ANÁLISE DO CONTEXTO POLÍTICO DA DEMOCRACIA CONTEMPORÂNEA NA AMÉRICA-LATINA SEGUNDO OS PRINCÍPIOS DO NEOCONSTITUCIONALISMO

 Introdução

A América Latina apresenta atualmente um contexto inédito em sua
história. É que pela primeira vez a forma de governo predominante nos países latinos
é a democracia.
Também há que se ressaltar que este período democrático já perdura por
um período de aproximadamente 25 a 30 anos, o que nos permite fazer uma análise
político-jurídica dessas três décadas de governo democrático, que, no entanto, possui
particularidades que desestabilizam eventualmente a política democrática,
especialmente pelas minorias incapazes de alcançar o poder, mesmo neste sistema
de governo popular.

Este estudo se mostra importante porque apesar de termos a predominância de democracias estáveis, ao mesmo tempo os países latino-americanos vivem uma série crise social em função das grandes desigualdades, tais como, por exemplo, o nível de pobreza elevado e economias fracas e com pouco crescimento.
Esses problemas podem gerar uma desestabilização social das instituições de maneira que se faz necessário uma análise dessa conjuntura política juntamente com os princípios jurídicos de direitos e garantias individuais dos cidadãos, com o objetivo de identificar as necessidades elementares para diminuição das desigualdades sociais e manutenção da estabilidade política democrática dos países latinos.

1.O panorama histórico de acontecimentos do Século XX
O Século XX foi um século das utopias do liberalismo e socialismo que foram ideais perseguidos com afinco pelos Estados2, colocando o sujeito e o trabalho como focos principais de um sistema político capaz de manter sua autossuficiência.
Foi também no século XX que se sacrificou definitivamente o passado e seus mitos, uma vez que se mudou o ritmo de vida dos cidadãos, ocidentalizou a Terra, por isso a distância do século XX para o século XIX é gigantesca.3
A criação das doutrinas do socialismo e liberalismo político podem não ter ocorrido no século XX, mas tiveram na prática seus campos de batalha neste período, e foi exatamente a disputa destes sistemas que levou os homens do século XX a se distanciarem tanto do século XIX.
Sem dúvida o século XX foi um verdadeiro laboratório político de testes e tentativas de alcançar o sonho de um futuro de abundância e liberdade, por meio das ciências, tecnologia, nova organização social e processos de produção.
Podemos muito bem observar este contexto na explosão populacional do Mundo que em 1900 era de 1 bilhão e em 2000 era de 7 bilhões, bem como também a fuga e expulsão obrigatória do homem agrário para as cidades fáusticas4 e laicizadas em razão de uma sociedade industrial e do trabalho que paulatinamente mudaram os hábitos dos homens e das mulheres em nome do progresso material e do lucro.5
Neste contexto politicamente surgem os Estados-nacionais cujo principal objetivo era a organização social para o futuro6, tornando-se mais cosmopolita, ao mesmo tempo em que no campo jurídico o direito torna-se mais universal, acabando com as estruturas hierárquicas do passado, dando margem à criação do conceito de dignidade humana após o término da II Guerra Mundial por meio da Organização das
2 AGGIO, Alberto. LAHUERTA, Milton. Pensar o século XX: Problemas políticos e história nacional na América Latina. Unesp. São Paulo, 2003, p. 16.
3 Idem.
4 Se diz uma sociedade insatisfeita porque perde os valores espirituais em troca de valores materiais/econômicos.
5 AGGIO, Alberto. LAHUERTA, Milton. Pensar o século XX: Problemas políticos e história nacional na América Latina. Unesp. São Paulo, 2003, p. 17.
6 GALEANO, Eduardo. As veias abertas da América Latina. Rio de Janeiro. Paz e Terra. 46ª ed. p. 175-215.

Nações Unidas, cujo objetivo era e é o de promover a paz e o progresso mundial, sonho este até hoje não alcançado.
Entretanto, não só de progresso e esperança viveu o século XX, se houve um progresso social visando evitar conflitos devido à proximidade entre os indivíduos, a conquista do espaço, o avanço da psicanálise, por outro lado, o século XX foi um século de tragédias e de medo nunca antes vistas.7
Ao mesmo tempo em que houve um gigantesco crescimento populacional, de outro nunca se matou tanto de maneira consciente e programada como nas guerras mundiais, guerra fria e guerras localizadas, quase sempre movidas pelos interesses políticos, sociais e culturais. Indiscutivelmente foi um século de violência física e alienação, agressão à natureza. O conhecimento é usado como força motriz para geração de poder e violência, como ocorreu com o fascismo e as armas nucleares que controlavam e ameaçavam o mundo, provocando a banalização do mal, como muito bem afirmou Hannah Arendt.8
Assim, o progresso científico, o crescimento industrial, o trabalho organizado, a tecnologia da comunicação também geraram desigualdades, opressão, alienação e despersonalização, onde os países de primeiro mundo ficaram mais ricos e os pobres, cada vez mais pobres.9
A lógica do mercado financeiro, os blocos de poder fizeram com que os Estados-nacionais e seus objetivos de bem-estar social continuassem a viver em razão do capitalismo não possibilitando o desenvolvimento das nações, principalmente latinas, que continuam escravas da industrialização desprivilegiada, e exploração do capital humano, de maneira que a América Latina sempre esteja à mercê de uma exploração capitalista de sua produção barata para o exterior ao passo que o custo de aquisição é altíssimo.10
O fim do século XX marcou em definitivo a vitória do capitalismo e do ideal liberalista, convertendo o mundo industrial em um mundo de chips, circuitos e
7 AGGIO, Alberto. LAHUERTA, Milton. Pensar o século XX: Problemas políticos e história nacional na América Latina. Unesp. São Paulo, 2003, p. 19.
8 Idem, p. 19.
9 GALEANO, Eduardo. As veias abertas da América Latina. Rio de Janeiro. Paz e Terra. 46ª ed. p. 306-309.
10 Idem. p. 308.

realidade virtual, demonstrando que as ciências e a tecnologia são as novas forças produtivas que renovaram os ideais capitalista, que tornou a sociedade mais individualista, acentuando a distância individual e regional entre os ricos e pobres, gerando uma desigualdade social sem precedentes, apesar dos ideais de bem estar social cultivados desde o início dos anos 50, demonstrando que o século XX não acabou como esperavam nossos antepassados.11
Sem dúvida ficou demonstrado que o marxismo utópico entre o homem e a sociedade é inviável, indicando a necessidade de reformulação dos ideais e a inserção de novos temas que provaram ser indispensáveis pela democracia liberal, a saber, uma sociedade livre, plural e justa.
O século XX foi o século da democracia, sendo sua maior prova os intensos e imensos conflitos gerados em razão da busca deste ideal.
Cabe ressaltar que na América Latina, a Argentina, Brasil, Colômbia e México tiveram um sonho comum de décadas de esperança, todavia, com déficit imenso, nem o liberalismo, nem o socialismo conseguiram redesenhar os países latino americanos em processos transparentes de modernização econômica e social, com exceção de cuba.12
A América Latina em meio a este tumulto do século XX vem a duras penas tentando encontrar seu espaço no contexto mundial, e o viés jurídico iniciado com o idealismo do walfare state em reação às catástrofes da primeira metade do século XX, mostrou-se insuficiente para resguardar os direitos proclamados pelo neopositivismo, dano ensejo ao surgimento de um neoconstitucionalismo próprio dos países latino-americanos.
3. A crise político-econômica na América Latina resultante do conflito das políticas nacionalistas de industrialização e a base econômica de exportação
11 AGGIO, Alberto. LAHUERTA, Milton. Pensar o século XX: Problemas políticos e história nacional na América Latina. São Paulo: Unesp, 2003, p. 21.
12 Idem, p. 23.

Durante a década de 1940 e, sobretudo após a 2ª Guerra Mundial, os governos latinos, assim como o resto do Mundo, se decepcionaram de vez com a possibilidade de sucesso dos regimes totalitários, especialmente nazismo e fascismo,13 uma vez que estes guardavam uma ideia subjacente de que o Estado poderia proporcionar na medida certa as condições necessárias ao progresso dos indivíduos, que, sozinhos, não poderiam alcançar a evolução individual e por consequência coletiva.
Sem dúvida alguma isso gerou uma crise política sem precedentes, pois podemos aventar neste fato, com alguma reserva os primeiros indícios de ruina do socialismo que mais tarde, na década de 80, se consumaria com a queda do Muro de Berlim, na Alemanha.
O fato é que em decorrência das nefastas consequências da II Grande Guerra, a América Latina, ou pelo menos seus maiores representantes, Brasil, Argentina e México14 iniciaram por conta própria o interesse de industrializar suas economias por meio da conhecida Industrialização por Substituição de Importações, popularizada pela sigla ISI, projeto que foi fomentado pela COMISSÃO ECONÔMICA PARA A AMÉRICA LATINA-CEPAL, organização criada em 1948 com o objetivo de reunir o pensamento desenvolvimentista latino-americano.15
A intervenção econômica do Estado foi generalizada, abrangendo taxas de importação, controle de preços, salários, manipulação de taxas de cambio e de tributação.
Essa industrialização gerou um aumento dos salários da indústria que superaram os da agricultura, promovendo uma melhora de vida do trabalhador urbano, provocando o êxodo rural,16 pois gozava de benefícios sociais e infraestrutura que não havia no campo, tais como hospitais, escolas, lojas, energia, água canalizada e redes de esgoto.
13 Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Estado_de_bem-estar_social
14 WILLIAMSON, Edwin. História da América Latina. Edições 70/Almedina. Lisboa. Novembro 2012. p.346.
15 Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Comissão_Econômica_para_a_América_Latina_e_o_Caribe
16 AGGIO, Alberto. LAHUERTA, Milton. Pensar o século XX: Problemas políticos e história nacional na América Latina. São Paulo: Unesp, 2003, p. 17, 20.

Isto redunda no fato de que o trabalhador urbano tinha, consequentemente, uma melhor alimentação, melhor e maior acesso à educação, habitação, saúde, maior tempo e liberdade pessoal, sem contar com o acesso à variedade de bens de consumo, o que refletiu em um aumento populacional da América Latina nos anos 50 de 4,5%.17
Ao mesmo tempo em que havia essa total intervenção protecionista, a necessidade de investimento em infraestrutura de transporte e energia por parte do Estado foi uma exigência inescusável, sob pena de comprometer o plano de crescimento da política social.
Este fato nos permite deduzir que a política de indústria por substituição por importações (ISI) exigiu do Estado em um aumento gigantesco de compromissos econômicos e um consequente aumento da despesa pública, apesar dos benefícios acima apontados para a nova classe trabalhadora urbana.
A dinâmica do sistema ISI consistia basicamente em altas taxas de importação de produtos manufaturados no exterior visando planear a economia pela substituição por produtos produzidos internamente.
Desta maneira, as empresas nacionais protegidas por este mecanismo, tinham a garantia do crédito de bancos públicos com preços fixos, e simultaneamente fomentava-se a demanda dos produtos industrializados com o controle dos salários e preços, balanceando a taxa de câmbio e a tributação, que na maioria das vezes não correspondiam à taxa real.
Por este motivo, não é incomum observar na América Latina uma elevada taxa de crescimento das economias nos períodos de 1940 e 1950, pois a base da política econômica era impulsionar a industrialização visando diminuir a dependência dos países desenvolvidos, especialmente Estados Unidos.18
Tanto que se pode observar um crescimento da indústria muito maior que na agricultura, fato este incomum nos países latino-americanos, considerando a tradição de subdesenvolvimento. No Brasil a indústria cresceu em média 9,4%, e a agrícola 4%, e nos demais respectivamente, na Venezuela 8,5% e 4,7%; em Colômbia
17 WILLIAMSON, Edwin. História da América Latina. Edições 70/Almedina. Lisboa. Novembro 2012, p. 348.
18 Neste sentido: http://pt.wikipedia.org/wiki/Substituição_de_importações 7,2% e 2,1%; no Peru 6,6% para 3%; este crescimento atingiu até mesmo os países da América Central, nas repúblicas do café e da banana, Nicarágua, El Salvador e Honduras19.
Entretanto, o custo deste desejo de autossuficiência econômica e industrial dependia em grande parte do mercado internacional, pois os países latino-americanos não possuíam tecnologia e nem mão de obra qualificada para o funcionamento adequado das indústrias, de maneira que novamente o subdesenvolvimento estava à mercê da importação.
O grande problema disso tudo é que o capital necessário para a implantação deste sistema ISI (Industrialização por Substituição de Importações) carecia de investimentos consideráveis do Estado que tinham sua fonte basicamente constituída em duas fontes: lucros na exportação e empréstimos estrangeiros.20
Por sua vez, como a importação de tecnologia e mão de obra superava e muito a exportação, os governos da época (a maioria militares) mantinham a taxa de câmbio artificialmente elevadas contendo as importações, gerando um déficit enorme na balança de pagamentos dos Estados, já que a consequência disso era o aumento do preço das exportações latinas para o mercado mundial, inviabilizando o lucro.
Por este breve histórico já podemos ver que houve um efeito cascata na economia industrial latino-americana, provavelmente dolosamente ignorada pelos governos, pois o déficit da balança só podia ser remediado pelas nações latino-americanas por meio de mais empréstimos no exterior ou cunhando moeda, qualquer das duas hipóteses resultou nas impagáveis dívidas externas e uma generalizada inflação que abrangeu todos os países latino-americanos independentemente do regime político que adotavam.
A conclusão que chegamos é que mesmo com a postura de política econômica nacionalista focada na industrialização dos países latinos, com a manutenção de uma aparente democracia de direitos e liberdades individuais, visando manter o capital externo, vemos que este movimento de praticamente todos os países, principalmente os mais estruturados (Brasil, Argentina e México), experimentou um
19 WILLIAMSON, Edwin. História da América Latina. Edições 70/Almedina. Lisboa. Novembro 2012, p. 347.
20 Idem, p. 347.

utópico crescimento econômico que somente camuflou a dependência dos recursos estrangeiros, que mais tarde viria desencadear um processo inflacionário e o total desequilíbrio social.
De fato, o desenvolvimento latino-americano encontrou dificuldades porque necessariamente teve a barreira inconciliável entre o Estado, o capital estrangeiro, as elites de exportação e a novel camada social da indústria emergente.
Em meio a um Estado intervencionista com políticas incertas e pouco transparentes, os movimentos da classe trabalhadora organizada, e as elites de exportação o processo de redemocratização foi paulatinamente sendo alimentado, demonstrando que o modelo do estado de bem estar social (walfare state) não era adequado para os países latino-americanos.
Este fato vem a se confirmar com o restabelecimento das democracias liberais por volta dos anos de 1980, porém, o movimento neoconstitucionalista iniciado logo após a II Guerra Mundial baseado no neopositivismo jurídico, já se mostrava pouco capaz que resguardar os direitos e garantias individuais, pois o formalismo constitucional que se baseava o neoconstitucionalismo deu margem ao surgimento de um movimento, ainda subjacente, do novo constitucionalismo, difundido, por exemplo, no Brasil por meio do constitucionalista português J. J. Gomes Canotilho, bem como também pela obra de Konrad Hesse, sobre a força normativa da constituição.
4. As consequências da industrialização latino-americana que resultaram na crise de gigantes desigualdades sociais
Os problemas sociais e econômicos da América Latina começaram a surgir justamente em razão dos interesses diversos entre esses quatro sujeitos interessados: Estado, Países Desenvolvidos representados pelo capital estrangeiro, a oligarquia exportadora e o setor industrial nascido dentro deste “fogo cruzado”.
Apesar de tratar-se de uma questão de política econômica, os reflexos da industrialização latino-americana fomentados pelo ideal nacionalista originado do período entre guerras foram além do esperado, na medida em que as exportações eram contidas em razão do protecionismo dos governos nacionalistas.

Desta forma, o sistema ISI adotado pelas juntas militares e grupos oligárquicos foram penalizados pela alta carga fiscal imposta, gerando um problema grave de baixa produtividade industrial e exportação em declínio, justamente em razão da pressão política causada pela intermediação do Estado e o conflito com as classes sociais urbanas21.
A consequência verificada nesta dinâmica de acontecimentos chocantes entre o nacionalismo político protegido da industrialização e as políticas econômicas dos exportadores tradicionais resultou em conflitos sociais graves, hiperinflação, endividamento, e golpes militares institucionalizados na quase unanimidade dos países latino-americanos que perdurou até a década de 80, à exceção do México que tinha um consenso nacional entre economia e política em razão da sua revolução nos anos 30, período anterior ao próprio processo de industrialização,22 fato este que parece lhe ter garantido uma coesão política e jurídica dos direitos sociais e da estabilidade democrática, motivo pelo qual foi capaz de superar esta fase diferentemente dos países sul americanos.
Desta maneira, todo o interesse democrático surgido por volta dos anos 40, como por exemplo, Getúlio Vargas no Brasil e Perón na Argentina, foram, paulatinamente minados pelas divergências das políticas econômicas divergentes, ao mesmo tempo em que a democracia formalmente prevista nos regimes, não garantia qualquer resguardo de direitos fundamentais aos indivíduos, prevalecendo a ditadura interna e a propaganda democrática na política externa visando manter um status de democracia que na verdade era falso, cujo objetivo era somente manter a regularidade de investimento do capital externo.
Assim, os processos políticos, econômicos e sociais que aconteceu no México, não ocorreu nos demais países latinos, e a inexistência deste processo revolucionário com o objetivo de consolidar ou conciliar o idealismo político nacionalista com o econômico acabaram por resultar, na segunda metade do século XX, uma generalizada crise social, econômica e política, culminando em diversas ditaduras militares que suplantaram o regime democrático de fato, tais como no Brasil (1964-1985), Argentina (1976-1983), Bolívia (1964-1982), Chile (1973-1990), Cuba
21 WILLIAMSON, Edwin. História da América Latina. Edições 70/Almedina. Lisboa. Novembro 2012, p. 348.
22 Idem, p. 357/358

(desde 1959), Equador (1972-1979), Nicarágua (1936-1978), Haiti (1964-2004), Paraguai (1914-1940 Francia; 1954-1989 Stroessner), Peru (1968-1990), República Dominicana (1924-1978); e, Uruguai (1973-1985).23
A dinâmica que desencadeou nas ditaturas militares após a II Guerra Mundial, se deu pela inversão da polaridade do domínio econômico mundial, na medida em que os EUA substituiu a Grã-Bretanha como potência, de maneira que foi criada por influencia Americana a Organização dos Estados Americanos-OEA com a finalidade precípua de consolidar uma união geopolítica para que os países-membros pudessem se proteger de agressões externas.
O apoio armamentista, militar e ajuda econômica à industrialização latino-americana foi prestada pelos EUA até pouco depois dos anos 50, que no final em verdade a contraprestação baseava-se em permutas por matérias-primas e por lealdade geopolítica, sobretudo em razão da força crescente da poderosa União Soviética24.
A partir deste período a crise política nos governos latino-americanos passou a ser a tarefa impossível de conter a inflação sem sacrificar a proteção social, tudo isto considerado que o poder político não coincidia com o poder econômico, revelou-se uma incapacidade dos governos democráticos de assumirem o controle da economia de exportação25.
Aliado a isso, os governos democráticos não possuíam força para diminuir as desigualdades sociais e econômicas por meio da redistribuição de terra das grandes fazendas.26 E os direitos até então garantidos pelo positivismo não se mostravam efetivamente garantistas, resultando em um constitucionalismo fraco e ineficiente, visto que era visto tão somente como um ideal político e não efetivamente normativo.
Todavia, como as elites tradicionais da exportação perderam o controle do processo eleitoral pelos movimentos populistas, o fato é que se viram ameaçados pelo crescimento desmedido da inflação bem como também pelos economistas
23 http://pt.wikipedia.org/wiki/Ditadura
24 WILLIAMSON, Edwin. História da América Latina. Edições 70/Almedina. Lisboa. Novembro 2012, p. 359.
25 Idem, p. 361.
26 Idem, p. 361.

nacionalistas, motivo pelo qual acabaram por recorrer às intervenções militares, porque somente as forças armadas é que detinham a capacidade de obstar a conduta do governo populista camuflado de democracia liberal usada como forma de atrair o capital americano.27
Neste sentido:
(…) Contudo, nos anos 60 e 70, as forças armadas entraram na política como um bloco institucional determinado a preencher o vazio deixado pelo desmoronamento do Estado democrático. O objetivo era prosseguir com a modernização suspendendo por completo a política e recorrendo aos serviços de tecnocratas, que tinham por função reorganizar a economia enquanto as forças armadas impunham a lei e a ordem.28
Estes processos paulatinamente foram se tornando insustentáveis, pois a política econômica e social permanecia dependente das potencias mundiais, especialmente EUA, levando assim ao surgimento de movimentos populares contra as ditaturas, grupos guerrilheiros, de maneira que, por volta dos anos 80, a América Latina dá início ao seu processo de redemocratização, cada um ao seu modo, logicamente, entretanto com custo social altíssimo, sobretudo em razão das profundas desigualdades sociais.29
O processo de institucionalização de novas democracias na América Latina deu-se de nitidamente de maneira reacionária a estes processos nacionalistas e ditatoriais, havendo assim um movimento jurídico neoconstitucionalista, visando resgatar tardiamente esse processo iniciado na década de 50 na Europa em razão do processo reacionário aos regimes totalitários do fascismo e nazismo, porém, com uma roupagem característica da necessidade que os povos latino-americanos careciam, que era justamente uma identidade jurídica correspondente com o interesse político, econômico e social, desta forma, cumpre-nos retratar essa necessidade exarada nos textos constitucionais das novas democracias latino-americanas, como forma demonstrar o papel do constitucionalismo não só como um processo formalmente
27 Idem, p. 364.
28 idem.
29 Neste sentido: GALEANO, Eduardo. As veias abertas da América Latina. Rio de Janeiro. Paz e Terra. 2003. 46ª ed. p. 306-313.

legitimador de uma carta política tal como expressado por Ferdinand Lassale30, mas sim dotando o texto constitucional dos países de legítima força normativa, submetendo toda a política social e econômica aos princípios fundamentais dos cidadãos.
5. A caracterização do neoconstitucionalismo
Em 1993 a italiana Suzanna Pozzolo em uma conferência em Buenos Aires na Argentina usou a terminologia “neoconstitucionalismo” para descrever o processo jurídico antipositivista no sentido de tornar o direito mais concreto e não somente uma mera formalidade.
Com suas próprias palavras, Pozzolo disse que o neoconstitucionalismo é uma maneira de “denominar um certo modo antijuspositivista de se aproximar o direito” 31.
A América Latina em especial se identificou muito com o tema, sobretudo porque devido aos seus processos políticos econômicos destoantes do sistema jurídico, fez com que o estudo do neoconstitucionalismo teve juristas de peso como o caso do mexicano MIGUEL CARBONELL, com a obra que organizou intitulada “Neoconstitucionalismo(s)”, a qual tem o fim precípuo de definir e delinear o alcance deste movimento extremamente complexo e rico, na medida em que procura integrar o direito ao contexto político, justamente em função do completo desastre da ciência política na primeira metade do século XX com o fracasso dos regimes totalitários.
O neoconstitucionalismo enquanto movimento jurídico procura romper com o sistema falido do constitucionalismo clássico estampado pelos princípios esculpidos inicialmente na Revolução Francesa com os ideais de liberdade, igualdade e fraternidade.
O neoconstitucionalismo a despeito de ser um movimento jurídico, agencia uma ruptura do paradigma do Estado “liberal-individualista e formal-burguês” 32,
30 Neste sentido ver a obra: O que é a Constituição? Disponível em: http://www.felu.xpg.com.br/ O_que_e_uma_Constituicao.pdf
31 DUARTE, Écio Oto Ramos; POZZOLO, Susanna. Neoconstitucionalismo e positivismo jurídico: as faces da teoria do direito em tempos de interpretação moral da constituição. São Paulo: Landy, 2006, p. 77.
32 STRECK, Lênio Luiz. Hermenêutica, Neoconstitucionalismo e “o Problema da Discricionariedade dos Juízes”. Anima: Revista Eletrônica do Curso de Direito da OPET, ano I, n. 1. Curitiba, 2009.

Disponível motivo pelo qual tem cunho relevante no sistema político e econômico e por isso mesmo foi retomado pelos países latino-americanos na construção de suas constituições com vistas a resinificar os direitos fundamentais, especialmente aqueles adotados pela DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS de 1948 e porque não da própria Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789. Nas palavras de Streck:
Isto é o neoconstitucionalismo: uma técnica ou engenharia do poder que procura dar resposta a movimentos históricos de natureza diversa daqueles que originaram o constitucionalismo liberal, por assim dizer (ou primeiro constitucionalismo). Por isso o neoconstitucionalismo é paradigmático; por isso ele é ruptural; não há sentido em tratá-lo como continuidade, uma vez que seu “motivo de luta” é outro33.
O jurista brasileiro Luiz Roberto Barroso34 diz que o neoconstitucionalismo somente pode ser compreendido pela análise de seu aspecto histórico, teórico e filosófico.
Somente o marco histórico dos movimentos constitucionais da Europa após a II Guerra Mundial, como a constituição alemã (1949) e italiana (1947) e a criação dos tribunais constitucionais nesses países – nos anos de 1951 e 1956, são pontos de referência inicial do neoconstitucionalismo na medida em que rompem com o paradigma tradicional do constitucionalismo clássico francês ineficiente no sentido de se unir e limitar o próprio poder político garantindo os direitos fundamentais que na época já eram conhecidos, porém, não respeitados35.
Cita ainda o jurista brasileiro36 os processos de redemocratização da Espanha e Portugal como marcos extremamente importante para construção do neoconstitucionalismo.
em: http://www.anima-opet.com.br/primeira_edicao/artigo_Lenio_Luiz_Streck_hermeneut ica.pdf Acesso em: 13 de junho de 2013.
33 Idem.
34 BARROSO, Luís Roberto. Neoconstitucionalismo e constitucionalização do Direito. O triunfo tardio do Direito Constitucional no Brasil. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 851, 1 nov. 2005 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/7547>. Acesso em: 15 jun. 2013.
35 Idem.
36 Idem.

Neste ponto cabe citar a obra de J.J. Gomes Canotilho que teve grande importância na difusão dos conceitos de constituição dirigente que implicaram certamente na construção do conceito do neoconstitucionalismo, bem como também no novo constitucionalismo emergido especialmente na América Latina, como bem aponta Roberto Gargarella37.
Teoricamente o neoconstitucionalismo implica em basicamente três princípios fundamentais que lhe dá efetividade e o distingue do constitucionalismo clássico: o primeiro, e talvez a mais importante, é o reconhecimento de força normativa à Constituição, tema este derivado da desenvolvida pelo jurista Konrad Hesse em sua obra A força normativa da constituição a qual contrasta com a posição clássica (eminentemente política) de Ferdinand Lassale; em segundo, a expansão da jurisdição constitucional que segundo Hans Kelsen é “a garantia jurisdicional da Constituição”, configurando um “elemento do sistema de medidas técnicas que têm por fim garantir o exercício regular das funções estatais”38; por fim, o desenvolvimento de uma nova dogmática da interpretação constitucional (BARROSO, 2007), a qual no Brasil, por exemplo, vem dando uma roupagem na chamada constitucionalização dos direitos infraconstitucionais, na medida em que sempre os coloca em referência aos dispositivos de direitos constitucionais fundamentais como forma de outorgar-lhes eficácia reflexa, fato este que tem sido objeto de severas críticas por alguns doutrinadores.
Considerando estes três princípios elementares, é possível afirmar que o neoconstitucionalismo busca nada mais nada menos que dar efetividade às normas jurídicas, acrescentando, contudo, que estas sejam norteadas por uma teoria de justiça (BARROSO, 2007).
Diferentemente, mas não de maneira contrária, Humberto Ávila afirma que o neoconstitucionalismo tem como características principais o surgimento de: um número maior de princípios nos textos legais; o uso preferencial do método de ponderação, no lugar da simples subsunção; justiça particular (individual, levando em consideração as peculiaridades do caso concreto); fortalecimento do Poder Judiciário
37 A respeito deste ponto conferir texto Unidade 5: GARGARELLA, Roberto. El nuevo constitucionalismo latinoamericano. Algunas reflexiones preliminares. Crítica y Emancipación, (3): 169-188, primer semestre 2010.
38 KELSEN, Hans. Jurisdição Constitucional. 2ª ed. – São Paulo: Martins Fontes, 2007, p. 123-124.

(seria a expansão da jurisdição constitucional); e aplicação da Constituição em todas as situações, em detrimento da lei (interpretação dogmática)39.
Outros autores, ainda mais detalhistas, apontam várias características que o neoconstitucionalismo traz em sua base, na medida em que seus conceitos abrangem toda a teoria não só jurídica, mas também política e histórica das constituições, sobretudo diante de seu conceito reacionário que, apesar de não ser um consenso, pelo histórico da ineficácia do constitucionalismo clássico na América Latina40 é forçoso concluir que certamente o neoconstitucionalismo deve possuir grande carga de abrangência em sua aplicabilidade, e neste sentido Écio Duarte elenca os pontos que traçam a identidade do neoconstitucionalismo, que são:
Pragmatismo: Esta propriedade faz depender o conceito do direito da compreensão particular que se tenha da teoria constitucional, o que torna o conjunto de sistemas jurídicos particulares dos Estados constitucionais em matéria central para a elaboração de um possível conceito de direito. Neste caso o sentido do pragmatismo se evidencia quando a determinação do conceito de direito se torna como ponto útil e, portanto, orientado à prática. A constatação do direito constitucionalizado faz depender a possível unidade, em torno daquele conceito, da útil justificação da existência de vários conceitos de direito (particulares) […]
Ecletismo (sincretismo) metodológico: O paradigma neoconstitucionalista requer uma via que se situe entre a orientação analítica e a hermenêutica fazendo depender a exegese e aplicação jusfundamental de um conjunto de metodologias que se interconectam.
Principialismo: Fundamentado desde a distinção conceitual estabelecida entre princípios e regras, o argumento dos princípios, vinculado ao propósito neoconstitucionalista, junta-se a outros dois argumentos (argumento da correção e argumento da justiça) para consolidar uma
39 ÁVILA, Humberto. Neoconstitucionalismo: Entre a ciência do direito e do direito da ciência. Revista Eletrônica sobre Reforma do Estado (RERE), n. 17. Salvador, Instituto Brasileiro de Direito Público, jan. mar., 2009. Disponível em: http://www.direitodoestado.com/revista/REDE-17-JANEIRO-2009-HUMBERTO%20A-VILA.pdf Acesso em: 15 de junho de 2013.
40 No website http://ilsa.org.co:81 ILSA – Instituto Latinoamericano para una Sociedad y un derecho Alternativos há uma infinidade de artigos e livros tratando das diversas áreas dos direitos fundamentais, especialmente direitos humanos e dos povos indígenas, demonstrando a preocupação com o segundo plano a que foi relegado os direitos na América Latina na segunda metade do Século XX, a qual somente começou a ser resgatada em seus últimos 20 anos por meio do neoconstitucionalismo.

fundamentação de corte constitucionalista que aceite a tese da conexão do direito com a moral. Esta conexão é expressada em nível do neoconstitucionalismo através dos princípios jusfundmentais que servem como pautas morais e jurídicas para a correção dos argumentos jusfundamentais […]
Estatalismo garantista: consiste esta propriedade no fato de que é imperiosamente necessário para a consecução da segurança jurídica no meio social que os conflitos sejam solucionados por intermédio de instituições estatais. […] Esta propriedade é distinta em relação às concepções do jusnaturalismo e do positivismo jurídico justamente porque sua perspectiva está vinculada a uma pretensão garantista, é dizer: agora, o que cobra maior importância é a garantia da existência de mecanismos institucionais de tutela dos direitos fundamentais.
Judicialismo ético-jurídico: o neoconstitucionalismo exige dos operadores jurídicos cada vez mais a elaboração de juízos de adequação e juízos de justificação com natureza ética ao lado das técnicas estritamente subsuntivo- jurídica.
O Juízo de ponderação: O neoconstitucionalismo propugna que, na resolução dos chamados hard cases (casos difíceis) – nos quais nenhuma regra estabelecida dita uma decisão em qualquer direção -, diferentemente da postura do juiz indicada pela teoria do positivismo jurídico, consistente no poder discricionário para decidir o caso de uma maneira ou de outra, o juiz, pautado na tese dos direitos, tem o dever de „descobrir quais são os direitos das partes, e não de inventar novos direitos retroativamente‟ devendo agir „como se fossem delegados do poder legislativo, promulgando as leis que, em sua opinião, os legisladores promulgariam caso se vissem diante do problema‟
Ampliação do conteúdo da GRUNDNORM: […] Ultrapassando o esquema positivista kelseniano, que fundamenta a validez de todas as normas a partir de uma norma fundamental completamente neutra, no que respeita ao seu conteúdo, o neoconstitucionalismo defende que a

obrigatoriedade jurídica assumida em função da Constituição se deve à inclusão, no conceito de grundnorm, de conteúdos morais.”41
Por estas razões o neoconstitucionalismo jamais poderia ser compreendido como um fenômeno meramente jurídico como aparentemente se dá importância, pois seus conceitos abrangem fortemente o campo político e filosófico, que reflete drasticamente na maneira de se conceber e interpretar o Direito.
Deixando a mera formalidade dos textos constitucionais, o movimento faz incutir a necessidade de conceitos axiológicos, bem como a atribuição de força normativa à Constituição, submetendo o próprio Estado definitivamente ao seu conteúdo, motivo pelo qual a Constituição passa a ser o principal organismo na ordem jurídica e não meramente um corpo normativo que represente simplesmente uma vontade política do Estado.
Por certo parece nítido que o neoconstitucionalismo preocupa-se com que o Direito tenha sua forma na ordem social, entretanto, é imprescindível que há a correspondência com o conteúdo, pois a justiça em sua concepção não pode existir sem que se tenha uma efetividade do direito, por conseguinte dos valores políticos, económicos, sociais, culturais etc. Enquanto forma, o direito precisa estar posto, entretanto, seu conteúdo carece de uma força intrínseca para que se evitem arbitrariedades quase sempre do próprio Estado.
Como disse JHERING citado por Canotilho “a forma é inimiga jurada do arbítrio e irmã gêmea da liberdade”42.
Apesar da diversidade conceitual que o neoconstitucionalismo apresenta na literatura jurídica, o fato é que o centro de sua aplicação é efetividade do Estado Democrático, portanto, bem condizente com as necessidades das democracias da América Latina que tanto sofreram com seu passado de tormento e violação da ordem jurídica, política e econômica por faltar uma cultura de efetividade normativa do texto constitucional.
41 DUARTE, Écio Oto Ramos; POZZOLO, Susanna. Neoconstitucionalismo e Positivismo Jurídico. As faces da Teoria do Direito em tempos de interpretação moral da Constituição. 2 ed. São Paulo: Landy, 2010, p. 64-72.
42 CANOTILHO, JJ.Gomes. Direito Constitucional. Coimbra: Livraria Almedina, 1993, p. 358.

Neste sentido, apesar da variedade de conceitos e características atribuídas ao neoconstitucionalismo, vemos que alguns pontos comuns são o objeto de mais atenção por significar as estruturas e organização do Estado de Direito e Político, tais como: a inalienabilidade da supremacia da Constituição; a necessidade de positivação e efetividade dos direitos e garantias fundamentais; existência de princípios individualizados na ordem jurídica escalonadamente obedientes à norma constitucional; e interpretação principiológica da Constituição.
Em últimas palavras, o neoconstitucionalismo significa o rompimento com o constitucionalismo liberal de previsão meramente formal de direitos. É tentativa de não só de prever direitos fundamentais, mas de garanti-los a todos.
6. O novo constitucionalismo
O desenvolvimento do trabalho inicialmente não compreendia o chamado Novo Constitucionalismo, entretanto, devido sua importância e peculiaridades encontradas somente na América Latina, faz-se necessário, uma abordagem não muito aprofundada, porém, suficiente a compreender o que vem a ser.
Inicialmente insta afirmar que o novo constitucionalismo enquanto movimento, implica em uma sucessão do neoconstitucionalismo, na medida em que este apesar de possuir características próprias, tem sua gênese no Direito Europeu e Norte Americano.
Com o processo de redemocratização iniciado a partir dos anos 80 do século XX, o neoconstitucionalismo já começou a ser de certa forma “adaptado” por algumas nações latino-americanas.
O tema comporta muita discussão, e diria até mais que o próprio neoconstitucionalismo, vez que sua amplitude insere uma peculiaridade eminentemente latino-americana no direito constitucional.
Roberto Gargarella com extrema clareza aponta os principais focos do Novo Constitucionalismo, dizendo no início de sua investigação:

Me interessará señalar que las nuevas Constituciones, lamentablemente y em una mayoria de casos, han perdido su Norte, para quedar a la merced de objetivos cortoplacistas. En segundo lugar, me plantearé algunas preguntas referidas a la estrutura básica que encierra cualquier Constitución, es decir, a sus dos partes, relacionadas con la organización del poder (la división del poder, el establecimento de un sistema de “frenos y contrapesos”), y la definición de los derechos fundamentales (la “declaración de derechos”). En este caso, me intneresará explorar los modos en que se articulan – y entran em clonflicto – estas dos partes de la Constitución. En terceiro lugar, me concetraré em la estructura de derechos de las nuevas constituciones regionales. Tiene sentido dedicar una atención especial a este aspecto de los nuevos textos fundamentales dado que el mismo ha sido objeto de los principales ataques por parte de los críticos del nuevo constitucionalismo. Se disse, con cierta razón, que las nuevas Constituciones incorporan listas interminables de derechos, degradando de ese modo al texto fundacional, para convertilo en un listado de promesas incumpribles. Me interesará, entonces, preguntarme acerca de la pertinecia de este tipo de observaciones. Finalmente, me ocuparé del problema de los “transplantes” constitucionales (la posibilidad de introducir em los “viejos” textos instituciones “nuevas”, desvinculadas de aquellos Orígenes), lo cual me permitirá llevar adelante uma reflexión más general em torno a las posibilidades y límites de las reformas constitucionales.43
Assim, cabe-nos apontar algumas de suas diferenças basilares.
No novo constitucionalismo, invocam-se as origens do poder constituinte originário em sua forma genuína, a saber, com a efetiva manifestação da vontade direta do povo, compreendendo sua pluralidade de composição, deixando de lado a participação popular composta pela imprecisão da democracia representativa, como tem acontecido nas transições políticas das nações latino-americanas.
O espanhol Dalmau seguindo o pensamento de Konrad Hesse, sustenta que o novo constitucionalismo latino-americano é uma evolução do neoconstitucionalismo latino-americano, sendo seu escopo último o atendimento das
43 GARGARELLA, Roberto. El nuevo constitucionalismo latinoamericano. Algunas reflexiones preliminares. Crítica y Emancipación, (3): 169-188, primer semestre 2010. p. 171-172.

carências jurídico-política da América Latina na atualidade, não supridas pelos sistemas anteriores. Neste sentido, diz:
La evolución constitucional responde al problema de la necesidad. Los grandes cambios constitucionales se relacionan directamente con las necesidades de la so- ciedad, con sus circunstancias culturales, y con el grado de percepción que estas sociedades posean sobre las posibilidades del cambio de sus condiciones de vida que, en general, en América Latina no cumplen con las expectativas esperadas en los tiempos que transcurren. Algunas sociedades latinoamericanas, al calor de procesos sociales de reivindicación y protesta que han tenido lugar en tiempos re- cientes, han sentido con fuerza esa necesidad que se ha traducido en lo que podría conocerse como una nueva independencia, doscientos años después de la política. Independencia que esta vez no alcanza sólo a las élites de cada país, sino que sus sujetos son, principalmente, los pueblos.44
Raquel Yrigoyen afirma que o neoconstitucionalismo também pode ser denominado de “constitucionalismo pluralista”, e identifica suas origens em três45 fases sucessivas de evolução do direito constitucional:
a) constitucionalismo multicultural (1982-1988), que insere o contexto do direito constitucional o conceito de diversidade cultural e o reconhecimento de direitos das comunidades indígenas específicos;
b) constitucionalismo pluricultural (1988-2005), a qual já compreende a conceituação de “nação multiétnica” e o desenvolvimento do pluralismo jurídico interno especialmente das populações indígenas integrando-as ao rol dos direitos fundamentais;
c) constitucionalismo plurinacional (2006- 2009), a adoção da Declaração das Nações Unidas sobre os direitos dos povos indígenas, aonde o ordenamento
44 DALMAU, Rúben Martínez. El nuevo constitucionalismo latinoamericano y el proyecto de Constitución del Ecuador. Alter Justicia, n. 1. Guayaquil, oct. 2008, p. 23. 17-27. Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=293222963011
45 YRIGOYEN FAJARDO, Raquel. Pluralismo jurídico, derecho indígena y jurisdicción especial en los países andinos. Revista El Otro Derecho, n. 30. Variaciones sobre la justicia comunitaria. Bogotá: ILSA, 2004. p. 171-196. Disponível em: http://www.alertanet.org/ryf-legalpluralism-BL27.pdf Acesso em: 10 de junho de 2013.

constitucional adota o sistema de Estado plurinacional e de um pluralismo jurídico igualitário em relação aos povos indígenas, sobretudo considerando um papel antropológico e originário destes povos como sendo precursores ou originários do território latino-americano.
O Estado plurinacional surgido com o novo constitucionalismo se contrapõe à ideia instituída pelo Estado nacional de unidade dos povos e culturas, onde o Estado e a Constituição representam uma única nação, um único direito, o que implica em dizer que não há o reconhecimento da diversidade de cultura e de povos.
Exemplo claro de total integração pode-se citar a Constituição boliviana que resguarda em seu texto o direito indígena em 80 dos 411 artigos, inserindo-os efetivamente na pluralidade multicultural e multinacional, assegurando direitos anteriormente não previstos, tais como: cotas parlamentares do povo indígena; garantia de propriedade exclusiva da terra, recursos hídricos e florestais pelas comunidades indígenas; equivalência entre a justiça indígena e a justiça comum.
Por sua vez, vejamos:
Constitución de Colombia de 1991, Art. 7: “El estado reconoce y protege la diversidad étnica y cultural de la nación colombiana.”
Constitución de Perú de 1993: Art.2: Toda persona tiene derecho, inc. 19: “A su identidad étnica y cultural. El estado reconoce y protege la pluralidad étnica y cultural de la nación.”
Constitución de Bolivia de 1994: Art. 1: Bolivia, libre, independiente, soberana, multiétnica y pluricultural,[…]”.
Constitución de Ecuador de 1998, Art. 1. “El Ecuador es un estado social de derecho, soberano, unitario, independiente, democrático, pluricultural y multiétnico.”
Constitución de Venezuela de 1999: Artículo 100: “Las culturas populares constitutivas de la venezolanidad gozan de atención especial, reconociéndose y respetándose la interculturalidad bajo el principio de igualdad de las culturas. (…)” (subrayados míos).
Constituição Brasileira de 1988: Artigo 231: São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas,

crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.
A democracia participativa é efetivamente um dos pontos centrais do Estado plurinacional que passa ser a base da democracia representativa, e não o contrário, garantindo a possibilidade de influência dos diversos grupos familiares, sociais e étnicos-culturais46, o que de fato nos permite fazer uma inferência sobre a efetiva igualdade das minorias ou dos menos favorecidos, por meio da efetiva democracia participativa, possibilitando um ideal de igualdade e justiça social mais concreto, alcançando uma alternativa de justiça equitativa idealizada por Rawls em Uma Teoria da Justiça.
Neste sentido, Rubén Martínez Dalmau em termos claros e concisos, coloca o novo papel do direito constitucional latino-americano, dizendo:
Trata-se, recolhendo a evolução do constitucionalismo desde a sua aparição, no século 18, e em particular os avanços no constitucionalismo europeu depois da Segunda Guerra Mundial, de avançar em âmbitos nos quais o constitucionalismo europeu ficou paralisado: a democracia participativa, a vigência dos direitos sociais e dos demais direitos, a busca de um novo papel da sociedade no Estado e a integração das minorias até agora marginalizadas. Estamos diante de Constituições que, por um lado, são originais e próprias de cada país, na medida em que tentam solucionar os problemas de cada uma das sociedades onde serão implantadas. Mas, por outro lado, estamos diante de denominadores comuns óbvios, principalmente no campo da participação, da economia e de uma vigência efetiva dos direitos para todos.47
Boaventura de Sousa Santos ensina que o conceito de plurinacionalidade implica em dois conceitos, o primeiro é liberal e o segundo está ligado à
46 MAGALHÃES. José Luiz de Quadros. Plurinacionalidade e cosmopolitismo: A diversidade cultural das cidades e diversidade comportamental nas metrópoles. Revista da Faculdade de Direito da UFMG, n. 53. Belo Horizonte: jul./dez. 2008. p. 208 (201-216). Disponível em: http://www.fdv.br/publicacoes/periodicos/revistadireitosegarantiasfundamentais/n7/8.pdf Acesso em: 14 de junho de 2013.
47 Disponível em: http://www.direito.ufg.br/uploads/12/original_24243799-UFRJ-Novo-Constitucionali smo-Latino-Americano.pdf?1352146239

autodeterminação, o qual, a lição, apesar de um pouco extensa, compensa o esclarecimento:
El primer concepto de nación es el concepto liberal que hace referencia a la coincidencia entre nación y Estado; es decir, nación como el conjunto de individuos que pertenecen al espacio geopolítico del Estado y por eso en los Estados modernos se llaman Estados-nación: una nación, un Estado. Pero hay otro concepto, un concepto comunitario no liberal de nación, que no conlleva consigo necesariamente el Estado. Por ejemplo, sabemos cómo los alemanes fueron, en Europa central y oriental, durante mucho tiempo, una nación sin Estado porque su identidad era una identidad cultural y no una identidad política. Aquí podemos ver que esta segunda tradición de nación, la tradición comunitaria, es la tradición que los pueblos indígenas han desarrollado. Este concepto de nación conlleva un concepto de autodeterminación, pero no de independência.48
A ideia central é que as democracias da atualidade não podem mais permanecer com os conceitos antiquados do Estado Liberal no sentido de compreender o Estado como sendo uma só nação. A evolução do conceito de qualquer constituição da atualidade deve compreender o pluralismo multicultural e multinacional como prioridades, em uma palavra: o conceito das diversas nações deve ser compreendido por qualquer estado em que elas estejam compreendidas.
48 SANTOS, Boaventura de Sousa. La reinvención del Estado y el Estado plurinacional. Santa Cruz de La Sierra: Alianza Interinstitucional CENDA/CEJIS/CEBID, 2007. Disponível em: http://www.ces.fe.uc.pt/publicacoes/ outras/200317/estado_plurinacional.pdf Acesso em: 15 de junho de 2013.

7. BIBLIOGRAFIA
1. AGGIO, Alberto. LAHUERTA, Milton. Pensar o século XX: Problemas políticos e história nacional na América Latina. São Paulo: Unesp, 2003.
2. ÁVILA, Humberto. Neoconstitucionalismo: Entre a ciência do direito e do direito da ciência. Revista Eletrônica sobre Reforma do Estado (RERE), n. 17. Salvador, Instituto Brasileiro de Direito Público, jan. mar., 2009. Disponível em: http://www.direitodoestado.co m/revista/REDE-17-JANEIRO-2009-HUMBERTO%20A-VILA.pdf Acesso em: 15 de junho de 2013.
3. Belatto, Luiz Fernando B. América Latina: 100 anos de opressão e utopia revolucionária. Disponível em: http://www.klepsidra.net/klep sidra5/america.html consultado em 02.03.2013.
4. CANOTILHO, JJ.Gomes. Direito Constitucional. Coimbra: Livraria Almedina, 1993.
5. DALMAU, Rúben Martínez. El nuevo constitucionalismo latinoamericano y el proyecto de Constitución del Ecuador. Alter Justicia, n. 1. Guayaquil, oct. 2008, p. 23. 17-27. Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=293222963011.
6. DUARTE, Écio Oto Ramos; POZZOLO, Susanna. Neoconstitucionalismo e Positivismo Jurídico. As faces da Teoria do Direito em tempos de interpretação moral da Constituição. 2 ed. São Paulo: Landy, 2010.
7. GALLEGO, Marisa, Teresa EGGER-BRASS y Fernanda GIL LOZANO, Historia Latinoamericana 1700 – 2005: sociedades, culturas, processos políticos y económicos. Maipue, Buenos Aires, Argentina, 2005.
8. GALEANO, Eduardo. As veias abertas da América Latina. Rio de Janeiro. 46ª ed. Paz e Terra. 2003.
26
9. GARGARELLA, Roberto. El nuevo constitucionalismo latinoamericano. Algunas reflexiones preliminares. Crítica y Emancipación, (3): 169-188, primer semestre 2010.
10. HAWLS, John. Uma teoria da justiça. São Paulo: Marins Fontes, 3ª ed., 2008.
11. KELSEN, Hans. Jurisdição Constitucional. 2ª ed. – São Paulo: Martins Fontes, 2007.
12. LASSALLE, Ferdinand. O que é a Constituição? Disponível em: http://www.felu.xpg.com.br/ O_que_e_uma_Constituicao.pdf.
13. MAGALHÃES. José Luiz de Quadros. Plurinacionalidade e cosmopolitismo: A diversidade cultural das cidades e diversidade comportamental nas metrópoles. Revista da Faculdade de Direito da UFMG, n. 53. Belo Horizonte: jul./dez. 2008. p. 208 (201-216). Disponível em: http://www.fdv.br/publicacoes/periodicos/revis tadireitosegarantiasfundamentais/n7/8.pdf Acesso em: 14 de junho de 2013.
14. PNUD – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, A Democracia na América Latina rumo a uma democracia de cidadãs e cidadãos, tradução Mônica Hirst, Santana do Paranaíba, SP: LM&X, 2004.
15. SANTOS, Boaventura de Sousa. La reinvención del Estado y el Estado plurinacional. Santa Cruz de La Sierra: Alianza Interinstitucional CENDA/CEJIS/CEBID, 2007. Disponível em: http://www.ces.fe.uc.pt/publicacoes/outras/200317/estado_plurinacional.pdf Acesso em: 15 de junho de 2013.
16. STRECK, Lênio Luiz. Hermenêutica, Neoconstitucionalismo e “o Problema da Discricionariedade dos Juízes”. Anima: Revista Eletrônica do Curso de Direito da OPET, ano I, n. 1. Curitiba, 2009. Disponível em: http://www.anima-opet.com.br/primeira_edicao/ artigo_Lenio_Luiz_Streck_hermeneut ica.pdf Acesso em: 13 de junho de 2013.
17. BARROSO, Luís Roberto. Neoconstitucionalismo e constitucionalização do Direito. O triunfo tardio do Direito Constitucional no Brasil. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 851, 1
27
nov. 2005 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/7547>. Acesso em: 15 jun. 2013.
18. Vitullo, Gabriel E.. As teorias da democratização frente às democracias latino-americanas realmente existentes. OPINIÃO PÚBLICA, Campinas, vol. 12, No. 12, Novembro, 2006, p. 348-377.
19. YRIGOYEN FAJARDO, Raquel. Pluralismo jurídico, derecho indígena y jurisdicción especial en los países andinos. Revista El Otro Derecho, n. 30. Variaciones sobre la justicia comunitaria. Bogotá: ILSA, 2004. p. 171-196. Disponível em: http://www.alertanet.org/ryf-legalpluralism-BL27.pdf Acesso em: 10 de junho de 2013.
20. WILLIAMSON, Edwin. História da América Latina. Edições 70/Almedina. Lisboa. Novembro 2012.
21. ZANATTA, Loris, Historia de América Latina. De la Colonia al siglo XXI, 1ª Ed. Buenos Aires: Siglo Veintiuno Editores, 2012.
Consulta websites:
1. http://ilsa.org.co:81
2. http://pt.wikipedia.org/wiki/Ditadura
3. www.flacso.org/
4. www.clacso.org.ar/
5. www.eclac.org/
6. www.pnud.org.br/