justice, taking so long to get to the end result when they reached that decision no longer matters. There were two types of features are usually used to delay the process. They are: the interlocutory appeal and embargoes infringing. The first procedure is to review that decision inter10cutória with his retirement, became appreciated by the highest authority, directly. This change was intended to expedite procedural one, but continued to be used for purposes procrastinating. The second, embargos infringing, is appropriate when the judgment on appeal or action for rescission is not unanimous. So now fulfilled the double jurisdiction. As a way to solve the problem of delays in adjudication, we make some proposals: the first was the adoption of Binding Precedent that must be discussed and studied and should not be applied as a way to stifle the law. Another proposal to tackle the lengthy procedure would be the creation of an external control of the judiciary, oversight body that would act in its administrative sphere. It happens that there is already an internal control of the judiciary, are structured in Corregedorias Courts, but ineffective. We agree that in order to solve a problem such as the delays in adjudication, it is necessary to correct what is wrong, renovating the existing structure, such as internal corregedorias not tend more, intended purpose; increase the number of judges and delete resources that are used to delay the end the process. It is imperative that respect for my defense is reconciled with the principle of reasonable duration of the process: society and the parties may not be waiting years and years to resolve issues that do not drag on.

Keywords: Judiciary, Slowness, Solutions

 

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO…………………………………………………………………………………………………………04

CAPÍTULO I – PODER JUDICIÁRIO: CONSIDERAÇÕES GERAIS

1.1 Relato Histórico do desenvolvimento da organização judiciária………………………………….07

1.1.1 Idade Antiga………………………………………………………………………………………………………08

1.1.2 Idade Média……………………………………………………………………………………………………….10

1.1.3 Idade Moderna…………………………………………………………………………………………………..12

1.1.4 Idade Contemporânea…………………………………………………………………………………………14

1.1.5 No Brasil…………………………………………………………………………………………………………..15

1.2 Conceito de poder judiciário…………………………………………………………………………………..18

CAPÍTULO II – ESTUDO DE ALGUMAS CAUSAS QUE LEVAM À MOROSIDADE

2.1. Morosidade processual: o juiz na condução do processo…………………………………………..21

2.2. Morosidade processual provocada pelas partes………………………………………………………..23

2.2.1 Litigância de má-fé…………………………………………………………………………………………….24

2.3. O Formalismo dos atos processuais………………………………………………………………………..27

2.3.1 Burocracia Processual…………………………………………………………………………………………28

2.4. Recursos Protelatórios…………………………………………………………………………………………..29

2.4.1 Agravo de Instrumento………………………………………………………………………………………..32

2.4.2 Embargos infringentes………………………………………………………………………………………..34

CAPÍTULO III – ALGUMAS PROPOSTAS PARA SOLUCIONAR O PROBLEMA DA MOROSIDADE NA PRESTAÇÃO JURISDICIONAL

3.1. SúmulaVinculante………………………………………………………………………………………………..36

3.1.1 Ideia da adoção das Súmulas……………………………………………………………………………….36

3.1.2 Súmula Vinculante como solução para a morosidade processual………………………………37

3.2. Controle Externo do Poder Judiciário……………………………………………………………………..38

CONSIDERAÇÕES FINAIS……………………………………………………………………………………….42

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS…………………………………………………………………………..47

A MOROSIDADE NA PRESTAÇÃO

JURISDICIONAL

Terezinha Pereira de Vasconcelos

terezinhavasconcelosadv@hotmail.com

INTRODUÇÃO

A grande busca no campo do Direito nos dias atuais tem sido de promover um processo que tenha efetividade, seja célere e que não abra mão das garantias constitucionais inerentes ao devido processo legal.

Não se tem dúvida que para atingir esse objetivo é preciso ainda muito estudo para adequação das normas processuais a realidade de mutação e transformação social, mas não é abrindo mão de garantias processuais na busca de um processo mais apurado em seu desfecho que teremos a tão decantada prestação jurisdicional mais rápida.

              Diante de tantas reclamações sociais que assolam atualmente o nosso país, a descrença no Poder Judiciário é passível de preocupação, pois, se a sociedade tem no Poder Judiciário o meio para resolver os seus conflitos e deposita neste toda a sua confiança, a  falta de  credibilidade no seu desempenho pode acarretar consequências nada agradáveis para o convívio social. Em consonância com essa realidade, escolhemos o tema da presente monografia. Para a sua realização foram utilizadas pesquisas bibliográficas e doutrinarias de juristas que já se pronunciaram sobre o tema.

              O tema escolhido foi à morosidade na prestação jurisdicional. A insatisfação social a respeito do serviço que presta o Poder Judiciário no Brasil decorre de vários fatores. Dentre eles, a morosidade, ou seja: a demora em obter o resultado da busca do cidadão que pretende resolver uma demanda através do Poder Judiciário. Essa demora pode ser tão grande que, muitas vezes; o resultado não terá mais importância. Como decorrência disso, surge uma indagação que provem da sociedade: há Justiça neste país? A sociedade acha que não e tal indagação coloca em dúvida toda uma estrutura que vem evoluindo através do tempo sem demonstrar a coerência com as necessidades sociais.

              O presente trabalho tem o objetivo de explorar os fatores que dão subsídios para a descrença no Judiciário, demonstrando que a morosidade da justiça compromete a sua eficácia. É objetivo deste analisar algumas causas da demora na prestação jurisdicional e apresentar propostas de estudiosos do direito a respeito do tema.

              Em verdade, sabe-seque o objetivo do Poder Judiciário é servir como um meio pelo qual o cidadão pode reivindicar os seus direitos. E o que é de direito é presumivelmente justo, isto é, o direito e a justiça são interligados; o objetivo do primeiro é salvaguardar a aplicação da segunda. A morosidade nas soluções das lides causa transtornos para o usuário da justiça, para o seu serventuário e para o Estado. Esmiuçar cada causa que leva a esses transtornos não é tarefa das mais fáceis, nem é a nossa intenção, o que queremos é demonstrar de maneira superficial, sem haver profundidade para o estudo de cada causa aqui exposta, além do mais, há quem defenda que o sistema judiciário está trabalhando em tempo hábil, demonstrando assim que o tema, apesar de eminentemente preocupante, para a maioria da sociedade; não é aceito como problema existente incontestavelmente.

              O trabalho está dividido em três capítulos. No primeiro, apresentamos considerações gerais a respeito do Poder Judiciário, com um relato histórico e a conceituação do Poder Judiciário enquanto poder que emana do Estado.

              Em seguida, no segundo capítulo, busca-se levantar algumas causas que levam à morosidade o Poder Judiciário. As causas que geram esse problema aqui apresentado vale salientar, são apenas algumas e referem-se à demora no trâmite processual. São elas: o juiz como condutor do processo, ocorrendo que o magistrado poderia evitar a delonga processual; a demora provocada pelas partes, que buscam respaldos legais para atrasar a resolução de um conflito, sendo denominados em alguns casos, como litigantes de má-fé; o formalismo dos atos processuais, retardando atos pela exigência de outros atos burocráticos; e os recursos protelatórios que, na maioria das vezes, só acarreta a demorada solução.

              O terceiro capítulo aborda algumas das soluções propostas para resolver o problema da morosidade do Poder Judiciário. No que tange a ações repetitivas, é da opinião de vários juristas consagrados em nosso país à adoção da Súmula Vinculante. Outra forma de melhorar o serviço que a justiça oferece a sociedade é criando um órgão fiscalizador com poderes punitivos como o Controle Externo do Poder Judiciário.

              Por último, encontram-se as considerações finais onde são examinados todos esses instrumentos, o que se conclui a respeito do tema aqui trabalhado. Para chegar até aqui, foram observados dados estatísticos, opiniões de renomados juristas brasileiros e, por fim, uma demonstração da relação da sociedade com o direito no Brasil. Constata-se, portanto, que é preciso um estudo sobre esses problemas atuais para se combater as suas causas, sejam burocráticas ou de falha estrutural, e, a partir daí, podermos trabalhar as soluções desses problemas de intensa repercussão. E, a partir do que observamos,concluímos que a morosidade do judiciário é tema apresentado, discutido e comprovado.

              A duração razoável do processo, que entendemos ser aquela em que as partes tenham observado os prazos estipulados para a pratica dos atos processuais e, ao mesmo tempo, aquele cujo órgão, por seus representantes não tenha sido Inerte na direção das etapas do processo que lhes cabe impulsionar, agora exigida pelo legislador constituinte, impôs ao legislador infraconstitucional, bem como a todos os operadores do direito, o dever de  rever os mais diversos institutos e regras processuais, para deles se extrair a máxima eficácia da tutela jurisdicional.

              Não pensemos ser o incluído principio a solução mágica para a morosidade do processo judicial brasileiro. Ele, definitivamente, não é. Sua importância é imensurável, mais  é preciso mais que um principio para agilizar o processo. Se alguma atitude não for tomada, estaremos sob a égide de uma nova ditadura: a ditadura do judiciário.

CAPÍTULO I – PODER JUDICIÁRIO: CONSIDERAÇÕES GERAIS

 

1.1.  Relato histórico: o desenvolvimento da organização judiciária

 

              O Direito Romano serviu de inspiração para a implantação do Direito na maioria dos países do mundo. Os romanos foram os pioneiros na organização judiciária, substituindo a casuística diária pelas regras jurídicas, classificando-as e aplicando-as. Tendo em vista a importância do Direito Romano para o mundo, para falar sobre a história da organização judiciária é relevante adentrarmos nesse assunto. A razão de esse ter sido usado como alicerce dos direitos de outros Estados, está no fato que nenhum povo da antiguidade construiu um bem imaterial tão completo, sistemático e perfeito como o legado jurídico romano, que, por sua organização sobreviveu ao fim do Império Romano. Numerosos institutos do Direito originários em Roma, ainda hoje, estão vivos, da mesma forma que foram constituídos, ou com pequenas modificações que não descaracterizam a sua origem. Cretella Júnior[1], em sua obra sobre o Direito Romano Moderno, afirma que o direito de Justiniano estudado em toda a Europa, desde o séc. XII, é aceito oficialmente na Alemanha e, em fins do séc. XV teve grande influência na formação do direito atual, refletindo-se na redação dos modernos códigos e, em especial, no Código Civil Francês, de 21 de marçode1804, e no Código Civil Alemão, de 1900. Na Escócia e na África do Sul, até bem pouco tempo, o direito romano era aplicado quase na íntegra.

              Como bem se sabe, o direito é uma ciência dinâmica precisando atender as demandas sociais, pois com o passar do tempo à sociedade impõe mudanças normativas e também mudanças na Organização Judiciária, e esperam que os seus anseios sejam bem atendidos. Pois, se é constatado que há sempre necessidade de reformar algo que não está mais suprindo a sua função, o direito também deverá sofrer, portanto, mudanças com o passar do tempo, para melhor atingir a sua finalidade.

              Em Roma, a organização judiciária sofreu várias modificações, com a finalidade de melhor acompanhar a evolução histórica e também devido a várias mudanças na sua estrutura política que resultou na estrutura com os seguintes períodos: realeza (753-510), república (510-127), Alto Império (127-287), Baixo Império (284-565) e Bizantino (565- 1453). Para cada período houve uma adequação de organização social, política e judiciária. Concluímos que, as transformações ocorridas, principalmente a partir da Segunda Guerra Mundial, atingem espaços Políticos, jurídicos, econômicos e sociais. Surgem novos direito novos atores sociais, novas demandas, novas exigências e novos paradigmas, A dinâmica e a intensidade dessas mudanças, todavia, são maiores do que as condições de atualização e adaptação das instituições políticas. Surge uma contradição, expressa no crescente distanciamento temporal e espacial da realidade social. A consagração de vários direitos pela Constituição de 1988 gerou na sociedade brasileira varias expectativas. O país não estava dotado de condições políticas e econômicas para garanti-los de fato. A Nova Carta ampliou o papel e as funções do Poder Judiciário. As expectativas se voltaram para esse Poder, que passou a ocupar uma posição de protagonista. Consequentemente, ocorreu uma explosão de litigiosidade. O Judiciário não contava com uma estrutura preparada para responder com eficiência ao aumento da demanda. Cresceu a insatisfação socia1com o seu desempenho. Passou a ser enfatizada a existência de uma crise da justiça e a necessidade de sua reforma.

1.1.1.      Idade Antiga

 

              O estudo da antiguidade permite o conhecimento de vários aspectos do mundo atual. Esse período, que corresponde de 4000 a.C. até 476 d.C., compreende o início a história da humanidade. Em estudos realizados na obra do historiador Cláudio Vicentino[2], temos uma visão de como veio se organizando a humanidade. Na Idade Antiga, tudo estava em fase de formação, as terras estavam sendo descobertas e os povos estavam se organizando em comunidades. O domínio era implantado através da força e as guerras ocorriam com frequência. As civilizações se organizavam em clãs e vários clãs formavam um nomo, as sociedades surgiam às margens de rios, pela fertilidade do solo e pelo fácil acesso à irrigação. Pode-se verificar esse quadro nas civilizações mais antigas: a egípcia e a indiana, por exemplo. No Egito, quando Menés, primeiro faraó, unificou os nomos deu início ao Estado; este faraó tinha em suas mãos o chamado poder centralizado e teocrático, todos os poderes que emanavam de um Estado eram detidos em suas mãos, inclusive o poder religioso. Para que o faraó fosse aceito pela sociedade sem rebeliões ou qualquer outro tipo de resistência, ele justificava o seu poder ilimitado como uma concessão divina, pela qual representava os deuses na terra, impondo dessa forma obediência, temor e respeito.

              Os governantes deste período atuavam como magistrados, uma vez que detinham todos os poderes, dispondo, inclusive, da vida dos seus súditos. Se ocorresse algo que o rei julgasse uma ofensa, a pena seria determinada por esse, não havendo códigos de leis a seguir. Com isso, havia muita injustiça, pois, sem uma previsão em lei não poderia haver proporcionalidade do delito para a pena.

              A sociedade estava impondo uma necessidade de codificar o que era lei, essa necessidade levou a criação de Códigos, como o Código de Hamurabi[3] no ano 2000 a.C. Esse código era baseado na lei de Talião: “Olho por olho, dente por dente”. Objetivava proporcionalidade, ou seja: quem matasse deveria morrer. O resultado era célere; o tempo que levava da constatação do crime e do seu autor até a aplicação da pena era ínfimo, o autor do crime era capturado, preso e o seu dia de execução marcado. A execução era publica numa cabal demonstração de inibir a prática do crime, levando-se pouco tempo dessas para a execução da pena.

              O poder centralizado, apesar de reunido nas mãos de um governante, foi passível da teoria da repartição. Aristóteles[4], em sua obra A política, lançou aquela que seria a base de uma teoria acerca da separação das funções do Estado. Na concepção aristotélica, o governo dividia-se em três partes: a que liberava acerca dos negócios públicos; a que exercia a magistratura (uma espécie de função executiva) e a administração da justiça. O que nos permite concluir é que,     quando adentramos o estudo da Antiguidade ou Idade Antiga, é bastante comum ouvir dizer que esse período histórico é marcado pelo surgimento das primeiras civilizações. Geralmente, ao adotarmos a expressão “civilização” promove-se uma terrível confusão que coloca os povos dessa época em uma condição superior se comparados às outra culturas do mesmo período.

              Na verdade, a existência de uma civilização não tem nada a ver com essa equivocada idéia de que exista um povo “melhor” ou “mais evoluído” que os demais. O surgimento das primeiras civilizações simplesmente desmarca a existência de uma série de características específicas. Em geral, uma civilização se forma quando apontamos a existência de instituições políticas complexas, uma hierarquia social diversificada e de outros sistemas e convenções que se aplicam largamente a uma população.

              Ao contrário do que se possa imaginar, não podemos apontar uma localidade específica onde encontremos a formação das primeiras civilizações da história. O processo de fixação e desenvolvimento das relações sociais aconteceu simultaneamente em várias regiões e foi marcado pelo contato entre civilizações, bem como a incorporação de duas ou mais culturas na formação de outra civilização.

              Reportando-se ao Mundo Oriental, podemos assinalar o desenvolvimento das milenares civilizações chinesa e indiana. Partindo mais a oeste, localizamos a formação da civilização egípcia e dos vários povos que dominaram a região Mesopotâmica, localizada nas proximidades dos rios Tigre e Eufrates. Também conhecidas como civilizações hidráulicas, essas culturas agruparam largas populações que sobreviviam da exploração das águas e terras férteis presentes na beira dos rios.

              Na parte ocidental do planeta, costuma-se dar amplo destaque ao surgimento da civilização greco-romana. O prestigio dado a gregos e romanos justifica-se pela forte e visível influência que estes povos tiveram na formação dos vários conceitos, instituições e costumes que permeiam o Ocidente como um todo. Contudo, não podemos também deixar de dar o devido destaque aos maias, astecas, incas e olmecas que surgem no continente americano.

              Sem dúvida, o estudo das civilizações antigas se mostra importante para que possamos entender melhor sobre as várias feições que a nossa cultura assume atualmente. Contudo, sob outro ponto de vista, o estudo da antiguidade também abre caminho para que possamos contrapor os valores e parâmetros que um dia foram comuns a alguns homens e hoje se mostram tão distantes do que vivemos. É praticamente infinito o leque de saberes que se aplica a esse período histórico.

1.1.2.      Idade Média

 

              Esse período corresponde ao ano de 476 d.C. até 1534. O historiador Cláudio Vicentino[5] descreve bem a organização política dessa época, segundo ele muito difere do período anterior. O poder que antes era centralizado passou a ser descentralizado, o Estado que antes era uno passou a ser desmembrado em feudos, cada um com a sua organização independente, devendo respeito à representação real; todavia, mantendo autonomia em seu território. Essa autonomia ocorria em praticamente todos os âmbitos da organização jurídica, até os pesos e medidas eram relativos a cada feudo, variando os tributos a serem cobrados. Não havia, ainda, uma rigidez na obediência de leis e quem determinava o que era certo ou errado era o senhor feudal; nesse período, a Igreja passou a ter um poder equivalente ao do Estado, exercendo grande influência, pois era a maior proprietária feudal.

              A sociedade era imutável, escravista e rural. Na ordem das sucessões, o feudo ficava como herança para o filho mais velho do senhor feudal, pois desta forma não haveria divisão da terra e o proprietário continuaria com o poder concentrado.

              Prevalecia na Idade Média o Teocentrismo, ou seja, Deus nó centro de tudo. Os filósofos dessa época justificavam a forma de poder que a Igreja exercia como de vontade divina, contribuindo, dessa forma, para a formação da mentalidade da sociedade medieval, reforçando o predomínio dos senhores feudais, justificando os privilégios estabelecidos e oferecendo ao povo, em troca, a promessa do paraíso celestial.

              Não se constata que houvesse insatisfação por haver demora na resolução dos litígios, o que ocorria, no que tange a prestação jurisdicional, era o questionamento de que o direito não era bem aplicado, deixando a desejar a real existência da justiça. Concluímos que, quando falamos em Idade Média, é quase impossível não se lembrar daquela antiga definição que costuma designar esse período histórico como sendo a “idade das trevas”. Geralmente, este tipo de conceituação pretende atrelar uma perspectiva negativista ao tempo medieval, como sendo uma experiência de pouco valor e que em nada pode acrescer ao “desenvolvimento” dos homens.

              Para entendermos tamanha depreciação, é necessário que investiguemos os responsáveis pela crítica à Idade Média. Foi durante o renascimento, movimento intelectual do período Moderno, que observamos a progressiva consolidação desta visão histórica. Para os renascentistas, o expresso fervor religioso dos medievais representou um grave retrocesso para a ciência.

              Seguindo esta linha de pensamentos, vemos que a Idade Média é simplificada à condição de mero oposto aos ditames e valores que denominaram a civilização greco-romana. Não por acaso, os renascentistas se colocavam na posição de sujeitos que se deram o trabalho de “sequenciar” o conjunto de traços culturais, estéticos e científicos que foram primados na antiguidade Clássica e “melancolicamente” abandonados entre os séculos V e XV.

              Entretanto um breve e mais atento olhar ao mundo medieval nos revela que estas considerações estão distantes dos vários acontecimentos dessa época. Afinal de contas, se estivessem vivendo nas “trevas”, como seriam os medievais os responsáveis pela criação das primeiras universidades? Essa seria apenas uma primeira questão que pode a Idade Média sob outra perspectiva, mais coerente e despida dos vários preconceitos perpetuados desde a Idade Moderna.

              O desenvolvimento da cultura cristã, as heresias, as peculiaridades de um contexto político descentralizado a percepção do tempo no interior, dos feudos, as festas carnavalescas são apenas um dos temas que podem revelar claramente que esse vasto período histórico e bem mais complexo e interessante. Ainda há tempo para que estas e outras luzes permitam a reconstrução que os tempos medievais, de forma bastante justa, merecem.

1.1.3.      Idade Moderna

 

              Inicia-se a Idade Moderna no ano de 1534 e vai até 1789. Na Idade Moderna surgiram pensadores que divulgavam suas ideias políticas e filosóficas de forma diversa da Idade Média, a concepção do homem começou a sofrer alterações. O homem passou a questionar dogmas e se dar mais importância, com isso advieram inúmeras mudanças, a concepção anterior que antes era teocêntrica – Deus no centro de tudo – passou a ser antropocêntrica – o homem como centro de tudo. A Igreja, antes cheia de dogmas incontestáveis e poderosa, passou a sofrer questionamentos. A economia passou a ser de comércio e o poder, que antes era descentralizado, passou a ser absoluto.

              A filosofia adquiriu muita importância nesse período da nossa história. Os intelectuais, sobrepujando a mentalidade medieval, criaram uma ideologia política para justificar o absolutismo. Destacam-se os pensamentos de alguns desses filósofos[6]: Nicolau Maquiavel, com O príncipe; Thomas Hobbes, com o Leviatã; Jacques Bossuet, com suas obras que estabeleciam o princípio do direito divino dos reis, como Política Segundo a Sagrada Escritura e Jean Bodin, que defendia a ideia da soberania não partilhada, em seu livro A República.

              Em contraposição aos que defendiam o absolutismo, surgiram os críticos desse regime, os chamados iluministas, que eram contra esse tipo que Estado absolutista. Com suas obras, eles combatiam as ideias dos filósofos absolutistas, destaca Cláudio Vicentino[7]: Jonh Locke (Ensayo sobre el gobiemo civil) e Rosseau (Du contrat social) contribuíram para a construção da “separação dos poderes” tendo a mesma sido realmente definida e divulgada por Montesquieu em seu (De I’esprit des lois). Esta se transformou numa das mais importantes doutrinas políticas de todos os tempos, alçada à categoria de princípio fundamental da organização política liberal, consagrada pela Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão[8]. A proposta de Montesquieu[9] consistia em dividir os poderes em: Poder Executivo, Poder Legislativo e poder Judiciário. Segundo ele, o poder absoluto jamais ensejaria um Estado justo, que atendesse a todas as demandas, seria necessário que o poder fosse dividido de maneira equilibrada: “tudo estaria perdido se o mesmo homem ou a mesma corporação (…) exercesse esses três poderes: o de fazer leis, o de executar as resoluções públicas e de julgar os crimes ou desavenças particulares”, e completas “só se impede o abuso de poder quando pelas disposições das coisas só o poder detém o poder”. Montes que eu pretendia com a adoção dos três poderes que cada um deles fiscalizasse a aplicação do outro, para evitar o “abuso de poder”.

              O Judiciário, neste regime absolutista, era parcial, ou seja, a favor dos interesses do Estado. O problema em relação ao Judiciário correspondia à existência dessa parcialidade. Essa foi a principal razão que fez com que eclodisse a Revolução Francesa, acontecimento que despertou no mundo a consciência de lutar por um país que trate os seus cidadãos com respeito e dignidade.

              Verifica-se que até o fim da Idade Moderna, o que se procurava não era a agilização da máquina judiciária, mas sim o seu funcionamento baseado na justiça, pois as conquistas sociais dessa época visavam a garantia de direitos e não uma forma mais célere de resolver as suas demandas. Para exemplificar, com a Revolução Industrial – que fez com que a grande maioria da população passasse a trabalhar como operários em fábricas – essa nova realidade despertou na sociedade a necessidade de salvaguardar os seus interesses trabalhistas, criando-se, para tanto, as leis trabalhistas. Essa imposição social deu-se pela não admissibilidade da exploração desregrada. Não podemos esquecer que as conquistas sociais não foram e ainda não são tarefas fáceis, ao contrário, ao longo da história da humanidade é constatado um grande derramamento de sangue para a conquista de direitos. Fazendo um pequeno epílogo temos que, ao pensar em modernidade, muitas pessoas logo imaginam que estamos fazendo referência aos acontecimentos, instituições e formas de agir presente no Mundo, Contemporâneo. De fato, esse termo se transformou em palavra fácil para muitos daqueles que tentam definir em uma única palavra o mundo que vivemos. Contudo, não podemos pensar, que esse contexto mais dinâmico e mutante surgiu do nada, que não possua uma historicidade.

              Entre os séculos XVI e XVIII, um volume extraordinário de transformações estabeleceu uma nova percepção de mundo, que ainda pulsa em nossos tempos. Encurtar distâncias, desvendar a natureza, lançar em mares nunca antes navegados foram apenas uma das poucas realizações que definem esse período histórico. De fato, as percepções do tempo e do espaço, antes tão extensas e progressivas, ganharam uma sensação mais intensa e volátil.

              O processo de formação das monarquias nacionais pode ser um dos mais interessantes exemplos que nos revela tal feição. Nesse curto espaço de quase quatro séculos, os reis europeus assistiram a consumação de seu poder hegemônico, bem como experimentaram as várias revoluções liberais defensoras da divisão do poder político e da ampliação dos meios de intervenção política. Tronos e parlamentos fizeram uma curiosa ciranda em apenas um piscar, de olhos.

              Além disso, se hoje tanto se fala em tecnologia e globalização, não podemos refutar a ligação intrínseca entre esses dois fenômenos e a Idade Moderna. O advento das Grandes Navegações, além de contribuir para o acúmulo de capitais na Europa, também foi importante para que a dinâmica de um comércio de natureza intercontinental viesse a acontecer. Com isso, as ações econômicas tomadas em um lugar passariam a repercutir em outras parcelas de planeta.

              No século XVIII, o espírito investigativo dos cientistas e filósofos iluministas catapultou a busca pelo conhecimento em patamares nunca antes observados. Não por acaso, o desenvolvimento de novas máquinas e instrumentos desenvolveram em território britânico o advento da Revolução Industrial. Em pouco tempo, a mentalidade econômica de empresários, consumidores, operários e patrões fixaram mudanças que são sentidas até nos dias de hoje.

              Em um primeiro olhar, a Idade Moderna pode parecer um tanto confusa por conta da fluidez dos vários fatos históricos que se afixam e, logo em seguida, se reconfiguram. Apesar disso, dialogando com eventos mais específicos, É possível balizar as medidas que fazem essa ponte entre os tempos contemporâneos e modernos. Basta contar com um pouco do tempo… Aquele mesmo que parece ser tão volátil nesse instigante período histórico.

1.1.4.      Idade Contemporânea

 

              A Idade Contemporânea é um tempo histórico em aberto. Compreendendo o final do século XVIII até os dias atuais, a contemporaneidade atrai o interesse de muitas pessoas em razão da emergência e do apelo que as questões históricas e filosóficas observadas nesse período trazem à tona. O desenvolvimento do capitalismo e a ascensão dos valores de um mundo em “progresso ininterrupto” figuram importantes fatos e correntes de pensamento do século XIX. Os problemas e transformações de um mundo globalizado fizeram desta época, conforme apontado pelo historiador Eric J. Hobsbawn, um século “breve”.

              Somente após a revolução Francesa e a Declaração da Independência dos Estados Unidos (ressalvadas tímidas exceções, como na Inglaterra), ganhou o Judiciário status de Poder, e mesmo assim com fortes restrições, inclusive nas Constituições Francesas aquele século. Nesta mudança de século e milênio o judiciário assume postura ainda mais relevante, colocando-se como guardião da cidadania e, via de consequência, da própria sociedade.

              O sistema judiciário vai se transformando ao longo do tempo para acompanhar a sociedade; esta é a receptora do serviço que aquele presta, pois o direito é uma ciência dinâmica e acompanha as evoluções. Na Idade Contemporânea, já se tem uma organização judiciária mais estruturada e coerente com as necessidades sociais. E encontra-se, exatamente nessa estrutura problemas que afligem o judiciário, como a morosidade processual.

              Apesar de problemas com a estrutura do Judiciário, a evolução política é característica predominante da Idade vigente, a sociedade internacional luta pelos seus direitos e resiste ao que não considera justa, não há de se falar que estamos vivendo em um período justo onde os direitos sociais são respeitados, mas estamos numa evidente fase de progressos. Se analisarmos o contexto histórico, estamos em uma fase de conquistas. A teoria da tripartição dos poderes passou a ser seguida nos ordenamentos de vários países.

              O Poder Judiciário é independente e organizado com a intenção de melhor atendera sociedade. Sendo relativo a cada Estado ou Nação. Não vamos adentrar na organização do Poder Judiciário, o que é relevante é compreender a organização judiciária no que concerne retardar a prestação jurisdicional.

              Encontra-se atualmente o Judiciário no centro das discussões, trazidas não só entre os chamados “operadores do Direito”, mas também, a envolver pensadores, universidades, governantes e jurisdicionados; fenômeno que assume proporções mundiais,não circunscrevendo esse ou aquele país. No atual momento, quando todos se mostram preocupados com sua ineficiência, buscando detectar as causas de suas deficiências e,sobretudo, encontrar soluções que as possam corrigir;principalmente, pela indispensabilidade, cada vez maior, da sua presença no mundo contemporâneo, temos por oportuna a observação preliminar de que o Judiciário, que até a segunda metade do Século XVIII vinha tendo tênue atuação no plano civilizatório, hoje vive seu apogeu histórico.

1.1.5.      No Brasil

 

              Para melhor compreender o atual sistema brasileiro, é necessário fazer investigação de suas raízes, daí a importância da análise de sua evolução histórica, para conhecer como processou- se a organização judiciária no nosso país, desde a sua colonização. No modelo aqui adotado, pode-se identificar,” uma reprodução do sistema autocrático, verticalizado e hierarquizado, em que a tônica é uma configuração que possibilita  o controle da magistratura pela cúpula, que se identifica com os interesses do chefe do Poder Executivo[10]

              No período imperial, as teorias políticas em voga na Europa giravam em tomo do Liberalismo, do Parlamentarismo, do Constitucionalismo, do Federalismo, da Democracia e da República. O movimento constitucionalista no Brasil era muito forte. Daí que, tão logo proclamada à independência, buscou-se a elaboração de uma carta política, tendo como princípio retor o liberalismo, consubstanciado no art. 16 da Declaração do Homem e do Cidadão de 1789. O Brasil adotou a teoria de Benjamin Constant[11], segundo a qual o Poder Político deveria ser repartido em quatro órgãos, são eles o Poder Judiciário, Legislativo,Executivo e Moderador.

              O Poder Moderador, que não foi incluído na teoria da tripartição dos poderes de Montesquieu, era exercido pelo Imperador e se constituía no principal órgão da organização política do Brasil. Aliás, estava escrito na Constituição que o Poder Moderador era a chave de toda a organização política, competindo a ele zelar pela manutenção da independência, equilíbrio e harmonia dos demais poderes políticos (art. 98, da Constituição de 1824). Na esfera judiciária, a interferência direta do Imperador, na sua função de chefe do Poder Moderador, dava-se diante da competência para suspender os magistrados de suas funções,em razão de queixa apresentada contra eles, depois de ouvidos o juiz interessado e o Conselho de Estado; perdoar ou moderar as penas impostas nas sentenças judiciais e conceder anistia nos casos em que ele entender a humanidade e o Estado assim determinam. (art. 101, §§ 7° a9°, Constituição de 1824).

              Os juízes não desempenhavam apenas a função judicante. Cabia a eles também executar diversos papéis políticos e sociais, servindo de elo de ligação entre o poder central e os presidentes das províncias que – com suporte no coronelismo, propiciado com a estrutura agrária do país marcada pelos latifundiários, pobreza e isolamento de boa parte da população,deixando-a sob o comando dos grandes proprietários rurais – mantinham autonomia material. Ademais, o Poder Judiciário não era considerado político, sendo-lhe vedado o julgamento de qualquer questão com conteúdo dessa natureza.

              Embora Judiciário não fosse tratado como poder político, a magistratura representava uma forma privilegiada de ingresso na carreira política imperial, representando o início da assunção de cargos do Estado, a fim de aquisição de experiência e teste de fidelidade política. Não era à toa que os magistrados, malgrado a postura funcional apolítica, integravam na qualidade de membros os partidos políticos e atuavam como lídimos representantes do governo imperial, e ainda eram, de regra, comprometidos com os interesses dos proprietários de terra.

              A implantação da República representou a primeira e, talvez, a única grande reforma do Poder Judiciário brasileiro. O primeiro aspecto do Poder Judiciário no período Republicano a chamar atenção, é que ele passou, em consonância com o sistema americano, ater como tarefa principal o controle de constitucionalidade das leis e dos atos do Governo, papel a ser desempenhado em todas as instâncias judiciárias, realçando assim a sua característica de exercício de função política. Ainda de acordo com as características do regime político norte-americano, a Justiça deixou de ser unitária a fim de seguindo a forma federativa que abrange os três poderes, passar a ser dual dividindo-se a justiça comum em federal e estadual.

              Em 5 de Outubro de 1988, promulgou-se a atual Constituição, editada sob os influxos das ideias (re)democratizantes do País, seguindo, principalmente, os princípios do postulado do Estado Democrático de Direito, espraiado na forma federativa e na independência e harmonia dos poderes políticos – separação vertical e horizontal. Ficou expresso que o Estado brasileiro tem como fundamentos à soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, assim como o pluralismo político. Foi registrado, ainda, que o poder político pertence ao povo, não lhe sendo reservado o direito de exercê-lo somente por meio de representantes eleitos, e os seus principais objetivos são a construção de uma sociedade livre, justa e solidária; a garantia do desenvolvimento nacional, a erradicação da pobreza e da marginalização e a redução das desigualdades sociais e regionais; além da promoção do bem estar de todos, sem preconceitos de raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

              Com a constituição vigente houve uma considerável inovação na estrutura do Judiciário brasileiro: foram criados os juizados especiais civis e criminais para o julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidade e infrações de menor potencial ofensivo, possibilitando uma maneira mais célere de prestação jurisdicional aos cidadãos.

1.2.      Conceito Poder Judiciário

 

              Poder judiciário é o próprio poder soberano do Estado na função de ministrar e administrar a justiça dentro dos limites de sua soberania (ex. dentro dos limites territoriais da lei brasileira).

              O Poder Judiciário é um dos três poderes do Estado moderno na divisão preconizada por Montesquieu em sua teoria da separação dos poderes.

              Este poder tem as atribuições de julgar, aplicar as leis, garantir a execução das mesmas e reparar as relações jurídicas violadas.

            O Poder judiciário é um ramo de expressão de Poder que emana do Estado. Para ser possível a compreensão da essência do Poder Judiciário, é preciso entender o que é o estado, sua função e finalidade. Estado sua função e finalidade. Para tanto, recorremos ao filósofo Hans Kelsen, para explicar o que é o Estado e qual é a sua função, para, a partir daí conceituarmos o Poder Judiciário.

              Como afirma Kelsen[12]:

Não é possível compreender a essência de uma ordem jurídica nacional, o seu principium individuations, a menos que o Estado seja pressuposto como uma realidade social subjacente. Só há o que se falar em sistema de normas, unitário e indivisível, denominado de ordem jurídica nacional, porque está relacionado a um Estado como fato social concreto, por ser criado por um Estado ou válido para um Estado.

              O Estado, para Kelsen, é aquela ordem da conduta humana que chamamos de ordem jurídica, a ordem à qual se ajustam as ações humanas, ou seja, por meia da qual os indivíduos adaptam sua conduta. Assim sendo, assevera Kelsen, existe apenas um conceito jurídico de Estado: o Estado como ordem jurídica centralizada.

              A unidade entre o Estado e a ordem jurídica, portanto, conclui Kelsen, o “Estado é uma organização política por ser uma ordem que regula o uso da força, porque ela monopoliza o uso da força. Tais caracteres também são comuns ao Direito, daí dizer-se que a ordem coercitiva que constitui o Estado é o Direito[13].

              Para o autor supra citado, o princípio da tripartição dos poderes[14], reside numa dicotomia: legislação e execução. Legislar, segundo ele é criar normas gerais. Executar é aplicar estas normas gerais. Contudo, adverte o autor, toda criação de Direito é ao mesmo tempo sua aplicação e dele é também sua criação. Ao criar uma lei, é preciso também prever as consequências de sua aplicação. Quanto ao princípio da separação e independência dos Poderes constitui uma das características fundamentais do Estado de direito. Além disso, não possui fórmula universal apriorística: a tripartição das funções estatais, entre três órgãos ou conjuntos diferenciados de órgãos. Tão importante quanto essa divisão funcional básica é o equilíbrio entre os poderes, mediante o jogo recíproco dos freios e contrapesos, presentes ambos em todas elas, apresentam-se em cada formulação positiva do princípio com distintos caracteres e proporções.

              A identificação dos signos característicos de um sistema de positivação do princípio importará talvez a divisão tripartite das funções jurídicas do Estado consideradas mecanismos de freios e contrapesos – que, delimitando as interferências permitidas a um poder na área da função própria de outro, permitem, em contraposição, apurar a dimensão real da independência de cada um dos Poderes, no modelo considerado. Portanto, concluímos que o Poder Judiciário é considerado, por excelência, um Poder de controle dos demais Poderes – sobretudo nos modelos positivos de unidade e universalidade da jurisdição dos Tribunais, como o nosso. O Poder Judiciário tem um compromisso histórico e moral com a luta pelas liberdades e, também, com a preservação dos valores fundamentais que protegem a essencial dignidade da pessoa humana. Por fim, para desempenhar a contento sua cota de responsabilidade em todo esse processo, o Judiciário deve estar preparado para os desafios do século XXI, assumindo uma nova postura, atuando em coerência com os princípios estabelecidos pela Carta de 1988.

              Por outro lado, a estrutura do Judiciário deve estar adequadamente organizada e formada por juízes inseridos na realidade social, comprometidos com a observância do novo paradigma de desenvolvimento preconizado pelo socioambientalismo.

CAPÍTULO II – ESTUDO DE ALGUMAS CAUSAS QUE LEVAM À MOROSIDADE PROCESSUAL

 

              Tem chamado a atenção o modo com que vem sendo veiculada a propaganda levada a termo pelo Conselho Nacional de Justiça que de forma apelativa, tenta colocar a culpa da morosidade na prestação jurisdicional recursos existentes em nossas leis processuais.Causa maior preocupação quando se prega a existência do Estado Democrático de Direito que tem como garantia o devido processo legal, a ampla defesa e um contraditório pleno, que permita a instauração e o desenrolar de um processo que seu resultado se aproxime mais que possível de uma decisão justa.

              São muitos os problemas do processo civil brasileiro, provocados por fatores complexos, cujo estudo e classificação talvez se constitua em tarefa irrealizável. Não será nesse trabalho que se poderá ar tratamento pormenorizado a estes problemas, todavia, parece-nos que dentre os principais problemas a morosidade judicial é um dos mais graves. Destarte, inicialmente, convergiremos nossos esforços no sentido de diagnosticar algumas causas dá lentidão processual.

              Verifica-se que uma das causas do aumento do número de processos foi a aberturada legitimação, ativa para a ação direta de inconstitucionalidade em diversas instâncias, não apenas da União e dos Estados, mas também da sociedade civil, como diz o ministro Sepúlveda Pertence:

Com isso, passados apenas poucos anos da vigência da Constituição de1988, acarretou um número de mil e quinhentas ações diretas, mais do que todas as representações de inconstitucionalidade nas quatro décadas que vão de 1946 a 1988; dois terços dessas mil e quinhentas ações diretas de inconstitucionalidade partem de entidades não governamentais[15].

              Algumas causas de morosidade processual consideradas aqui são o juiz na condução do processo, podendo estar contribuindo com essa morosidade; a morosidade processual provocada pelas partes, na litigância de má-fé; o formalismo dos atos processuais, dando mais importância a forma do que a essência do direito; e, por fim, a burocracia processual. Mais adiante comentaremos sobre cada uma dessas causas.

2.1. Morosidade Processual: o juiz na condução do processo

 

              A morosidade processual decorre de Inúmeras situações de difícil superação, das quais podemos citar a falta de infra estrutura e de pessoal preparado, bem como o descumprimento dos prazos impróprios por parte dos servidores magistrados.

              Muito se tem pesquisado, a fim de encurtar a distancia temporal entre o requerimento iniciai da tutela jurisdicional e sua efetiva entrega ao jurisdicionado. A denominada Reforma do Judiciário tornou expressa a garantia fundamental da duração razoável do processo que, por ser garantia fundamental, tem aplicabilidade imediata e não pode ter sua interpretação restringida.

              Para a sociedade civil, o fato de os processos se arrastarem pelos canais judiciários por até vinte anos se constituí em verdadeiro descaso governamental para com elas, especialmente principalmente porque o Estado não lhe permite fazer justiça com as próprias mãos, mediando-as em seus conflitos interpessoais. E, para a comunidade jurídica, a morosidade do judiciário não é provocada por desídia ou indolência, mas pelo excessivo formalismo de seus membros e pela sua falta de habilidade em realizar a administração do processo que é o seu instrumento de serviço.

              Com o aumento vertiginoso do número de ações nas varas judiciárias e um número insuficiente de juízes para julgar os conflitos a prestação jurisdicional fica mais lenta, e além disso, mais que julgador culto e justo, o juiz deve também ser um bom administrador do serviço judiciário, evitando qualquer esforço inútil que o sobrecarregue e que acarrete em desgaste ,desnecessário de tempo.

              De acordo com a nossa doutrina, o Código de Processo Civil adotou a teoria da substanciação[16], a qual sustenta que não basta ao autor afirmar a existência da relação jurídica, sendo também necessária à alegação do fato concreto que deu causa a suapretensão[17]. Com efeito, dispõe o CPC que a petição inicial será indeferida quando lhe faltar causa de pedir (art. 295, parágrafo único, inc. I).

              Assim, ao oferecer a petição inicial, o autor deve apresentar ao juiz a causa de pedir, que se compõe dos seguintes elementos[18]:

a)      O direito afirmado;

b)      A relação jurídica de que este direito se origina;

c)      Os fatos constitutivos destes direito e relação jurídica;

d)     O fato que torna necessária a via judicial (interesse de agir).

              Deste modo, não foi por acidente que o legislador inseriu os elementos causais entre os requisitos da ação, mas, principalmente, em atenção aos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa. De fato, os princípios do contraditório e da ampla defesa deverão ser sempre observados, pois o réu precisa ter pleno conhecimento do que está sendo atacado para que possa efetivamente se defender. Mas esta não é a única finalidade da exigência – a revelação da causa de pedir também permite ao juiz realizar o cotejo entre os fatos e os fundamentos jurídicos do pedido e concluir se, realmente, o direito alberga a pretensão do autor.

              Em consequência, o efetivo recebimento da petição inicial gera a presunção[19] deque o juiz está reconhecendo que os fatos alegados são típicos e que, sendo comprovada no curso da ação a sentença deve ser pelo reconhecimento da procedência do pedido. É certo que a decisão de indeferimento da inicial provoca a extinção do processo sem julgamento do mérito e não obsta que o autor intente de novo a ação (CPC, arts. 267, inc. I, e 268), porém a reiteração implicará no pagamento de novas custas processuais e, sendo coerente a jurisprudência, a decisão de indeferimento também se repetirá.

              O juiz, ao analisar a petição inicial, terá um trabalho maior que o ordinariamente realizado, pois terá que estudar todas as questões de direito. Porém, de qualquer forma, teria que fazer isto no final do processo ao prolatar a sentença; a grande vantagem da providência consistiria em evitar a custosa, demorada e inútil instrução processual, cujos atos toma o dia dos juízes e assoberba o serviço cartorário.

              Havendo irresignação com o ato de indeferimento da inicial, caberá a apelação, sendo facultado ao juiz reformar sua decisão (CPC, art. 296); mas o autor da ação também é beneficiado com a boa análise da petição, pois, além de não se fundamentar em falsas expectativas, conformando-se com a decisão, não arcará com o pagamento de honorários advocatícios ao virtual réu, que não terá direito a eles porque não terá sido citado (o que não ocorreria no julgamento antecipado da lide – art. 330 do CPC).

              Frisamos que não há que se falar em violação ao direito de ação, pois apesar desta ser tida como direito público subjetivo autônomo e abstrato[20], a lei pode estabelecer, como de fato estabelece, condições necessárias ao seu exercício.

              Nas palavras de Cândido Rangel Dinamarco,

A visão instrumentalista de todo sistema propaga-se a todos os institutos que o compõem e particularmente à ação; considerá-la uma inerência da personalidade, garantia posta no mesmo plano do direito à vida, à intimidade ou à honra, é permanecer no vago, sem raízes na situação jurídico substancial que clama por solução em cada caso[21].

2.2. Morosidade Processual provocada pelas partes

              Se a lentidão processual prejudica a muitos, alguns dela se aproveitam para obter vantagens, tal como se dá com empresas em estado pré-falimentar e as Fazendas Públicas; a todas interessa a postergação do pagamento de dívida – àquelas porque lhes convém pagar juros legais de 1% ao mês é a estas porque a demora pode fazer com que os precatórios recaiam sobre os orçamentos das administrações dos mandatários supervenientes.

              Pouco adianta tais condutas caracterizarem ofensa ao Código de Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados e serem suscetíveis de aplicação de sanções, pois não são efetivamente coibidas; e, como disse o Marquês de Beccaria, não é o rigor do suplício que previne as infrações, mas a certeza da punição[22].

              Diante disso, cabe aos juízes reprimir atos dessa natureza, que não ofendem somente o interesse das partes, mas principalmente o interesse público responsável em desobstruir as vias judiciárias, deixando-as à disposição daqueles que delas precisam se empregar. Concluímos que:

              Segundo autores e juristas, o Poder Judiciário Brasileiro enfrentaria hodiernamente a mais grave crise de sua história, motivada pela letargia em pacificar os conflitos de interesses.

              A mora em prestar a tutela Jurisdicional efetiva estaria proporcionando graves danos àqueles que necessitam socorrer-se ao Judiciário, principalmente às pessoas mais carentes de recursos financeiros e às detentoras de interesse legítimo.

              No intuito de minimizar os efeitos desse mal, a Emenda Constitucional de n° 45, aprovada no ano de 2004, provocou uma série de modificações na estrutura do Poder Judiciário. Entre elas, uma em especial viria para atender ao clamor da sociedade por uma prestação jurisdicional célere, numa típica adaptação das normas jurídicas aos anseios sociais. Trata-se da inserção do inciso LXXVIII no art. 5º da Constituição Federal, que traz em seu bojo o princípio da razoável duração processual. Rege tal princípio que “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação” (BRASIL. 2010a).

              No entanto a resolução do problema da morosidade não passaria apenas pela criação do princípio da razoável duração do processo, mas sim pela elaboração de mecanismos eficientes passíveis de tornar tal princípio efetivo, a fim de que o mesmo cumpra a finalidade para a qual foi criado.

              A criação eficiente desses mecanismos processuais, por sua vez, dependeria do conhecimento da existência, ou não, da lentidão da justiça em cada localidade por meio de pesquisas científicas, bem como da análise dos fatores que contribuem para o estrangulamento do sistema judicial local.

              Apesar da importância para a efetivação do princípio da razoável duração do processo, tais estudos não estariam ocorrendo. Poucas pesquisas científicas e levantamentos estatísticos estariam sendo feitos para tentar averiguar o real tempo despendido na prestação Jurisdicional, bem como analisar quais os principais fatores que influenciam na duração do processo.

              A carência de pesquisas adequadas e dados estatísticos, somada a inexistência de diagnóstico dos fatores de o do Judiciário, estariam impedindo que as mudanças legislativas e administrativas voltadas para a aplicabilidade do princípio da razoável duração processual sejam implementadas com proficiência.

 

2.2.1 Litigância de má-fé    

 

              Litigância de má-fé. Não há nenhuma imparciabilidade em aplicar a pena não se torne instrumento contrário a justiça, sendo usada apenas para protelar, com manobras burocráticas e maliciosas, a efetivação de direito subjetivo da parte. Apelação improvida.

              Determina o art. 17 do Código de Processo Civil Brasileiro que reputa-se litigante de má-fé, portanto faltando com a lealdade processual, dentre outros, aquele que proceder de modo temerário em qualquer incidente ou ato do processo (inciso V) e provocar incidentes manifestadamente infundados (inciso VI).

              A lei n. o 9.668, de 20 de junho de 1998, introduziu o inciso VII no referido artigo e deu nova roupagem ao art. 18, caput do CPC. Desta forma, o recurso de cunho manifestadamente protelatório será considerado litigância de má-fé. Com relação à imposição de multa e indenização, o legislador alterou o caput do art. 18, determinando um novo parâmetro para a imposição da penalidade.

              Portanto, as alterações passaram a ter o seguinte conteúdo:

  1. Art. 17. Reputa-se litigante de má-fé aquele que:

… interpuser recurso com intuito manifestadamente protelatório.

  1. Art. 18. O juiz ou tribunal, de ofício ou a requerimento, condenará o litigante e má-fé a pagar multa não excedente a um por cento sobre o valor da causa e a indenizar a parte contrária dos prejuízos que esta sofreu, mais honorários advocatícios e todas as despesas que efetuou.

              O ato da litigância de má fé são peculiares àqueles que participam do processo, ou seja, partes, juízes, advogados, promotores e auxiliares. As partes envolvidas no processo estão adstritas a observância de princípios éticos de natureza obrigatória, se ocorrer qualquer atitude que venha de encontro a tais deveres é preciso ser argüida pela parte adversa, através de requerimento ou de oficio pelo juiz ou tribunal.

              No que tange à responsabilidade, o advogado será solidário com o seu cliente no caso de ocorrer à lide temerária. É importante saber a distinção entre a litigância de má-fé e a lide temerária: aquela só ocorre quando afronta o inciso I, do art. 17 do CPC, ou seja, nos casos em que a pretensão ou defesa ir de encontro ao texto expresso em lei ou fato incontroverso; esta ocorre nos casos de demandas infundadas; mas, coerentemente, entre elas também haveria que se colocar a hipótese de uso do processo para conseguir o objetivo ilegal (art. 17, li do CPC), com carga de deslealdade muito mais acentuada.

              Outro exemplo de litigância temerária reside na oposição injustificada ao fluxo do procedimento. São conhecidos casos nos quais a malícia é elemento essencial, não se confundindo com as hipóteses que tutelam objetivos idôneos ao juridicamente relevante, cuja análise deve ficar reservada ao prudente arbítrio do juiz.

              Entendemos que proceder de modo temerário corresponde a proceder sem razão, sem ponderação, com manifesta imprudência em detrimento da parte contrária. Já os incidentes infundados estão ligados à resistência injustificada do andamento do processo, segundo o mesmo processualista. Ambos os casos poderão decorrer de dolo e culpa grave.

              Afirma a eminente professora Ada Pellegrini Grinover, ao tratar da ordem judiciária, que os dados elementares do direito à ordem jurídica são:

a)      O direito à formação;

b)      O direito à adequação entre a ordem jurídica e a realidade socioeconômica do país;

c)      O direito ao acesso a uma justiça adequadamente organizada e formada por juízes inseridos na realidade social e comprometidos com o objetivo de realização à ordem jurídica justa;

d)     O direito a preordenação de promover a objetiva tutela dos direitos;

e)      O direito à remoção dos obstáculos que se anteponham ao acesso efetivo a uma Justiça que tenha tais características[23].

              Tais dados, fornecidos por essa renomada jurista, são imprescindíveis para haver uma organização judiciária eficiente e satisfatória, mas, infelizmente constatamos que esses dados não correspondem a nossa realidade jurídica. Em discussões e propostas para a melhora da nossa prestação jurisdicional seria relevante considerar esses dados supracitados. Resumindo temos que, A Lei nº 9.668, de 23.6.98. Estabeleceu nova redação para o art. 18 do CPC, dispondo que: “Art. 18. O juiz ou tribunal. de ofício ou a requerimento, condenará o litigante de má-fé a pagar multa não excedente a um por cento sobre o valor da causa e a indenizar a parte contrária dos prejuízos que esta sofreu mais os honorários advocatícios e todas as despesas que efetuou”. Resolvemos, pois, tecer algumas considerações que reputamos relevantes sobre o tema.

              Primeiramente, é oportuno lembra que, já na redação anterior conferida pela Lei 8.952, de 13.12.94. O art. 18 do CPC conferia poderes ao juiz para aplicar de ofício a multa decorrente de litigância de má-fé. O dispositivo legal, ao textualizar que “o juiz … condenará”, dá a entender que se trata de imposição ao juiz, mas, na verdade, apenas se lhe concede uma faculdade decisória, incluída em seu poder discricionário. Embora a norma seja cogente e imponha um poder-dever ao juiz, vinculado ao interesse público e à dignidade da justiça, este somente agirá neste sentido quando entender devido, não existindo nada que o obrigue a condenar.

              Aliás, é importante sublinhar que a imposição de multa, ex offício, devido ao procedimento temerário e malicioso da parte, não pode se confundir com parcialidade. O só fato de o juiz concluir se tratar de situação de bad faith da parte, cominando a sanção legal, não leva a tal conclusão, conforme julgado do Tribunal gaúcho:

2.3. O formalismo dos atos processuais

              Indiferentes aos bons ventos da doutrina da instrumentalidade do processo, muitas vezes os operadores do sistema judicial brasileiro têm se valido do formalismo dos atos processuais como fonte oficial de realização de ardilosas injustiças.

              As distorções funcionais são constantes. Como exemplo, citamos um caso real em que tendo uma pessoa sido citada para se defender em ação de reparação de danos decorrentes de acidente automobilístico, sentindo-se coberta de direitos, compareceu à audiência de instrução e julgamento e apresentou ao juiz o comprovante de transferência do veículo, ocorrida muito anteriormente à data do sinistro. Porém, como tal pessoa havia comparecido à audiência sem advogado, o magistrado não teve dúvida – com base no art. 319do CPC[24] em sentença confirmada pelo Tribunal de Justiça, decretou-lhe a revelia e o condenou ao ressarcimento dos danos[25].

              O exemplo serve para ilustrar o quanto às leis podem ser interpretadas em detrimento da justiça. O emprego das fórmulas e ritos processuais tem por escopo garantir o direito ao contraditório, estabelecendo um procedimento lógico e previamente conhecido pelas partes, porém, o direito ao procedimento não pode servir de ensejo ao reinado do formalismo, no qual se valoriza o instrumento subjugando-se a essência.

              O princípio da inércia judicial veda aos juízes a prestação’ da tutela jurisdicional de oficio (CPC, art. 2º), todavia, cabendo-lhes promover a justa composição da lide, têm o dever de constatar se a pretensão é fundada em direito, podendo, no curso do processo,mesmo de oficio, determinar as provas necessárias à sua instrução (CPC, art. 130).

              Quanto às facções processuais, seu emprego tem que ser comedido, admitindo-o somente se, por qualquer meio, a força das presunções não tiver sido ilidida. A busca da verdade real, embora não seja aspiração maior do processo civil, não deve ser desprezada no exercício dessa jurisdição quando essa verdade chegar ao conhecimento do juiz, ainda que regulamentem, desde que observada a garantia do contraditório[26].

2.3.1. Burocracia processual

              A preocupação acerca da burocracia processual não é nova. Em 1975, no diagnostico sobre a Reforma do Poder Judiciário, o Ministro do Supremo Tribunal Federal Rodrigues Alckmin (relator da comissão do STF), destacava que o retardamento dos processos e a ineficácia na execução dos julgados são velhas e generalizadas queixas.

              Assim, quando o aproveitamento da morosidade processual passa a estratégia processual é porque há algo de muito ruim no aparato judicial. E se o Estado disto também se prevalece, então o mal é bem mais grave. Não é preciso haver muita burocracia, mas sim resultado. É, pois de fundamental importância que conceitos como qualidade total, avaliação externa e interna, competição pela qualidade no serviço, preocupação com o alvo do serviço público (o usuário consumidor), pesquisa e modernização tecnológicas estejam permanentes, cada vez mais, no dia-a-dia de todos nas nossas organizações judiciárias.

              O Min. Celso Melo, arremata:

O povo brasileiro ainda não tem acesso pleno ao Poder Judiciário. A propósito, é de se registrar que poucos brasileiros procuram a justiça (cerca de 4% segundo o I8GE/1990), não porque não precisem, mas, é certo, porque recorrem a outros meios (às vezes até violentos) de solução de conflitos. Daí porque ,vale dizer, a lógica social e a legitimação política do discurso formador impõem que antes das restrições, diretas ou indiretas, ao sagrado direito de acesso à justiça, seja discutida a urgência da instalação das Defensorias Públicas, dos Juizados Especiais, do Juizado de instrução, pelo menos, para os crimes de alta repercussão social[27].

              Verifica-se que essa burocracia processual desperta um descrédito muito grande em relação ao Poder Judiciário. O desprestígio do Poder Judiciário é, pois, um mal que corrói qualquer Estado de direito e compromete desde a cidadania até os altos interesses econômicos do país. Faz-se necessário observarmos, por outro lado, que o excesso de trabalho na Justiça, antes de tudo, poderá estar relacionado à desproporção entre os meios materiais e humanos, em qualidade e quantidade e os níveis de litigiosidade que caracterizam o nosso tempo, em que o próprio Estado é o maior responsável por boa parte dessas querelas.

              Com efeito, muitas das propostas mais contornam que resolvem o problema da ineficiência/excesso de trabalho da justiça. Diante desse quadro, é sintomática a insatisfação a ideologia do processo de conhecimento, da lide plenária ou total. Estamos vendo que boa parte das perplexidades judiciais de nosso tempo está atrelada à malsinada e esdrúxula entre o direito material e o direito processual, o que gerou a lamentável inversão (da forma sobre a substância) e a excessiva autonomia do meio (o processo é instrumento de realização da ordem jurídica) sobre o fim. Esta alienação do processo é sentida, diuturnamente, no fórum.

              Parece mesmo que grande virtude dos processualistas históricos foi manter a tradição romana-medieval, que se baseava na razão de ser do direito processual está no direito material.  Fazendo um pequeno comentário aparte,

              O presidente do Superior Tribunal de Justiça, ministro Edson Vidigal, criticou a lentidão e da burocracia processual do sistema judiciário brasileiro e destacou a necessidade de integração entre países da América do Sul.

              Vidigal disse que a burocracia processual toma o tempo dos juízes e “reduz [os magistrados] à condição de enxugadores de gelo”. “Não é isso o que a República quer. Não é disso que o povo precisa”, completou.

              O presidente do STJ criticou ainda a lentidão quanto às negociações entre os países sul-americanos no sentido de fortalecer a integração regional. “Para onde queremos ir agora, nós todos da América do Sul? para a desintegração, para a absorção ou para a integração? Para o Mercosul, opção de integração regional autônoma ou vamos ficar quietos esperando um colapso após o qual só restará a absorção através da Alca?”.

              O ministro também defendeu o Judiciário como instrumento de desenvolvimento do país. “Onde há segurança jurídica. os capitais aportam e demoram. A economia cresce. Diminui o desemprego”, afirmou.

              Na avaliação de Vidigal, nos países onde o Judiciário funciona bem, a economia cresce a uma média de 3% ao mês. O ministro citou o Brasil como um exemplo de país onde o Judiciário não funciona a contento. Segundo seus cálculos, os entraves no sistema judiciário brasileiro, provocam perdas de até 20% ao ano no produto Interno Bruto (PIB).

2.4 Recursos protelatórios

              Por mais que se busque, não existe lei que defina o que é recurso protelatório, e por isso, ao passo que o próprio judiciário com suas injunções e o elenco de aplicativos com o fito de solucionar a ação acaba trazendo nulidades que remetem o processo para a eternidade. Neste especial, constatamos que não existe protelação, eis que o art. 475 do CPC não se aplica ao processo do trabalho.

              A caracterização do que seja um recurso manifestadamente proletário não possui uma conceituação unânime. Na doutrina o tema não foi suficientemente discutido, o que não impediu o mestre gaúcho Ovídio A. Baptista de formular interessante ensinamento, demonstrando a sua preocupação com a exagerada possibilidade de protelar a lide, via procedimentos autorizados por lei:

Tem-se dito que o instituto dos recursos, em direito processual, responde a uma exigência psicológica do ser humano, refletida em sua natural e compreensível inconformidade com as decisões judiciais que lhe sejam desfavoráveis. Não resta dúvida de que este sentimento é decisivo para explicar a criação e a permanência, historicamente universal, do instituto dos recursos. Mas não se deve perder de vista que o sentimento, em que se busca fundamentar os recursos, resume-se na compreensível segurança de que as partes podem gozar quando sabem que o juiz da causa terá sempre sua decisão sujeita ao julgamento. Isto, no entanto, não legitima que se prodigalizem os recursos, reduzindo a limites intoleráveis a jurisdição de primeiro grau, como acontece entre nós…

              Para uma correta e justa realização da vontade da lei é preciso chegar-se à verdade dos fatos submetidos à jurisdição. Entretanto, a demora nessa investigação da verdade real pode conduzir à falta de efetividade do julgado. A busca dessa verdade é um dos princípios que regem o nosso ordenamento jurídico, na Alemanha é primado a paz social, obtida através da rápida solução dos litígios eis que, como já dissemos, a demora da justiça acarreta a descrença nela mesma. O direito brasileiro como sempre e, a nosso ver, com razão optou por sistema de certa forma eclético. Entretanto, recebeu a preferência o legislador pátrio a investigação exaustiva da verdade, haja vista as raízes de nosso direito, calcado no direito romano, canônico e português.

              O legislador processual brasileiro, ao disciplinara matéria relativa aos recursos, adotou como regra geral o efeito suspensivo, lançando mão a técnica de excepcionar expressamente as formas recursais não dotadas deste efeito. O efeito suspensivo tem o condão de impedir a execução provisória da sentença. Desde a interposição até o julgamento do recurso, é vedado ao vencedor da demanda promover a ação de execução.

              O Código de Processo Civil admite uma série de recursos que são tidos por advogados e juízes como meramente protelatórios. Institutos como a perempção, por exemplo, nem ocorrem na vida diária dos tribunais, mas constam no CPC, como mero instituto para constar de provas de concursos públicos das carreiras jurídicas. É um ponto delicado e urgente a ser resolvido para que efetivamente tenhamos um aumento da produtividade e mais eficácia no resultado. Esses recursos protelatórios, muitas vezes, são usados de forma irresponsável por advogados, numa atitude de lesar próximo bem como lesara Pátria. Essa atitude acaba por promover a injustiça, já que o resultado da demanda, pode ocorrer de maneira tardia e tornar-se ineficaz, levando uma parcela da sociedade ao descrédito desta sagrada instituição que é o Judiciário.

              Nas ações contra o Poder Público, como exemplo dessa morosidade, a parte mais difícil não é obter do judiciário uma decisão sobre a causa, mas sim quando a parte vencedora pretende executar essa decisão, de modo a torná-la hábil a produzir os efeitos conquistados com a sentença. Novo caminho mais penoso é percorrido e, após intermináveis cálculos, impugnações, embargos e previsões orçamentárias, obriga-se o autor a depender, via precatório, da boa vontade da parte vencida, quando esta não resiste em encaminhar nova ação visando a rescindir a decisão que lhe foi desfavorável, perseguindo um terceiro tempo que na maioria das vezes acaba empurrando a parte mais frágil para a formalização de acordos desvantajosos. Tudo isso, porém, atende a um considerável rol de recursos previstos na Lei processual ordinária, votada e aprovada por outro poder – o legislativo, e sancionada pelo chefe de outro poder – o executivo.

              Outro fator que contribuiu para o afogamento de processos nos Tribunais foi coma promulgação da Constituição de 1988, por conta da extensa relação de direitos incorporado são seu texto, às demandas judiciais aumentaram consideravelmente, como podemos verificar no capítulo III, que versa sobre o quadro atual do Poder Judiciário. Muitos recursos a ser usados como protelatórios, sem haver uma definição do que vem a ser um recurso protelatório.

              A jurisprudência tende a considerar recurso protelatório aquele em que a parte sucumbente apenas reitera os argumentos constantes da petição inicial ou da contestação. Contudo, tanto no que se refere à petição inicial como a contestação, será de observância obrigatória o princípio da concentração ou da eventualidade, determinando que todas as defesas ou razões deverão ser formuladas de uma só vez, isto é, as razões de fato e de direito devem ser aduzidas na oportunidade processual adequada.

              Ultrapassada a fase processual (exordial/contestação), estará defeso às partes suscitar novas razões (preclusão), tirantes às exceções e incidentes previstos legalmente. Via de regra, as razões que devem lastrear o recurso são aquelas que já foram consignadas no momento processual adequado, pois não será mais lícito à parte sucumbente suscitar novos fatos, salvo se provar que deixou de fazê-lo por motivo de força maior.

              Ademais, os recursos, na maioria das vezes, cingem-se ao pedido de exame do conteúdo inserido na petição inicial ou na contestação. Trazer novos argumentos para o processo na fase recursal, salvo raras exceções, é afrontar a decisão exarada pelo juízo prolator, que não conheceu destas novas razões, e transformar essa nova matéria restrita apenas a superior instância, descurando o duplo grau de jurisdição.

              A disposição contida no parágrafo 1º do art. 515 do Código de Processo Civil. Possibilita ao tribunal conhecer de todas as questões suscitadas e discutidas no processo, ou seja, analisar o processo em sua extensão e profundidade: “§ 1º Serão, porém, objeto de apreciação e julgamento pelo tribunal todas as questões suscitadas e discutidas no processo, ainda que a sentença não as tenha julgado por inteiro.” Pois se a possibilidade de reapreciação já se encontra determinada pelo texto legal, a conclusão de que a simples reiteração dos argumentos constantes do processo na petição que interpõe o recurso é fato legalmente pertinente, aliado ao fato de que o Tribunal não fica vinculado ao simples recurso.

              Vejamos dois desses recursos que quase sempre são mais protelatórios que qualquer outra coisa: o agravo de instrumento e os embargos infringentes.

2.4.1. Agravo de instrumentos

 

              Agravo de instrumento é um Recurso Cível quando um juiz nega algum pedido a uma parte. O Agravo de instrumento é feito a uma instância superior, ou seja, um juiz de Primeiro Grau nega um pedido de Liminar para tirar o seu nome do SPC enquanto a ação está sendo julgada. O recurso, que será decidido pelo Tribunal de Justiça, é o agravo de Instrumento, que será provido (aceito) ou não. Agravo só pode ser feito numa decisão interlocutória, ou seja, uma decisão que não termina o processo. A decisão que termina o processo é a sentença.

              Há no nosso ordenamento muitos meios recursais, alguns desses recursos geram discussões sobre a sua finalidade, ou seja, se não utilizados para esmiuçar a verdade através de reexame ou se servem apenas para atrasar o fim de litígio. O agravo de instrumento está inserido nessa discussão, vamos analisar o porquê desse recurso ser tido, por alguns usuários da justiça, como recurso protelatório.

              Agravo é o recurso cabível contra as decisões interlocutórias.

Sob o nome de agravo de instrumento, a redação primitiva do Código de Processo Civil indicava o meio impugnativo das decisões interlocutórias prevendo que, a requerimento da parte, o instrumento pudesse não ser formalizado e que o recurso ficasse retido nos autos, para futura apreciação junto com a eventual apelação relativa à sentença da causa[28].

              Observando o problema da morosidade processual, o legislador pátrio editou a Lei nº. 9.139 de 30 de novembro de 1995, alterando os arts. 522 e o 529 do Código de Processo Civil, começando por denominá-lo como agravo. Dizendo-o cabível das decisões interlocutórias e nas modalidades de retido nos autos ou por instrumento, ressuscitando nesta modalidade como outra denominação o extinto agravo do Código de Processo Civil de 1939.

              Diante disso, os processualistas se esforçaram no sentido de simplificar o processo e o procedimento, eliminando atos inúteis, e agilizar a prestação jurisdicional mediante tutelas diferenciadas. O novo recurso de agravo de instrumento veio a contribuir para a aceleração do processo. O antigo procedimento era muito burocrático e o recurso demorava muito para chegar ao conhecimento do órgão superior. Agora, as decisões interlocutórias proferidas por juízes de primeira instância podem ser impugnadas diretamente do órgão superior, conferindo-se ao Relator o poder de suspender a eficácia da decisão quando houver risco de lesão grave e de difícil reparação (art. 527, II c.c. 558 do CPC).

              Com essa nova sistemática, aumentou o volume de serviços da segunda instância, razão por que algumas vozes se levantam para pedir retorno ao agravo anterior, isto é, a interposição do agravo em primeira instância, formação do instrumento, despacho de sustentação. O aumento exagerado do número de agravos possibilita a formulação de alguns questionamentos: Teria aumentado o número de decisões equivocadas? Seria o aumento decorrente da maior eficiência do novo sistema que permite controle imediato da decisão pelo órgão superior? Estaria crescendo a litigância de má-fé?

              O novo agravo foi criado no intuito de combater a burocracia e a morosidade. No alguns advogados vêm utilizando indiscriminadamente o agravo de instrumento, quadro de estrangulamento que hoje se observa em alguns tribunais. Cabe aos tribunais utilizar adequadamente os instrumentos que a lei processual lhes confere para a repressão à litigância de má-fé.

              No 12º Anteprojeto do Código do Processo Civil, é salutar transcrever no que diz respeito ao recurso de agravo de instrumento.

Ao art. 526 relativo à comunicação do agravo de instrumento perante o juízo de primeiro grau, propõe-se acrescentar parágrafo único, a fim de dar solução às controvérsias surgidas sobre se tal providência, a cargo do agravante, se meramente facultativo ou se condição de admissibilidade do recurso. Inclina-se o projeto pela segunda alternativa, com amparo em autorizada doutrina, porquanto inconcebível impusesse a lei ao recorrente um ônus, fixando-lhe o prazo, sem nenhuma consequência processual para o descumprimento, alias, sem a comunicação prevista no art. 256, o agravado terá imediato conhecimento dos termos do agravo, de molde a habitá-lo a bem oferecer sua resposta[29].

              Não resta dúvidas que para evitar que sejam usados recursos protelatório para a delonga processual é preciso estabelecer condições de admissibilidade. A inexistência dessas condições transforma o recurso em utensílio para o retardamento a resolução do litígio.

2.4.2. Embargos infringentes

              O recurso cabível contra acórdão não unânime que houver reformado, em grau de apelação, a sentença de mérito, ou houver julgado procedente a ação rescisória. Se o desacordo for parcial, os embargos serão restritos à matéria objeto da divergência. Admitidos os embargos, estes serão interpostos e julgados conforme dispuser o regime do tribunal. Caso a norma regimental determine um novo relator, este recairá para o Juiz que não havia participado do julgamento anteriormente. Interpostos os embargos pelo sucumbente da ação, abrir-se-á vista para as contra-razões. Exemplo prático: após decretada sentença condenatória por juiz de 1° instância, o réu apela contra a decisão. Em seguida, este recurso é encaminhado para o Tribunal, que por sua vez mantém a decisão inicial. Contudo, sendo a decisão do Tribunal votada por três membros, apenas dois foram a favor da condenação, enquanto o terceiro foi contra (favorável ao réu). Neste sentido, pode o réu opor o recurso de embargos contra decisão desfavorável a ele. Veja Arts. 530 a 534 do Código de Processo Civil.

Embargos infringentes – 1) Cabem embargos infringentes quando não for unânime o julgado proferido em apelação e em ação rescisória. Se o desacordo for parcial, os embargos serão restritos à matéria objeto da divergência. 2) Para o julgamento dos embargos infringentes, nas Varas do Trabalho, é desnecessária a notificação das partes. Saberjuridico.com.br

Embargos infringentes do julgado – Recurso cabível quando o julgamento proferido em apelação ou em ação rescisória não for unânime.

              Nosso sistema recursal, demasiadamente complexo, contribui de maneira decisiva para a demora na entrega da prestação jurisdicional. Vários fatores, como a escassez de recursos humanos e, até mesmo, de espaço físico, mas, principalmente, meios impugnatórios de decisões, como os embargos infringentes também para essa morosidade. Os embargos infringentes são o recurso cabível quando a decisão proferida em apelação ou ação rescisória não for unânime. O recurso baseia-se no voto vencido e tem a finalidade de fazer prevalecer o dispositivo nele contido.

              Deflui claramente da análise da Exposição de Motivos do Anteprojeto do Código de Processo Civil em vigor, da lavra do professor Alfredo Buiaid[30] a preocupação em estruturá-lo de forma a dotar a prestação jurisdicional de uma agilidade que a até então vigente legislação de 1939 não oferecia. Assinala o eminente jurista que:

O processo civil deve ser dotado exclusivamente de meios racionais, tendentes a obter a atuação do direito (…) o direito brasileiro se ressente, entre outros, de dois defeitos fundamentais: a) sob o aspecto terminológico, o emprego de uma expressão única para designar dois institutos deferentes; b) sob o aspecto sistemático, uma quantidade excessiva de meios de impugnar decisões.

              O Anteprojeto de Buzaid excluía os embargos infringentes, ressalvando somente o seu cabimento contra as decisões proferidas nas causas de alçada. Tal atitude, certamente, recebeu a influência do legislador português que suprimiu o recurso já em 1939. A partir disso, passou o Brasil a ser o único país a contemplar a figura dos embargos infringentes. Alegava o professor Buzaid, no item 35 da Exposição de Motivos, que:

A existência de um voto vencido não basta por si só para justificar a criação do recurso; por que pela mesma razão se deve admitir um segundo recurso de embargos sempre que no novo julgamento, subsistir um voto vencido; por esse modo poderia arrastar-se a verificação do acerto da sentença por largo tempo, vindo o ideal de justiça a ser sacrificado pelo desejo de aperfeiçoar a decisão[31].

              É, sem dúvida, válida e necessária a existência de meios recursais. A apreciação de matéria por um órgão colegiado, certamente não terá o mesmo potencial de avaliação da prova. Contudo, as questões de direito são normalmente melhor elucidadas por juízes mais experientes. Há, ainda, que se ponderar acerca da importância sociológica dos recursos. Com base nisso, afigura-se extremamente delicada a supressão de um recurso. Em princípio, poder-se-ia afirmar com tranquilidade que meios obsoletos de impugnação de decisões devem ser abolidos. Para tanto, imprescindível se toma uma definição do que se deve entender por “obsoleto”. Sem maiores esforços, chega-se à conclusão de que obsoleto é aquilo que não é utilizado. Se partirmos desse princípio, não devemos classificar os embargos infringentes como obsoletos, eis que, atualmente, é larga a sua utilização.

              Portanto, a eventual exclusão dos embargos infringentes, de forma alguma provocaria desarmonia no sistema recursal brasileiro. Ao contrário, valorizaria e manteria intacto o princípio do duplo grau de jurisdição que, apesar de não contemplado pela Constituição de 1988, é elemento basilar do ordenamento jurídico pátrio.

CAPÍTGLO II – ALGUMAS PROPOSTAS PARA SOLUCIONAR O PROBLEMA DA MOROSIDADE NA PRESTAÇÃO JURISDICIONAL

 

3.1. Súmula Vinculante

              A discussão quanto à necessidade de adoção de tais súmulas e de suas implicações a nível prático, teórico e político serão aqui discutidas. Bem como a análise do âmbito das possíveis consequências de sua adoção, não só como uma solução para resolver o problema da morosidade processual aqui tratada, com também para diminuir a sobrecarga de processos que a Magistratura brasileira se depara para por termo, julgando. Há muitos pontos que são tidos como negativos e positivos com a adoção das súmulas ao nosso ordenamento jurídico, não vamos comentar todos eles, apenas alguns discutiremos adiante.

              O instituto da súmula vinculante não é atual, em Roma, aonde já vimos que existia um ordenamento jurídico muito organizado, os prejulgados, como instituição.

              No Brasil, o tema remonta ao Velho Direito Português onde se encontra o precedente histórico do prejulgado – os Assentos da Casa de Suplicação, dotados de força obrigatória – cuja vigência, no Brasil, foi consagrada pelas Ordenações Manuelinas. Mesmo depois da Casa de Suplicação do Rio de Janeiro32[32], os Assentos da Casa de Suplicação de Lisboa continuaram a viger, salvo as derrogadas por lei posterior, com força de lei em todo o Império. Ex vi do art. 2° do Decreto 2.684 de 23/1 0/1875, tendo o Supremo Tribunal de Justiça competência para editar assentos, estes assentos eram caracterizados por dirimirem questões de direito em tese, por serem pronunciamentos genéricos dotados de força vinculativa e soberana como a própria lei.

 

3.1.1. Ideia da Adoção das Súmulas

              Toda a discussão que envolve o problema da morosidade do judiciário aponta como uma das causas da morosidade na prestação jurisdicional o fato da existência de muitos processos repetitivos, que obstruem os tribunais superiores.

              Como é público e notório o Poder Judiciário se encontra emperrado. Segundo dados pelo Banco Nacional de Dados Estatísticos – BNDES, são seis milhões de processos para oito mil e seiscentos juízes brasileiros, sendo que a média de recursos e incidentes processuais interpostos para cada processo é de três, o que faz surgir mais dezoito milhões de recursos e incidentes para serem julgados. Isso vai resultar em vinte e quatro milhões de questões postas e aguardando uma- solução pelo Judiciário, algo insuportável para uma estrutura arcaica e cada vez mais acionada. Diante desse ‘quadro, surge a alternativa da introdução do instituto das súmulas vinculantes, onde os precedentes dos tribunais superiores gozariam de eficácia erga omnes e vinculante em relação aos jurisdicionados, administração de tribunais e juízes de grau inferior.

              Esta questão foi levantada pela proposta de Emenda Constitucional n.o 96/92, de autoria do deputado Hélio Bicudo, que propõe a reforma do Poder Judiciário. A questão é polêmica e dividem juristas e magistrados. Essas súmulas, editadas pelos tribunais superiores, teriam o condão de vincular os juízes de primeiro grau e outros órgãos jurisdicionais hierarquicamente inferiores de forma coativa, sendo inclusive previstas sanções contra os magistrados que a desrespeitarem.

              O ministro Sepúlveda Pertence[33] é um dos maiores defensores do efeito vinculante. Porém, o tema dividiu as opiniões e muitos afirmam que o mecanismo pode cristalizar a jurisprudência, além de tirar a independência dos juízes e reduzir as garantias aos direitos dos cidadãos. O citado ministro argumenta que: “Levantamentos feitos no Supremo Tribunal Federal dão conta de que 90% dos processos que ali chegam são repetitivos obstruindo, de tal arte, as cortes superiores com questões já resolvidas”, se destacando, desta forma, como um dos grandes juristas do país que é simpatizante da ideia.

              Caso o Congresso Nacional viesse a instituir tal novidade, o efeito vinculante teria as seguintes características: a aludida súmula vincularia os juízes de primeira instância, que não poderiam contrariá-la, isto é, os magistrados de primeiro grau teriam que observar os lineamentos traçados pelas Cortes Superiores para os casos especificados na jurisprudência sumular; o Supremo Tribunal Federal apenas simularia aquelas decisões que congestionam os Tribunais Superiores desnecessariamente, tais como ações propostas, contestadas e decididas por computadores, questões absolutamente definidas.

 

3.1.2. Súmula Vinculante como solução para a morosidade processual

              Dentre as propostas apresentadas para solucionar a morosidade da justiça, indubitavelmente, a de efeito vinculante das decisões judiciais, ou simplesmente, súmulas vinculantes, vislumbra-se como a mais polêmica. Esse instituto, embora possa contribuir para o desassoberbamento do Poder Judiciário, é gerador de discussões.

              A aplicação da súmula vinculante, de fato, só seria feita em alguns casos. A adoção da súmula ocorreria no tocante a matéria que já tivesse sido discutida e rediscutida inúmeras vezes pelos tribunais, apresentando sempre o mesmo posicionamento; ou seja: se a tese jurídica for à mesma e os argumentos forem idênticos. Acreditamos que não há sentido em entrar com uma ação usando os mesmos argumentos já examinados pelo STF e esse tribunal reexaminar algo que já havia decidido.

              É importante frisarmos que a tese jurídica e os argumentos têm que ser os mesmos. Se, a tese jurídica for a mesma, mas os argumentos forem outros, não deverá ser aplicada a súmula vinculante. Dessa forma, não há prejuízo para a investigação da verdade real.

              A adoção pelo nosso ordenamento jurídico de súmulas dotadas de efeito vinculante, por si só não tem o condão de desafogar o judiciário e resolver o problema da morosidade da justiça. É preciso que a magistratura de primeiro grau seja prestigiada, pois entre juiz de primeiro grau e grau máximo não há relação de subordinação, e sim, uma hierarquia administrativa ou funcional. A sentença exarada pelo juiz de primeiro grau tem a mesma força e autoridade que o provimento do Tribunal.

              As Súmulas Vinculantes prometem a cura, mas não têm como fazer surtir o efeito anunciado e prometido. Se não for observado com rigidez o procedimento, que consiste em aplicar a súmula apenas para ações com tese jurídica e argumentos idênticos, podem vir a lesar garantias processuais e impedir a evolução do direito. A intenção das súmulas é plausível de mais análises sobre o seu funcionamento, porém não enseja sua adoção imediata da forma como se apresenta.

3.2 Controle Externo do Poder Judiciário.

              Em meio à tormenta que envolve o a proposta de um Controle Externo do Poder Judiciário, há duas conclusões a respeito desse assunto: primeiro, não se concebe que, a pretexto de se criar o controle externo do judiciário, estabeleçam-se mecanismos que restrinjam a independência ou imparcialidade do Judiciário; em segundo lugar, é preciso haver um controle dos atos do judiciário para evitar os “abusos” e a ineficiência.

              Há funções desempenhadas nesse poder Judiciário, funções estas não judiciais que não se sujeitam a tais de controles. Explica Hely Lopes Meirelles[34] que “todos os poderes têm necessidade de praticar atos administrativos, ainda que restritos à sua organização e ao seu funcionamento, e, em caráter excepcional admitido pela Constituição, desempenham funções e praticam atos que a rigor seriam de outro poder”.

              Esses poderes têm o fim de organização interna ou controle interno. “São funções que a Constituição assegura aos tribunais, como forma de garantias institucionais[35]”, tais como, dentre outras: eleger seus órgãos diretivos; elaborar seus regimentos internos, organizar suas secretarias e serviços auxiliares e os dos juízes que lhes forem vinculados, promover a execução orçamentária relativa às suas dotações, prover os cargos de juiz e de seu quadro de servidores, conceder férias, aposentadorias, licenças e afastamentos a magistrados e servidores, promovê-los, removê-los, colocá-los em disponibilidade, exercer a atividade correcional, conduzir o processo administrativo disciplinar e aplicar as punições nele decorrentes.

              Fala-se muito que há empreguismo e nepotismo no Poder Judiciário, que o corporativismo impede a apuração e punição de irregularidades e mazelas por ventura existentes, que a Justiça é lenta e inacessível à grande massa da população. Invoca-se a necessidade da instituição do controle externo do Poder Judiciário como panacéia para curar todos estes e outros males que afligem a nossa justiça.

              Controle, em tema de administração pública, ensina Hely Lopes Meirelles[36] que “é a faculdade de vigilância, orientação e correção que um Poder, órgão ou autoridade exerce sobre a conduta funcional do outro”. Esclarece ainda o saudoso mestré[37]:

A administração pública, em todas as suas manifestações, deve atuar com legitimidade, ou seja, segundo as normas pertinentes a cada ato e de acordo com a finalidade e o interesse coletivo na sua realização (…) infringindo as normas legais, ou relegando os princípios básicos da Administração, ou ultrapassando a competência, ou se desviando da finalidade institucional, o agente público vicia o ato de ilegitimidade e o expõe à anulação pela própria Administração ou pelo Judiciário em ação adequada.

              A respeito de como seria esse controle há diversas opiniões. A proposta da criação de um Controle externo do Poder Judiciário surgiu com o intuito de controlar as atividades institucionais desse Poder. Sabe-se que o Poder Judiciário tem a função constitucional de exercer controle sobre os demais Poderes da’ União, daí essa proposta da criação de um órgão para controlar o Poder Judiciário tem gerado muita polêmica.

              Em entrevista a Revista Consulex[38], o ex-Procurador-Geral da República, Geraldo Brindeiro esclareceu que esse órgão teria finalidade de atingir somente a abusos administrativos, sem ingressar na seara da prestação jurisdicional. É relevante ressaltar que essa especificação de função do órgão é de suma importância, se a sua competência abrangesse também a seara da prestação jurisdicional acabaria por se transformar em uma outra instância para impetração de um recurso, e disso a nossa estrutura judiciária não necessita, o que precisamos é de um controle sobre as funções administrativas que exercem os servidores da Justiça, forçando, com isso, uma prestação jurisdicional mais organizada e condizente com sua real função.

              Em um verdadeiro Estado Democrático de Direito, deve-se prever mecanismos para que o cidadão exerça o controle quanto ao recrutamento do juiz, assim como ao exercício da magistratura. No nosso país só é possível ingressar na magistratura através de concursos públicos e não por escolha de seus semelhantes, como ocorre em outros países. Portanto, o magistrado não possui legitimidade democrática, mas apenas constitucional, tornando-os imunes ao controle externo.

              Não se pode afirmar que não há um controle dos atos exercidos pelo magistrado no tocante à administração da máquina do judiciário. Há nos Tribunais uma estrutura de modo a conceber órgãos administrativos disciplinares denominados de corregedorias, que permitem quaisquer do povo reclamar do comportamento do juiz não consentâneo com os parâmetros normativos éticos. E, ocorrendo esta hipótese, tanto a Ordem dos Advogados do Brasil quanto o Ministério Público podem, de devem, dar provimento às reclamações que por bem fazer em nome da sociedade.

              Há quem aponte essas corregedorias como órgãos ineficazes, e use isso como argumento para a criação de um Controle Externo do Judiciário.

              Diante disso, ou não há o que se reclamar ou não há um funcionamento eficaz essa corregedorias, acreditamos que ocorra a segunda hipótese.

              O Controle Externo, uma vez instituído na prática, servirá para controlar o juiz de primeira instância, aquele que menos careça dessa ingerência e o único que, realmente, está sob o controle dessa corregedoria. O Ex-presidente do STF, o ministro Celso de Mello, em pronunciamento nos meios de comunicação, inclinou-se favoravelmente ao Controle Externo do Judiciário, justificando a sua posição com o argumento de que os membros da Corte Suprema são os únicos integrantes do quadro da magistratura que estão sujeitos ao impeachment[39].

              Diante do exposto, evidencia-se a desnecessidade de criação deste órgão externo com a participação de integrantes da Ordem dos Advogados do Brasil e do Ministério Público, pois já existem mecanismos para a mesma finalidade pretendida pelo Controle Externo do Judiciário. O que seria mais plausível é reformar os órgãos de Controle existentes, ou seja, detectar as falhas nas corregedorias e aperfeiçoar o seu funcionamento de forma que possa alcançar o seu verdadeiro funcionamento.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

              A morosidade da prestação jurisdicional tem frustrado direito, desacreditado o poder público, especialmente o Poder Judiciário, e afrontado os indivíduos.

              A demasiada demora no trâmite processual é certame te um dos maiores senão o maior dos dissabores experimentados por aqueles que recorrem ao Judiciário. A morosidade na prestação da tutela jurisdicional acaba por impingir as partes vários prejuízos que não se resumem aos materiais, eis que por muitas vezes acabam por experimentar também os prejuízos psicológicos.

              A decisão judicial para ser adequada e servir a pacificação social precisa alem de seguir os preceitos legais, necessariamente ser entregue ao jurisdicionado em tempo razoável, sob pena de perecimento do direito.

              Esclarecemos, a priori, que não foi pretensão nossa exaurir o tema, dada a diversidade de opiniões a respeito dessa questão, Dentro desta perspectiva, tentamos traçar uma linha de abordagem que permitisse a visão de alguns problemas que afetam a morosidade na prestação jurisdicional, o que foi possível mediante a pesquisa de obras relacionadas, bem como artigos jurídicos e outros trabalhos a respeito.

              Assim, vimos que a morosidade na prestação jurisdicional é uma das principais queixas sociais referente à função do Poder Judiciário. Fazendo uma breve análise histórica, percebe-se que a morosidade é um problema atual. Na aplicação da justiça, em épocas anteriores, o que se discutia era a sua verdadeira essência, ou seja, até a Idade Moderna as discussões que existiam em tomo do direito e da organização judiciária eram em relação a sua verdadeira finalidade, questionando a aplicação do direito em prol da justiça. E, sabemos que o conceito de justiça muda a cada época, pois como falamos inicialmente, o Direito é uma ciência dinâmica que busca acompanhar as evoluções sociais, procurando aperfeiçoar-se, sempre, no sentido de praticar a justiça. Sendo assim, o Poder Judiciário está em evidência, às críticas a respeito do seu funcionamento e do serviço que presta são vorazes, a sociedade reclama por mudanças, o descrédito é evidente.

              São várias as causas que levam ao retardamento da prestação jurisdicional, o presente trabalho selecionou algumas, que foram abordadas no capítulo II. No que tange à morosidade processual, foi visto primeiro o papel do juiz na condução do processo. Espera-se do juiz soluções rápidas e sensatas, porém, é preciso, antes de se atribuir responsabilidade pela demora das ações aos juízes, ter consciência do aumento vertiginoso do número de ações nas varas judiciárias, sobrecarregando de processos cada juiz, Em uma rápida análise estatística percebemos que aqui no Brasil o número de juízes em relação ao número de habitantes é deveras desproporcional, comparado a outros países.

              A morosidade processual também pode vir a ser provocada pelas partes, pois, se a demora acarreta prejuízo para outros pode trazer vantagens. Dessa forma, há quem litigue com o intuito de protelar uma ação. É difícil admitir, mas ocorre que advogados e procuradores de Estados, Municípios e outras instituições utilizam todos os instrumentos que encontram para prejudicar a celeridade processual, com o fim de beneficiar o seu representado; mesmo que prejudicando a outra parte. Isso porque, para alguns litigantes é irrelevante prejudicar ou não a parte adversa do processo. Em alguns casos esses litigantes são enquadrados no art. 17 do Código de Processo Civil Brasileiro como litigantes de má-fé, do é provado que os recursos interpostos pelo litigante são protelatórios, sendo punível com multa pelo art. 18 do referido Código.

              O litigante de má-fé não é apenas o autor ou o réu da ação; além das partes, podem ser enquadrados nessa denominação os juízes, advogados, promotores e auxiliares. Atribuir a litigância de má-fé além das partes (autor e réu) é de extrema importância. Hoje já se prevê a responsabilidade solidária do advogado com o seu cliente quando for constatada a litigância de má-fé. É preciso que todos compreendam o sentido da justiça, mas quem melhor que advogados, juízes, promotores, enfim, pessoas relacionadas a justiça pela sua profissão, que possuem o conhecimento da ciência jurídica, para distinguir o que é justo ou não. Sendo assim, nada mais razoável do que responsabilizar’ também a esses mencionados serventuários pela sua litigância de má-fé.

              Uma outra causa abordada sobre a morosidade processual consiste no excesso de formalismo dos atos processuais. Constata-se que há tanto formalismo que o importante, muitas vezes, não é a essência do bom Direito, fumus boni iuris, mas sim a fiel adequação ao correto procedimento, o que se denomina popularmente por burocracia processual.

              Esses excessivos atos formais desencorajam o cidadão a procurar a justiça para resolver os seus litígios. Isso fica evidente através de uma pesquisa feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no ano de 1990, pela qual conclui-se que poucos brasileiros buscam a justiça. Todavia, este fato se dá pela falta de precisar recorrer a mesma, mas devido ao descrédito ser tão grande quanto à sua eficácia, e, muitas vezes, os litígios são resolvidos por outros meios, nos quais se pratica a justiça até pelas próprias mãos, usando-se, comumente, meios violentos. Talvez, esteja na hora de se simplificar mais os atos processuais, para aproximar a justiça do cidadão e evitar que se criem “justiceiros”, dentro do país.

              Outra vertente que dá ensejo a discutida morosidade na prestação jurisdicional são os recursos protelatórios. Vimos que a conceituação do que venha a ser recursos não possui unanimidade, ficando, assim, vinculada a sua caracterização a interpretação do caso concreto. É natural que o vencido em uma ação não se conforme com a decisão proferida e recorra a instâncias superiores com ó fim de ver reformulada essa decisão. O direito a recursos consiste em esmiuçar o caso diversas vezes para a busca da verdade dos fatos, porém esse direito é usado, muitas vezes, com o fim de protelar uma decisão, que já foi proferida em primeira instância. Infelizmente, esses recursos protelatórios usados co a idade de lesar o próximo acabam por comprometer a justiça, demorando tanto para se chegar ao resultado que, quando se vem a obter o resultado final, aquela decisão não tem mais importância. Um dos litigantes que mais usa desse meio é o próprio Poder Público, pois, através de impugnações, embargos e intermináveis cálculos e previsões protela a execução por parte do vencedor, acabando por forçá-lo a acordos desvantajosos, para não ter que esperar vários anos.

              Foram observados dois tipos de recursos, que, normalmente, são usados para protelar o processo. São eles: o agravo de instrumento e os embargos infringentes. O primeiro era tido como manifestadamente protelatório, um entrave a celeridade processual, consistindo em procedimento de revisão de decisão interlocutória revista pelo juiz de primeiro grau, que, quando não reconhecia tal recurso, caberia um sucedâneo de recursos para as instâncias superiores. Com a Reforma do Judiciário será possível o recurso ser apreciado pelo órgão superior, diretamente. Essa alteração no agravo de instrumento, apesar de objetivar uma celeridade processual, continuou sendo usado com fins protelatórios, não resolvendo o problema da morosidade processual. O segundo, os embargos infringentes, é cabível quando a decisão proferida em apelação ou ação rescisória não for unânime, tendo em um voto vencido a razão para interposição de um novo recurso. É certo que a existência de tantos meios recursais tem por intenção aperfeiçoar a decisão, mas o que ocorre com isso, muitas vezes, é o sacrifício do ideal de justiça. Como os embargos infringentes só são cabíveis contra acórdãos e observando que neste momento cumpriu-se o duplo grau de jurisdição, ou seja, a decisão já se submeteu ao exame de mais de um juízo, a exclusão desse recurso não acarretaria prejuízo a busca da verdade, pois o nosso sistema jurídico já é pródigo em recursos.

              É inegável a importância dos recursos, não estamos argumentando contra isso. Porém, há aqueles que preconizam a ideia de não haver segundo grau de jurisdição, alegando que o juiz de primeiro grau tem um contato mais imediato com as partes e as testemunhas e, portanto, teria melhores condições de avaliar as provas e proferir um julgamento mais justo. Outro argumento nessa direção é o de que, se o juízo monocrático está sujeito a errar. Contudo, os juízos colegiados, obviamente, não estão isentos dessa possibilidade.

              Depois de expor algumas das causas que levam a morosidade na prestação jurisdicional, elaboramos algumas propostas para solucionar o problema, embora estejam todas ainda em discussão, pois dão ensejo a muitos debates, podendo gerar algumas controvérsias, A primeira proposta apresentada foi à adoção da Súmula Vinculante. Mostramos os posicionamentos a favor e contra de alguns juristas e, por se tratar de um tema bastante discutido, até mesmo polêmico, acreditamos que a adoção de tal medida precisa ser, antes de tudo, muito discutida e estudada e não deve ser aplicada sem a certeza de que não estará acarretando um engessamento do Direito. É necessário ver caso a caso, com minúcia, pois não podemos favorecer a paralisação do direito, a estagnação da evolução do raciocínio jurídico e, principalmente, a adequação às mudanças sociais. O fator vinculante pode vir a coibir o progresso do direito, quando veda discussões a respeito de um tema que, como já está sumulado, não pode mais ser revisto. Essa proposta oferece uma solução, mas dificilmente fará o efeito esperado.

              Por fim, outra proposta para combater a morosidade processual seria a criação de um Controle Externo do Poder Judiciário, órgão fiscalizador que atuaria na sua esfera administrativa. Fala-se na criação deste órgão como se não houvesse nenhum instituto de controle deste Poder. Há um controle interno do Poder Judiciário, são corregedorias estruturadas em Tribunais; porém, reconhece-se, evidentemente, a sua ineficácia. Ora, se é constatado que há um órgão fiscalizador ineficaz, ao invés de aperfeiçoá-lo, reformando a estrutura que já existe, pensa-se em criar outro órgão. Não vislumbramos a necessidade de criação de algo que tem por finalidade uma fiscalização dos atos administrativos do Poder Judiciário, se já existe um órgão pra isso. Talvez seja mais cômodo criar do que reformar, mas não, necessariamente, mais aconselhável e eficaz.

              Portanto, concordamos que, para se resolver um problema como o da morosidade na prestação jurisdicional, é necessário corrigir o que está errado, ou seja, reformar a estrutura existente, como as corregedorias internas que não atendem mais a finalidade pretendida; aumentar o número de juízes, seria uma outra alternativa e excluir recursos que são usados para protelar o final o processo. Vimos propostas, analisamos causas, e verificamos que é necessário reformar o nosso ordenamento jurídico. O Brasil tem uma boa estrutura judiciária, ela só precisa ser mais eficaz, quando isso ocorrer o problema da morosidade não vai ter sido solucionado totalmente, mas também, não vai incomodar tanto quanto o faz atualmente. A partir daí poderemos pensar em viabilizar a criação de outros meios para aperfeiçoar a nossa estrutura judiciária. O que nos permite concluir é que, a produção da justiça se faz mediante manifestação da jurisdição no processo, e não por decurso de tempo. Não podemos ter em mente que para se promover a justiça precisamos de vários e vários meses e até mesmo anos para que a matéria discutida amadureça no inconsciente das partes. Ao contrário, precisamos entender que um julgamento tardio irá perder gradativamente seu sentido reparador.

              Não pregamos aqui a decisão final a qualquer custo. Mais, sim, uma decisão final em tempo razoável, que seja útil a quem foi buscá-la. O mundo vive há muito essa expectativa. A entrega da prestação jurisdicional em prazo razoável é um movimento de cunho mundial, seja ele desenvolvido ou em desenvolvimento. E reivindicação da massa e não pode ser tratado sem o destaque que o assunto merece.

              A busca por soluções à morosidade processual tem sido intensa. Essa demora pode ser classificada como uma pandemia que o mundo tenta erradicar. Muito se culpa o Poder Legislativo, afinal é ele que elabora as leis que Judiciário aplica. É ele que legisla procriando recursos ou outros meios suficientes para tornar o processo ainda mais lento. Mas a ele também se devem alguns avanços na busca por uma Justiça mais célere e consequentemente, efetiva.

              Entre várias reformas aprovadas, uma se sobrepõe. A edição da Emenda Constitucional nº 45/2004. A referida emenda é prodiga em dispositivos que se destinam, pelo menos, em tese, a fixar diretrizes no sentido de usufruirmos de um Judiciário mais célere. Tem como ideia central alterar a atual equação entre tempo e processo.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

BAPTISTA, Ovídio A. e GOMES, Fábio Luís. Teoria Geral do Processo Civil. 8ª edição. Revista dos Tribunais, São Paulo, 1999.

BUZAID, Alfredo. Anteprojeto do Código de Processo Civil, item 5 da Exposição de Motivos. 1939.

CONSTITUIÇÃO DA REPUBLICA FEDERATIVA DO BRASIL / organização de

OLIVEIRA, Cláudio Brandão de. 3ª ed. Rio de Janeiro: DP&A, 1999.

CRETELLA JÚNIOR, José. Direito Romano Moderno. Rio de Janeiro: Forense Universitária, Rio de Janeiro, 21ª edição. 1998.

DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1987.

GRINOVER, Ada Pellegrini. O Processo em Evolução. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1996.

KELSEN, Hans. Teoria Geral do Direito e do Estado. Título original: De lª Espirit des Lois Tradução de Luís Carlos Borges. São Paulo: Martins Fontes, 2ª edição.

MARQUES, José Frederico. Manual de Direito Processual Civil. São Paulo: Ed. Saraiva, VOL I, 2ª edição, 1974.

MEIRELLES, José Frederico. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Revista dos Tribunais, 16ª. edição. 1997.

MIRABETE Julio Fabrini. Manual de Direito Penal. São Paulo: Atlas, Vol. I, 11ª. Edição, 1998


[1] CRETELLA JÚNIOR, José. Direito Romano Moderno  1998. Pág. 36.

[2] VICENTINO, Cláudio. História Geral. 1990, p. 13-35.

[3] MIRABETE, Julio Fabrini. Manual de Direito Penal, p. 34.

[4] ARISTÓTELES, A política Tradução de Nestor Silveira Chaves. Rio de Janeiro, tecnoprint, Livro Sexto.

[5] VICENTINO, Cláudio. História Geral. 1990, p. 49-95.

[6] Op. cit.: 1990 – 141 a 151

[7] Op. cit.: 1990 – 160 a 170

[8] Art. 16 – Não tem constituição a sociedade onde não é assegurada a garantia dos direitos nem determinada a separação dos poderes.

[9] VICENTRINO, Cláudio. História Geral. 1990, p. 161.

[10] ROCHA, José de Albuquerque. Estudos sobre o poder judiciário. 1995 p. 38.

[11] Na teoria, o Poder Moderador foi concebido para servir de ponto de equilíbrio no funcionamento das instituições, porém, na pratica, serviu para manter nas mãos do Imperador, que era o chefe do Executivo, a concentração do poder político. Merece registro que lá também foi criado o Poder Moderador. (CANOTlLHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional, p. 296)

[12] KELSEN, Hans. Teoria Geral do Direito e do Estado. 1992, p. 183.

[13] Op. cit.: 1992 – 184.

[14] Op. cit.: 1992 – 100.

[15] Dados fornecidos pelo Min. Sepúlveda Pertence em entrevista concedida a Revista Consulex, n.º 16 Ano II. Vol. I. 1998.

[16] Que se contrapõe à teoria da individualização, para qual bastaria ao autor afirmar a existência a relação jurídica.

[17] MARQUES, José Frederico. Manual de Direito Processual Civil. 1974, p. 155.

[18] MESQUITA, José Ignácio Botelho de. Conteúdo da Causa de Pedir. 1982, p. 49.

[19] Como se disse, trata-se de mera presunção, que não gera direito a uma sentença favorável.

[20]  MARQUES, José Frederico. Manual de Direito Processual Civil. 1974, p. 145.

[21] DINAMARCO, Cândido Rangel. A Instrumentalidade do Processo. 1993. P. 184.

[22] Dos Delitos e das Penas. 1764. Trad. De TORRIERI GUIMARÃES. 1995, p. 56.

[23] GRINOVER, Ada Pellegrini. O Processo em Evolução. Ed. Forense Universitária, 1996, PP. 9-10.

[24]  Art. 319 Se o réu não contestar a ação, reputar-se-ão verdadeiros os fatos afirmados pelo autor.

[25] Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, DJ 30.10.85, P. 19.425.

[26] Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios. Agravo de instrumento n.º 1.606. Decisão de 12.06.86.

[27] Revista Consulex – Ano III – N.º 25 – Janeiro de 1990. Pág. 47.

[28] THEODORO  JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. 2000, p.571.

[29] Por todos, J. E. Carreira Alvim, Novo Agravo, Ed. Del Rey, 2ª Ed., 1996, págs. 106/110, Athos Gusmão Carneiro, O novo Recurso de Agravo, Ed. Forense, 2ª Ed., n.º 46, Págs. 44/45 e o Enunciado n.º 2 aprovado pelo Centro de Debates e Estudos do Tribunal de Alçada do Rio de Janeiro, verbis: “Não será conhecido o agravo quando desatendido o disposto no art. 526 do código de processo Civil”.

[30] BUZAID, Alfredo. Anteprojeto. De Código de Processo Civil, item 35 da Exposição de motivos 1939.

[31] Op. Cit.: 1939 – 185.

[32] Decreto 2.684 de 23/10/1875.

[33] Em entrevista concedida a revista Consultex, n.º 16, Ano II, 1998.

[34] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro, 1998, p. 51.

[35] SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. 2000, p. 496.

[36] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro, 1998, p. 51.

[37] Op. Cit.: 1998 – 51.

[38] Revista Consultex, n. 16, Ano II, Vol. I, maio de 1998.

[39] Art. 52, inc, II da Constituição Federal de 1998.

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